Homilia - 22/01/2017 - Terceiro Domingo do Tempo Comum
“O povo que vive na escuridão verá uma forte luz!”
A palavra chave do Evangelho que acabamos de ouvir é a palavra “LUZ”. A luz é uma das primeiras necessidades da vida. Queremos ver, enxergar. Não nos sentimos bem no escuro tornamo-nos inseguros, medrosos. Mesmo uma pequena chama alivia nossa angústia.
Mas, em nossa vida, há escuridão em muitos momentos e situações. Procuramos uma luz, uma pequena chama, uma esperança, uma saída. Neste momento, em que estamos reunidos aqui para refletir sobre a Palavra de Deus, haja talvez escuridão em nosso coração... E quanta escuridão ao redor de nós... Atualmente, o mundo vive numa enorme escuridão, um mundo cheio de guerras, de violência e desigualdade. Conforme a estatística há no mundo mais de 65 milhões de refugiados, um número que supera a população de todo o Reino Unido. Buscamos angustiadamente alguém que possa ser uma luz nesta situação. Buscamos a mão de alguém que pode nos tirar do sofrimento. Onde está aquela luz? Onde está a mão do irmão?
Lemos no Evangelho deste domingo que Jesus mudou sua residência de Nazaré onde fora criado e vivera por longos anos para a cidade de Cafarnaum, às margens do lago da Galiléia. Ele poderia ter-se dirigido a Jerusalém, na Judéia, a Cidade Santa dos judeus. Todavia, a escolha da Galiléia como ponto de partida de sua pregação foi intencional, devido ao simbolismo ligado àquela região.
No passado, os habitantes do norte de Israel foram vitimados por tropas estrangeiras, que invadiram o território judeu. Além disso, para impor sua dominação, trocaram a população local por outra, trazida do exterior. Daí em diante, apelidou-se de "Galiléia dos Pagãos" o território ocupado por populações não judaicas.
O texto de Isaías, citado no Evangelho, tem como pano de fundo este fato. O povo estava numa situação de guerra, muita violência, miséria, devido à invasão das suas terras pelo exército assírio. Outra escuridão envolvia o mundo, a escuridão formada pelas obras do mal: ódios, maldades, violências, opressão, corrupção...
O povo estava nas trevas da morte, mas o profeta Isaias viu uma esperança, uma luz que iria brilhar. “O povo que andava nas trevas viu uma grande luz; sobre aqueles que habitavam uma região tenebrosa resplandeceu uma luz” (Is 9,1). A luz que começou a brilhar é Jesus que iniciou sua pregação justamente a partir da Galiléia.
A pregação de Jesus pode ser resumida em poucas palavras: “Convertei-vos porque o Reino de Deus está perto”. Converter-se quer dizer: mudar radicalmente a maneira de pensar e de agir.
Para continuar sua missão, Jesus chama os apóstolos. Eles deveriam anunciar a Boa Nova e curar os doentes, isto quer dizer fazer gestos concretos de salvação.
Neste Evangelho se fala de quatro pessoas chamadas por Jesus. Ele lhes disse: — Venham comigo, que eu ensinarei vocês a pescar gente. O que chama a atenção é que eles deixaram tudo imediatamente e seguiram Jesus.
Como entender a expressão “ser pescador de gente”? Nenhum peixe gosta de ser pescado com anzol ou na rede. O significado da expressão usada por Jesus é diferente. Para certos povos antigos o mar é sinônimo de algo escuro, terrível, caótico. Lá viviam os grandes monstros marinhos, os demônios, as forças inimigas da vida. Pescar pessoas quer dizer, arrancar as pessoas dos tentáculos do mal que laçam, dominam e arrastam. Não quer dizer que a Igreja deve “pegar a laço” novos membros, mas que ela deve se preocupar de lutar contra os perigos e sofrimentos que ameaçam as pessoas.
O chamado de Jesus não é só para Pedro e André, Tiago e João, mas para todos nós. Esse chamado atingiu a mim e atinge também a você; talvez fosse melhor dizer: continua atingindo a mim e continua atingindo você.
Jesus chama seus colaboradores do meio do povo, gente simples, trabalhadora. Não é um grupo seleto, mais letrado ou mais importante. Somos todos e todas encarregados de ajudar as pessoas a se reencontrarem com a proposta de Jesus. Uma proposta que, hoje, tem seu fundamento nos ensinamentos do Evangelho e não em partidarismos, em posições extremistas que dividem, confundem ou alienam o povo. Há propostas que divulgam interesses pessoais e criam partidos na Igreja como nos falou a segunda leitura de hoje: “Eu sou de Paulo, de Apolo, de Pedro”...
Paulo se defronta com um problema de divisão na comunidade. Alguns membros da comunidade admiravam Apolo. Segundo os estudiosos da Bíblia, Apolo era um pregador com a palavra fácil, que dominava a arte de falar em público; falava bem e impressionava; um artista da oratória. Transferindo para a linguagem de hoje, Paulo chama atenção para os “fãs clubes”. Alguns seguem aquele padre cantor, outros gostam mais daquele autor, tem aqueles que acham aquele pregador simpático no modo de falar... “Sou do padre tal, do grupo tal, da paróquia tal”. Paulo reprova este comportamento por um motivo que precisamos ficar atentos: podemos ter nossas preferências, mas não transformar essas pessoas em nossos mestres de vida. Nosso único Mestre é Jesus.
Como aconteceu com os primeiros discípulos, Jesus continua passando e chamando na cotidianidade de nossas vidas. Infelizmente, a distração ou o barulho externo é maior e, por isso, a voz e o olhar do Mestre não tocam a vida pessoal, a ponto de se tomar uma atitude ao seguimento.
Temos de ”deixar tudo”! Como entender isso? Esse “deixar tudo” é mais uma mudança interior. É aquela conversão de que Jesus fala: mudar radicalmente de ideias, de ambições e opções por outras. Podemos deixar fisicamente nosso ambiente e ir longe, mas não é isto que é importante. Importante é “mudar de eixo” interior, no sentido espiritual.
E para sermos pescadores de pessoas não podemos ter medo das ondas, mesmo quando são violentas. Nunca podemos deixar de fazer tudo para salvar um irmão, ainda que este se encontre em situação desesperadora, quando está envolvido em drogas, quando se entrega a uma vida desregrada, quando se envolve em situações perigosas. O que caracteriza a autenticidade evangélica é a libertação do mal praticada e ensinada por Jesus.
“O Senhor é minha luz e salvação”, assim reza o salmo deste domingo. Deus nunca nos abandona. Apenas pede que sejamos fieis e respondamos a seu chamado de ir ao encontro dos que ainda vivem nas trevas do erro e do pecado.
Frei Gunther Max Walzer