Homilia - 05/07/2015 - 14º Domingo do Tempo Comum
Já perceberam as etiquetas que colamos em nossas conversas na testa dos outros?
– Este moco que não conta do recado não é o filho de fulana que já passou por depressões fortes? - Ah, é!
- Este não é aquele menino de 12 anos que foi encontrado todo drogado, cujos pais ambos trabalhando – há pouco tempo se separaram? – Ah, é!
-Este não é o filho do carpinteiro que cresceu em família humilde, mas mesmo assim talvez por um complexo de superioridade se acha o Messias? Ah, é!
Ou a gente é mais direto: Você é assim mesmo; eu te conheço! Eu sei o que posso esperar de você. Eu não esperava outra coisa!
Este tipo de comportamento produziu uma série de provérbios horríveis: „Dize-me com que andas e te direi quem tu és“ – „Pau que nasce torto morre torto“. Provavelmente, olhando para a nossa infância, nós nos lembramos de muitas feridas abertas por observações desse gênero que nos carimbaram.
O Evangelho de hoje nos conta um episódio interessante: Quando Jesus já se havia tornado popular e famoso por seus milagres e seu ensinamento, Jesus voltou um dia ao seu lugar de origem, Nazaré e, como de costume, foi ensinar na sinagoga. Mas dessa vez não despertou nenhum entusiasmo, ninguém cantou hosana! As pessoas não queriam escutar o que ensinava e começaram a questionar a sua origem: «De onde ele tirou esta sabedoria? Não estudou; nós o conhecemos bem; é o carpinteiro, o filho de Maria!». Achavam que ele não tinha capacidade para dizer todas aquelas coisas.
Além do preconceito, nos rodeia por todos os lados a desconfiança. A gente desconfia de quase tudo. Desconfiamos de pessoas, desconfiamos de promoções comerciais, desconfiamos de políticos, desconfiamos de promessas milagrosas; desconfiamos de tantas coisas que é difícil dizer em que e em quem ainda confiamos. Cada vez mais, a gente ouve dizer que “hoje não se pode confiar em mais ninguém”. Em casos extremos — e sabemos que, infelizmente isso acontece — a desconfiança faz com que membros de uma mesma família desconfiem um do outro: é irmão que não confia em irmão, pais não confiam mais nos filhos e, filhos que não confiam nos pais.
E qual é a causa de tudo isso?
Olhando para as leituras de hoje, a causa mais evidente é a arrogância. Na primeira leitura, o próprio Espírito do Senhor diz a Ezequiel: “A estes filhos de cabeça dura e coração de pedra, vou te enviar”. O salmista reclama da arrogância dos ricos e do desprezo dos orgulhosos: “Já é demais esse desprezo! Estamos fartos de escárnio dos ricaços e do desprezo dos soberbos”!
O texto do Evangelho repete a idéia que aparece nas duas leituras deste domingo. Deus manifesta-se às pessoas na fraqueza e na fragilidade. Normalmente, Ele não se manifesta na força, no poder, nas qualidades que o mundo acha brilhantes e que as pessoas admiram. Deus vem ao nosso encontro na fraqueza, na simplicidade, na debilidade, na pobreza, nas enfermidades, nas pessoas mais humildes e despretensiosas.
Por isso, tomemos cuidado para não nos fecharmos nos nossos preconceitos e esquemas mentais bem definidos e arrumados.
Por que não aceitaram Jesus? Jesus questionou seus conterrâneos. Exigiu deles mudança de vida. Por isso não aceitaram Jesus.
É assim: O profeta para anunciar o projeto do Reino de Deus precisa, também, denunciar os erros das pessoas e precisa insistir para que se convertam. Nem todos aceitam. Há gente de coração de pedra que não se deixa tocar pelo Evangelho. Há gente que goza de quem segue Jesus. O que fazer? Desanimar e “entregar os pontos” ou pedir força a Jesus e seguir em frente, como o profeta que sofre injúrias, mas sabe ver a vontade de Deus nos desafios da vida?
O que fazer quando os outros e mesmo nossos parentes e familiares nos desprezam porque seguimos os ensinamentos de Jesus, por irmos à missa com frequência ou ainda rezarmos o terço todos os dias?
Não nos esqueçamos: Na fraqueza humana manifesta-se a força divina. Assim não há motivo para o desânimo! Não somos todos nós cristãos chamados a dar testemunho, a falar e a agir em nome de Deus? Não é Deus que nos chama a ser profetas quando se trata de salvar ou defender, de ajudar uma pessoa, um grupo de irmãos que vêm sofrendo injustiças, desprezo ou opressão?
Os profetas não tinham medo, Paulo e os apóstolos eram corajosos, Jesus não recuou diante da ameaça de ser crucificado. Não podemos recuar alegando que somos fracos, não temos jeito de falar ou não temos coragem. Justamente, neste mundo das contradições devemos tomar uma atitude firme.
Neste mundo em que a aparência vale mais do que o ser que se esconde dentro da pessoa;
Neste mundo em que o dinheiro, o carro, o nome valem mais do que o próprio caráter.
Neste mundo em que as leis são manipuladas e tudo vira em pizza.
Neste mundo em que o luxo e o conforto são sinônimos de felicidade.
Neste mundo em que o adultério virou moda.
Neste mundo em que o corpo é uma mercadoria exposta.
Neste mundo cheio de filosofias esotéricas, religiões e seitas estranhas, devemos ser profetas que a falam e que agem.
Não desanimemos, tenhamos coragem de marcar a nossa presença cristã diante de tanta ausência, repreendamos com coragem a liberalidade libertina, digamos a verdade onde há tantas mentiras, mostremos o nosso pudor onde há tanta sem-vergonhice.
Jamais duvidemos da ação e da força de Deus.
Mesmo que os outros discordem de nós, ou melhor, justamente, quando há contradição, é que devemos falar e agir. Sabemos que Deus não nos deixa fracassar. Para Deus fracasso e vitória são uma coisa só. O fracasso mais profundo foi o êxito definitivo do plano de Deus: A cruz de Cristo transformou-se em ressurreição.
Frei Gunther Max Walzer, Ofm