Homilia - 10/04/2016 - III Domingo da Páscoa
Certamente, todos nós já tivemos sentimentos de fracasso, frustração e derrota. Apesar de tanto esforço que fizemos, tanta luta que enfrentamos, nada conseguimos, tudo foi em vão. Sentimo-nos lá no chão, sentimos o desânimo do pescador que, depois de uma noite inteira de trabalho, chega em casa com a rede vazia. No final do dia, às vezes, a gente diz: Foi um dia perdido. Parece que o trabalho e o cansaço foram todos em vão, foi um tempo perdido. Nestes momentos, costumamos pensar: será que fiz tudo certo? Ou nos perguntamos, em que errei? Porquê não consegui nada?
No texto do Evangelho de hoje, vemos os apóstolos numa situação desesperadora. Depois da morte de Jesus, deste homem pelo qual eles tinham deixado tudo para trás, durante vários anos o tinham acompanhado, agora, também, pensavam: tudo foi um tempo perdido. Estavam voltando à vida acostumada, à vida comum que levavam antes de conhecerem aquele Jesus.
Assim, os discípulos de Jesus agora estavam lá na Galiléia, à beira do lago de Tiberíades. Eles resolvem ir pescar. “Eu vou pescar”, disse Pedro. “Também vamos contigo”, disseram os outros. Passaram a noite inteira pescando e, dessa vez, nada!
Quando estava amanhecendo, alguém, lá da margem não muito distante, gritou: “Moços, vocês têm alguma coisa para comer?”. “Não”, responderam eles. “Então atirem a rede aí do lado direito de vocês, lá vocês vão pegar alguma coisa”. Assim falou aquele homem estranho. Eles não reconheceram Jesus e poderiam dizer “para que tentar de novo”, mas foram e jogaram a rede. Aí, aquele discípulo que era o maior amigo de Jesus (João) percebeu que aquela pessoa era o próprio Jesus. Cochichou para Pedro: “É o Senhor!”. Pedro que estava sem roupa, vestiu-se depressa e se jogou na água ao encontro de Jesus. Quanto aos outros, foram de barca arrastando a rede cheia de peixes.
O milagre aconteceu, porque tentaram de novo apesar da situação de desespero em que se encontraram. Não apenas acontece o milagre, mas eles, neste momento, reconheceram Jesus que lhes dá coragem de tentar de novo. Diz o Evangelho de João que “esta foi a terceira vez que Jesus, ressuscitado dos mortos, apareceu aos discípulos” (Jo 21,14).
Neste encontro com Jesus ressuscitado, mais um episódio nos chama a atenção. Assim que acabaram de comer, Jesus insistiu por três vezes com uma mesma pergunta a Pedro: “Pedro, filho de João, eu sei que vocês todos me amam. Mas eu pergunto: Você, você me ama mais do que estes seus companheiros?”. “Sim, Senhor, tu sabes que eu te amo”, respondeu Pedro, prontamente. E Jesus diz: “Apascenta os meus cordeiros”. Quando Jesus perguntou pela terceira vez, Pedro respondeu: “Senhor, tu sabe tudo; tu sabes que eu te amo”.
No fim, Jesus diz a Pedro: “Siga-me!”.
Todos seguiram Jesus até a morte. Quando Pedro e os apóstolos começaram a falar em público sobre o Jesus ressuscitado, começaram as perseguições. Em Jerusalém, foram logo presos, interrogados, proibidos de falar sobre esse homem, como ouvimos na primeira leitura dos Atos dos Apóstolos. “Então mandaram acoitar os apóstolos e proibiram que eles falassem em nome de Jesus”.
E por tudo o que passaram ainda ficaram muito contentes, pois, viam, com certeza, na pessoa do Jesus agora vencedor da morte, o Maior, o Máximo, aquele que está acima de tudo e de todos. É o que está testemunhando mais tarde o próprio apóstolo João, exilado na ilha de Patmos, ao escrever aquela visão que teve, de uma imensa multidão vitoriosa em volta do trono do Ressuscitado, proclamando em alta voz: “O Cordeiro imolado é digno de receber o poder, a riqueza, a sabedoria e a força, a honra, a glória e o louvor”, como ouvimos na segunda leitura do Apocalipse.
