Homilia - 04/09/2016 - XXIII Domingo do Tempo Comum
Muitos já participaram ou viram nos meios de comunicação as missas com grandes multidões, as grandes concentrações religiosas como Congresso Eucarístico ou Jornadas Mundiais da Juventude, a explosão de entusiasmo na visita do Papa ao Brasil e, recentemente, na Polônia, as concentrações eufóricas em Roma neste Ano Jubilar. As grandes concentrações atraem multidões. Conforme a opinião de muitos, a prática da religião deve ser alegre e espontânea.
No Evangelho de hoje, lemos: “Grandes multidões acompanhavam Jesus”. Jesus, humanamente falando, tinha tudo nas mãos para ser um grande líder do povo: sua oratória atraía multidões, com seus milagres os discípulos ficaram extasiados, ele interpretava de uma maneira nova as Escrituras. Jesus, porém, não tinha vocação de político para angariar votos nas eleições. Por isso nunca prometeu vantagens materiais ou posições honrosas, mas disse que, para ser seu discípulo, devia-se aceitar a cruz. “Quem não carrega sua cruz e não caminha atrás de mim, não pode ser meu discípulo”.
Isso significa: desprendimento total dos familiares, desprendimento dos bens materiais. “Se alguém vem a mim, mas não se desapega de seu pai e sua mãe, sua mulher e seus filhos, seus irmãos e suas irmãs e até da sua própria vida, não pode ser meu discípulo”.
As palavras de Jesus são duras e podem assustar. Seguir Jesus não é só euforia, canto, missas “bonitas”.
Quando Jesus nos pede o desapego dos próprios familiares (“odiar” em algumas traduções), na verdade, está querendo dizer que ele deve estar em primeiro lugar na nossa vida. Ele quer ser o centro da nossa vida, quer ser tudo em nosso coração. Quer ser mais do que qualquer afeto, mais do que uma família, mais do que qualquer outra coisa ou satisfação que o mundo nos possa dar. Jesus com convicção nos diz que só ele pode preencher o coração de quem o segue, e por isso, é extremamente duro e exigente.
Mas, nos pedindo que o sigamos sem condições, como pretende preencher o coração do ser humano?
Na verdade, as palavras de Jesus tocam certas durezas da vida de todos, onde os afetos mais belos dos pais, dos filhos, do cônjuge, dos irmãos e dos amigos, são marcados, muitas vezes, pelo cansaço e pela incompreensão. Até mesmo quando se está apaixonado, ou quando nos alegramos pelo carinho de uma pessoa querida, experimentamos, de algum modo, a precariedade daquela relação, já que ela sempre é condicionada e limitada. É esta precariedade que Jesus quer evidenciar nas suas duras palavras.
Naturalmente, Jesus não pretende desvalorizar os afetos humanos. Ele orienta, porém, que o sentido da nossa vida não é esgotado nestes afetos. Devemos reconhecer que o sentido da vida é algo maior.
Esse Evangelho revela que o seguimento de Jesus é uma decisão pessoal. Não é possível seguir Jesus simplesmente “no meio da massa” que não sabe muito bem para onde está indo. Cada um precisa refletir se está mesmo disposto a assumir o caminho da fé proposta por Jesus. Daí Jesus exemplificou o que disse com duas comparações: a construção de uma torre e o combate do inimigo. Estas comparações revelam que quem abraça a proposta do Reino tem de se preparar para exigências e consequências das quais não pode fugir, sob o risco de fazer da fé um engano a si mesmo.
Muitos hoje, como no tempo de Jesus, buscam na fé apenas a satisfação de suas necessidades pessoais: a solução de problemas imediatos, como saúde, finanças, relacionamentos. Outros veem na fé a oportunidade de se dar bem na vida, alcançando prosperidade material.
Misturar a fé com outros interesses não dá certo! Por que não? Sabemos que num copo não cabem, ao mesmo tempo, líquidos diferentes, por exemplo vinho e cerveja. No mesmo coração não cabem, ao mesmo tempo, o amor a Deus e o amor às coisas materiais. É necessário escolher um entre os dois. Mesmo assim, existe muita gente que quer equilibrar-se numa corda bamba, isto é, satisfazer as exigências do mundo pagão e não perder a aparência de cristão. Cristãos de casca apenas, cristãos de casaca virada. Participam da missa e participam da sessão espírita, vão à romaria e vão a cartomante e benzedeiras.
Evidente é que um programa onde se fala da cruz não tinha nada de atrativo. Por isso era até de se admirar que alguns seguissem Jesus, mas, por outro lado, também se entende que o número dos que o seguiram mesmo foi e sempre será reduzido. Sempre será o “pequeno rebanho”.
Este pequeno rebanho transformou-se, hoje, numa grande multidão de mais de cem milhões de fieis que acompanharam a canonização de uma grande mulher, Madre Teresa de Calcutá.
Esta "incansável benfeitora da humanidade", como foi chamada pelo papa João Paulo II, foi canonizada um dia antes dos 19 anos de sua morte em Calcutá, em 5 de setembro de 1997, aos 87 anos.
Madre Teresa, que dedicou sua vida aos pobres e doentes, alcançou a glória dos altares durante o Ano Santo da Misericórdia e nos deixou uma mensagem muito atual porque nos convida a superar a indiferença perante tanta miséria e pobreza.
O anúncio da canonização foi feito em março passado depois que o Papa reconheceu que a Madre Teresa intercedeu em um segundo milagre em 2008 para a cura inexplicável de um brasileiro que estava em fase terminal por problemas cerebrais decorrentes de oito abscessos no cérebro.
A canonização tornou-se significativa para os católicos brasileiros porque foi a cura milagrosa de um brasileiro que tornou possível o reconhecimento da santidade de Madre Teresa. “Santos, cidade de santos”: assim tem sido chamada a cidade do litoral de São Paulo depois de o Vaticano ter reconhecido o milagre operado por Madre Teresa de Calcutá em Marcilio Haddad Andrino. Hoje ele vive sem alguma sequela.
São Francisco teve um encontro com um leproso que mudou o rumo de sua vida. Assim, para Madre Teresa foi o dia 10 de setembro de 1946, dia que ficou marcado na história das Missionárias da Caridade – congregação fundada por Madre Teresa – como o “Dia da Inspiração”. Durante uma viagem de trem ao noviciado do Himalaia, Madre Teresa encontrou um irmão pobre de rua que lhe disse: “Tenho sede!”. A partir deste momento, ela afirmou ter tido a clareza de sua missão: dedicar toda sua vida aos mais pobres dos pobres.
“Qualquer ato de amor, por menor que seja, é um trabalho pela paz”. Mais do que falar e escrever, Madre Teresa de Calcutá viveu este seu pensamento.
Santa Teresa de Calcutá, rogai por nós!
Frei Gunther Max Walzer