Homilia - 06/11/2016 - Solenidade de Todos os Santos
Festejamos, hoje, a solenidade de “Todos os Santos”. Nosso povo católico gosta muito dos santos. Quem são esses santos? A Igreja apresenta os santos como exemplos, modelos para a nossa vida cristã. Seu exemplo de vida nos deve estimular para chegarmos lá aonde eles chegaram: à perfeita comunhão com Deus na eterna felicidade.
No entanto, sabemos que o povo, de modo geral, não procura os santos com esse objetivo. A maioria vê os santos como “milagreiros”, talvez até como “quebra-galhos”. Uns querem curas, outros emprego, outros proteção contra acidentes. Enfim, cada um tem seu santo preferido para resolver algum problema particular.
Na segunda leitura, São João nos fala que todos somos santos porque somos chamados filhos de Deus. E nós o somos mesmo! Somos santos por vocação, por eleição.
Então, é possível ser santo? Claro: é mesmo a vontade de Deus: "Sejais santos como Eu sou santo". Como será possível? Haverá um caminho para chegar ao Céu e estar junto com os santos? Há, sim, é Jesus: "Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida", disse Jesus. O nosso caminho de santidade é o próprio Jesus.
As chamadas "Bem Aventuranças" que temos ouvido no Evangelho não são outra coisa, a não ser um "roteiro", um "mapa" que nos indica o caminho seguido pelos santos, e que nós temos de seguir.
Ao proclamar as bem-aventuranças, Jesus descreveu a dinâmica da santidade. A palavra “bem-aventurado” é sinônimo de “santo”. Portanto, santos são os pobres em espírito. E quem são esses pobres? É o desocupado, o desabrigado, o faminto ou o mendigo? Será que Jesus quer exaltar a miséria? Pobre pode ser você que é médico, operário, agricultor, estudante, idoso, moço, artista, político, empregada doméstica, dona de casa. É você se sabe ler as “bem-aventuranças” de uma maneira nova, quem consegue dar uma nova versão.
Quem, em vez de ler “felizes os pobres em espírito”, lê: “Santos são os que se comprometem com o pobre”, “santos são os que sabem partilhar os alimentos, a ciência, a alegria, o seu tempo e a sua vida”. Este entendeu melhor as palavras de Cristo dirigidas a uma sociedade fascinada pela riqueza e pelas coisas materiais.
Com certeza, estes santos possuirão o Reino dos Céus.
“Bem-aventurados os mansos”. Santos são os mansos, que por não responderem à violência com violência. Quantas vezes somos impacientes, ficamos nervosos, sempre prontos para reclamar dos outros e levantamos a voz, como se fôssemos os patrões e donos do mundo.
Este é o caminho do Senhor: o caminho da mansidão e da paciência. Jesus percorreu esta estrada: desde pequeno suportou a perseguição e o exílio, e depois, de adulto, as calúnias, as armadilhas, as falsas acusações no tribunal, e tudo isso ele suportou com mansidão. Suportou até mesmo a Cruz por amor a nós.
“Bem-aventurados os aflitos porque serão consolados”. Como podem ser felizes as pessoas que choram? Quem na vida nunca sentiu tristeza, angústia e dor, nunca conhecerá a força da consolação.
Podem ser santos aqueles que têm a capacidade de se comover, a capacidade de sentir no coração a dor existente em suas vidas e na vida dos outros. Estes serão santos! Porque a mão tenra de Deus os consolará e os acariciará.
Santos são os famintos e sedentos de justiça, que não pactuam com a maldade, nem se deixam levar pela lógica da dominação e do poder. Deus mesmo haverá de realizar seu ideal e fazê-los contemplar o reino da justiça.
Jesus declara, também, que os misericordiosos são bem-aventurados. É uma bem-aventurança que, de algum modo atrai algo para si próprio. Quer dizer, os misericordiosos atraem a misericórdia divina para suas vidas.
Estamos vivendo as últimas semanas do Ano Santo da Misericórdia, que se encerrará daqui a dois domingos, na celebração da Festa de Cristo Rei. Neste tempo do Ano Santo da Misericórdia, tivemos a graça de meditar, refletir e aprender o que significa misericórdia. Compreendemos que a misericórdia não é um sentimento de pena para com quem sofre, como nós, muitas vezes, pensamos mas é uma atitude. A misericórdia nasce, sim, de um sentimento de compaixão, da capacidade de sentir aquilo que o outro sente, de ver com os olhos e de sentir no próprio coração aquilo que o outro está sofrendo. Mas, a pessoa misericordiosa não pára no sentimento que desperta emoção. Assume uma atitude diante do sofrimento do outro. Como fez o Bom Samaritano, aproxima-se do sofredor, seja que sofra no corpo ou no espírito; aproxima-se e toma atitude. Procura fazer alguma coisa para aliviar sua dor e tirar dele o sofrimento. A misericórdia nunca pára no sentimento, mas sempre se concretiza em atitudes a favor do miserável que, repito, pode ser no corpo como no espírito.
Outra passagem que ficou muito marcada neste Ano Santo da Misericórdia foi o lema escolhido por Papa Francisco: “sede misericordiosos como o Pai é misericordioso” (Lc 6,36). É uma proposta divina que nos conduz à divinização ou, como chamamos em nossos dias, nos conduz à santificação. De fato, este convite para se tornar misericordioso como o Pai é misericordioso, desdobra-se também no convite de Jesus: “sede santos porque o vosso Pai é santo” (Mt 5,48). Em outras palavras a santidade é o acolhimento da misericórdia divina na vida humana e a partilha desta mesma misericórdia através de uma vida vivenciada na fraternidade. Nós nos tornamos santos e santas na medida em que praticarmos concretamente obras de misericórdia.
Santos são os puros de coração, que não agem com segundas intenções e nem falsidade, mas sim, com transparência.
Santos são os promotores da paz, que procuram criar laços de amizade e banir toda espécie de ódio, a fim de que o mundo seja mais fraterno.
Santos são os perseguidos por causa da justiça, os que lutam para fazer valer o projeto de Deus para a humanidade.
Este é o caminho da santidade que todos somos chamados a percorrer. As bem-aventuranças constituem, de fato, o programa de vida do discípulo de Jesus. Se quisermos uma cartilha do cristão, aí está. Se alguém preferir um manual para ser um verdadeiro cristão, para ser santo é só aplicá-lo.
É deste modo e desta forma que os santos e as santas se santificaram em todos os tempos da história da Igreja. Exemplo recente disto foi a canonização de Madre Teresa de Calcutá. Uma santa que viajou em nossas estradas, em nossos aviões, pisou em nosso Brasil... ela se santificou sendo uma mulher misericordiosa. Foi santificada, quer dizer, participava da santidade divina entre nós, sendo misericordiosa com todos, especialmente com os últimos entre os últimos, com os descartados sociais, no dizer de Papa Francisco.
Como vemos, para Jesus a santidade é algo ao alcance de todos, e ser santo é sinônimo de ser feliz.
Frei Gunther Max Walzer