Encontramos Jesus, o Ressuscitado, também, em nossa vida, em nosso dia a dia, em cada situação. Em nossas situações de desespero e desânimo, Jesus, o Ressuscitado aparece a nós e diz: “Coragem, eu estou com você”. Evidentemente, nem tudo vai mudar de uma hora para a outra. Creio que acontecem tantos pequenos milagres em nossa vida que passam, muitas vezes, despercebidos por nós. Mas, eu preciso ter coragem e tentar novamente.
Foi um dia perdido quando passou o dia sem ter percebido a solicitação de Jesus Ressuscitado de trabalhar no seu projeto, de construir uma sociedade com mais justiça, mais solidariedade e mais fraternidade.
“Seja feita a Vossa vontade”, assim Jesus nos ensinou a rezar. Mas “fazer a vontade de Deus” seria o mesmo que não lutar, baixar a cabeça, não se indignar? Seria o mesmo que aceitar tudo sem reclamar e pronto? Será que não é por causa dessa passividade, justamente, que estão aumentando as injustiças, a exploração, a opressão, a corrupção?
Vivemos desanimados com tudo. “Seja como Deus quiser“, a gente ouve, muitas vezes, essa frase.
Ou nós, também, somos daqueles que dizem: “Não adianta mesmo”. Se for assim, estamos preocupados apenas com a nossa vidinha particular, somos muito individualistas. Tentamos salvar o nosso projeto pessoal e deixamos de lado o projeto de Jesus, que olha para aquilo que é de todos.
O projeto de Jesus exige de nós desinstalação. É claro que o projeto de Jesus incomoda, é exigente.
Quem vai querer, depois de uma noite inteira de trabalho inútil e cansativo, ainda voltar ao mar e jogar as redes? Quem depois de tantas tentativas e fracassos, de tanto cansaço ainda vai querer começar uma nova maneira de viver?
“Eu te amo”, diz Pedro. Bem sabemos que as palavras “te amo”, infinitamente repetidas em todos os tempos, na maioria dos casos podem ser apenas uma expressão passageira e vazia do sentimento humano.
Mas o olhar de Jesus soube ir além das simples palavras de Pedro, que ao dizer “te amo”, não estava blefando: mais tarde Pedro daria sua vida por amor. Porque amor, no fundo, é isso: fazer da própria vida um dom para a felicidade do outro.
“Tu sabes que eu te amo.”. É emocionante, é lindo e divino saber que alguém nos ama. Da mesma forma, é emocionante e divino que outros escutem de nós essa mesma declaração de amor.
Esta é a mensagem das leituras de hoje para nós:
Quando o nosso trabalho não dá resultado, quando passamos por noites de desânimo, quando somos não só ignorados, mas até mal vistos, quando passamos por experiências de total abandono, uma noite inteira de trabalho perdido é transformada pela presença do Ressuscitado numa manhã de amor e de alegria. A ressurreição acontece na minha vida.
De repente um nó insolúvel se desata, uma conversa produz resultado, a minha tensão interior desaparece... porque sei: não estou sozinho, o Ressuscitado está comigo.
Jesus, o Ressuscitado se encontra, também, em nossa vida, em nosso dia a dia, em cada situação. Em nossas situações de desespero e desânimo, Jesus, o Ressuscitado aparece, também, a nós e nos diz: “Coragem, eu estou com você”.
A palavra “segue-me” dirigida a Pedro, é dita hoje a cada um de nós.
Mas é sempre bom lembrar que, assim como para Jesus e para Pedro, a prova do nosso amor só pode ser o caminho do calvário.
E em cada Eucaristia, e mais concretamente agora, nesta Eucaristia, que estamos celebrando, Jesus renova para nós o convite: “Segue-me!”.
Frei Gunther Max Walzer