Homilia - 31/08/2014 - 22º Domingo do Tempo Comum
Parece que a palavra que mais se usa e mais se lê é a palavra “ganhar”. Ganha-se na mega-sena, ganha-se o jogo de futebol, ganha-se um presente de aniversário, ganha-se desconto especial na loja. E quem vai ganhar as eleições? Os candidatos a cargos públicos fazem de tudo para ganhar as eleições. Parece que sempre e em tudo queremos ganhar. Mas, no evangelho de hoje, Jesus “joga água fria na fervura” quando diz: “o que adianta o homem ganhar o mundo inteiro, mas perder a sua vida” (Mt 16,26).
Sabemos, que certas coisas não vale a pena ganhar, conquistar, inventar, porque o custo humano e social pode transformar o ganho em um desastre. Em troca de vantagens pessoais e econômicas, podemos perder pessoas queridas e amizades. Nem tudo que nos é oferecido é tão bom e inofensivo quanto parece. “Nem tudo o que brilha é ouro”, diz um provérbio popular. Mas parece que sempre houve um confronto entre o projeto divino e a mentalidade humana atualmente caracterizada pelo relativismo, neoliberalismo e a globalização.
Na 1ª leitura ouvimos que o profeta Jeremias entrou em crise porque quando fiel ao projeto divino tornava-se motivo de chacota e de gozações. Talvez muitos de vocês já passaram por isso, muitas pessoas sentem isso, na família, na escola, no trabalho, no clube. Quantas pessoas fazem chacota de nós porque procuramos viver de acordo com o Evangelho. Você nunca foi chamada de “carola” quando disse que ia à igreja para a missa? Jeremias passou pela mesma situação e, como demonstram suas palavras, a crise interior quase o fez “jogar a toalha”. A mesma coisa acontece com a gente. Diante de tantas provocações e distorções do que dizemos e pensamos, a gente tem vontade de abandonar tudo. É nessas horas que ouvimos Jesus falando: quem não assumir a Cruz, quer dizer, quem não assumir o projeto do Evangelho, “não é digno de ser meu discípulo”.
Essas palavras de Jesus soam muito duras em nossos ouvidos porque parece que temos que sofrer. “Tome sua cruz!” O que é a cruz? Para dizer a verdade, cada vez que a gente ouve a palavra “cruz”, a gente se assusta. Não gostamos da cruz, por isso, ela não se encontra mais na parede de nossas casas e apartamentos, porque não combina com os quadros da sala. A cruz assusta. A nossa reação natural é de repugnância e desgosto.
A solução melhor seria fugir da cruz. Apagar a cruz do dicionário. Tirar o calvário do mapa. Certamente, vocês concordam comigo, não gosto muito de Jesus pregado na cruz.
O jornalista e escritor Liszt Rangel realizou uma pesquisa para entender a passagem de Jesus pela Terra e chegou à conclusão: “Se conseguirmos retirar Jesus da cruz, nós teremos maior facilidade para seguir os seus ensinamentos."
Mesmo querendo retirar Jesus da cruz, o que não podemos é mudar seus ensinamentos. E ele nos diz: “Se alguém me quer seguir, renuncie a si mesmo, tome sua cruz cada dia e siga-me”.
Tomar cada dia a cruz. Nossa cruz não é de madeira, de gesso ou de ferro. E o que significa tomar uma cruz e seguir Jesus? Nossa vida está cheia de cruzes. É um paraplégico ou deficiente visual na nossa família, é o barulho e outros incômodos dos nossos vizinhos, é um filho ou filha que aprontou alguma, ou uma pessoa no trabalho ou da família que nos maltrata, etc. São várias cruzes que temos de carregar para poder seguir Jesus.
Quando decidimos seguir a Jesus precisamos ter disposição para enfrentar o que der e vier. Rejeição da família, desprezo dos pais, zombaria dos colegas, cruz das tentações, seduções, da vaidade, etc.
Precisamos estar prontos para os conflitos internos com nossos próprios interesses. Quando decidimos seguir a Jesus começa uma guerra, um conflito dentro de nós, é o que Paulo chama de luta da carne contra o espírito. Em outras palavras, começa um conflito entre os meus interesses e os interesses do reino; entre o que eu penso e o que a Bíblia diz; entre a minha vontade e a vontade de Deus. Há coisas que eu faço e gosto e Jesus me diz que é pecado. Tomar a cruz é ter disposição para obedecer a Jesus. “Importa mais obedecer a Deus do que aos homens”.
O que significa “tomar a cruz” de Jesus e segui-lo? A cruz é a expressão de um amor total, radical, que se dá até a morte. Significa a entrega da própria vida por amor. “Tomar a cruz” é ser capaz de gastar a vida – de forma total e completa – por amor a Deus e para que os irmãos sejam mais felizes.
Frei Gunther Max Walzer, Ofm