Homilia - 25/05/2014 - Sexto Domingo da Páscoa
As últimas palavras de alguém, antes de uma despedida, são as que ficam em nossa memória. Estas palavras são como que o testamento deixado para seus entes queridos. Assim podemos imaginar que as palavras de Jesus, antes de sua partida, foram de grande importância para seus discípulos.
No Evangelho de hoje, novamente, encontramos um trecho do discurso de Jesus da Última Ceia. Imaginemos a cena: Jesus convida seus discípulos para a ceia e, durante a refeição, começa a falar de sua partida. Os amigos de Jesus sem muito entender tudo o que lhes falava, começam a entristecer-se. Jesus, então, dá-lhes a garantia de uma nova maneira de estar presente na vida deles.
Promete que não só Ele vai estar presente na vida deles, como também o Pai e o Espírito Santo, para que não se sintam órfãos, nem abandonados. Ele diz que vai estar sempre com eles através do Espírito Santo.
As palavras de despedida não são um resumo de seus ensinamentos ou exigências morais. Ele fala do seu relacionamento amoroso com os discípulos, do relacionamento de amor dele com o Pai e do relacionamento de amor dos discípulos com ele: “Quem acolhe os meus mandamentos e os observa, esse me ama. Ora, quem me ama será amado por meu Pai, e eu o amarei e me manifestarei a ele” (Jo 14,21).
Portanto, o Defensor (ou Consolador) é o Espírito Santo que nos une a Cristo e garante a permanência de Cristo em nós, como Cristo está no Pai. Pelo Espírito “que está em nós”, somos levados a viver com Deus e com os irmãos.
O que significa que Deus está em nós?
Uma anedota conta que, certa vez, um mestre perguntou os doutores da Lei: “Onde mora Deus?”. Os homens riram e disseram: “Como você pode fazer uma pergunta dessa? Não é tudo, na natureza e no universo, que fala da presença do seu criador?”. O mestre respondeu à pergunta feita por ele próprio: “Deus mora onde o deixam entrar!”.
Deixar Deus morar em mim significa, ao dizer de Jesus, “amá-lo”. A quem eu amo quero conhecer sempre mais. A quem eu amo quero que esteja sempre perto de mim. A quem eu amo deixo participar da minha vida, deixo morar comigo. Quem ama a Jesus deixa Deus morar nele.
Essa comunhão com Jesus é algo tão importante e tão necessário na vida cristã, que Paulo sempre saúda os destinatários de suas cartas com esse pedido: “A graça de nosso Senhor Jesus Cristo, o amor do Pai e a comunhão do Espírito Santo esteja convosco”. É com essas palavras bíblicas que o presidente da celebração eucarística saúda os irmãos. Ele nos convoca à comunhão com a Trindade e com os irmãos de fé.
Assim não podemos reduzir a “comunhão” apenas ao ato de receber a hóstia consagrada. Esse sacramento é SINAL daquela comunhão de amor e solidariedade que deve existir entre nós. “Fazei isso em memória de mim”. Por isso nós nos comprometemos a comungar da vida uns dos outros, doando-nos no amor mútuo, no serviço desinteressado e na solidariedade.
A comunidade dos primeiros cristãos, depois da morte e ressurreição de Jesus, encontrava-se diante do mundo hostil do Império Romano, que perseguia e matava quem acreditava em Jesus. É o mundo da injustiça, da opressão contra os pobres, da idolatria do dinheiro e do poder, das vaidades.
Dentro desse contexto, a primeira leitura nos apresenta Filipe pregando aos samaritanos. É uma demonstração da mudança que a atitude de Jesus havia operado em seus discípulos, se levarmos em conta a inimizade que reinava entre judeus e samaritanos. Filipe pregando entre eles, em sua própria capital, e com tanto êxito que, como ouvimos, sua cidade, a dos samaritanos, “se encheu de alegria”.
Na segunda leitura, escutamos uma exortação de Pedro, que devemos estar dispostos a confiar na bondade de Deus, apesar de tantos sofrimentos da vida, das injustiças e opressões. E em tudo isso devemos “conservar a mansidão e o respeito”. Mesmo sendo difamados, devemos reconhecer que é melhor sofrer fazendo o bem do que praticar o mal pois “o próprio Cristo sofreu a morte, na sua existência humana, mas recebeu nova vida pelo Espírito”. (1 Pd 3,21).
Este Espírito está em nós e se manifesta em nós. “Quem me ama será amado por meu Pai, e eu o amarei e me manifestarei a ele”.
Quando visito uma casa, tudo o que encontro nela fala do seu morador. A pessoa dele manifesta-se através dos livros que vejo na estante, das cores e decoração, das fotos e quadros. Assim percebo o que ao morador é caro e querido, o que é importante na vida dele.
A pessoa onde mora Deus e Jesus Cristo manifesta o amor e a paz do Espírito Santo. Oxalá todos possam ver, através de nossos gestos e atitudes, que somos morada do Espírito Santo, morada do Deus-Amor.
Frei Gunther Max Walzer, Ofm