Homilia - 14/10/2018 - XXVIII Domingo do Tempo Comum
Vivemos um momento histórico no Brasil: eleição de nossos representantes políticos e vivemos, atualmente, uma crise profunda em nosso país. As crises não aparecem do nada, como um passe de mágicas, as crises têm uma ou várias origens. É uma constatação que encontramos em qualquer livro de História, até mesmo naqueles nos quais nossos filhos e filhas e nós próprios estudamos na escola. O primeiro momento da crise está na falta de honestidade, no desrespeito moral e na ausência da ética.
"Vamos virar essa página ruim da política brasileira", afirmou um político eleito no domingo das eleições no Brasil. Como?
Esta gente que levou o Brasil para a crise — “nunca na história deste país” se viu uma crise tão grande — não agiu com a sabedoria dos governantes, como ouvimos na 1ª leitura. Salomão herdara de seu pai Davi um reino imenso e — como acontece nestes casos — uma balança de dois pratos foi colocada diante dele: num dos pratos o favorecimento de alguns amigos do governo e, para conseguir a governabilidade, os partidos aliados. No outro prato a prudência dos sábios, a capacidade de ouvir, a paciência do discernimento capaz de considerar as necessidades do povo. Salomão, que era bem mais sábio que nossos atuais governantes, escolheu a sabedoria, a capacidade de ouvir e o discernimento de poder ver as necessidades do povo.
Por causa de sua escolha, ele não foi indiciado em tribunais, mas trouxe prosperidade para o povo. O caminho da imoralidade, escolhido pelos egoístas gananciosos do Brasil, deu no que estamos vendo hoje, com a grande injustiça de jogar nas costas do povo o ônus da irresponsabilidade política.
O que é esta “sabedoria” de que aqui se fala? É, fundamentalmente, a capacidade de fazer as escolhas corretas, de tomar as decisões certas, de escolher os valores verdadeiros que conduzem o homem ao êxito, à realização, à felicidade.
A “sabedoria”, entendida assim, não afastou este rei dos outros bens… Pelo contrário, a opção pela “sabedoria” fê-lo encontrar “todos os bens” e “riquezas inumeráveis”, pois a “sabedoria” está na base de todos eles: “Todos os bens me vieram dela, pois uma riqueza incalculável está em suas mãos (Sb 7,11). É ela que lhe permite gozar os bens terrenos com maturidade e equilíbrio, sem obsessão, sem ideologia e sem cobiça, colocando-os no seu devido lugar e não deixando que sejam os bens materiais a conduzir a sua vida e a ditar as suas opções.
Fala-se muito em reforma e reajuste fiscal. No contexto social que vivemos, o tema da economia está ligada à riqueza, ao dinheiro, a bens de imóveis, a carros, a viagens caras, a empresas e empresários bem sucedidos. Está ligado também a coisas vistosas,bonitas, e até mesmo à beleza, como demonstra a indústria da moda, e está ligada ao lazer. A riqueza tornou-se ostentação e, algumas vezes, uma ostentação moralmente agressiva contra pessoas mais pobres.
Vivendo na mentalidade de riqueza que valoriza o dinheiro e os bens, é muito complicado ouvir, entender e assumir a proposta de Jesus.
O evangelho nos conta que, certa vez, um jovem se aproxima de Jesus e pergunta: “Bom Mestre, o que devo fazer para conseguir a vida eterna?”. O jovem rico cumpre todos os mandamentos de Deus. Ele não deve questionar a si mesmo. Mesmo Jesus não questiona nada. Ele até está gostando dele. Jesus não despreza o jovem rico, mas ele o convida para algo maior. Aí o jovem rico vai embora. A sua riqueza era para ele importante demais e não queria abrir mão de tudo isso. A sua riqueza se tornou uma prisão da qual ele não consegue mais se libertar.
O evangelo de hoje nos embaraça. Pois nós queremos como este jovem rico ser duas coisas ao mesmo tempo: rico e discípulo/a de Jesus. Não devemos, porém, amolecer este evangelho dizendo: “Isso é só para os religiosos que fizeram voto de pobreza.” Não, este evangelo è um questionamento para todos nós. Como lidamos com a nossa riqueza, com aquilo que nós temos à disposiçã? Jesus quer nos alertar por meio do diálogo com o jovem rico para o perigo que está em qualquer riqueza: que sempre quer ter mais. Assim, a riqueza se torna uma prisão, um deus ao qual servimos, mas o dinheiro e a riqueza não servem mais às pessoas.
É neste quadro que podemos entender bem, com uma quase clarividência eu diria, o desabafo de Jesus: “É mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha, que um rico entrar no Reino de Deus”. Rico, de acordo com o pensamento bíblico, é aquele que despreza Deus por causa da ganância, por causa da idolatria do mercado.
Estas palavras de Jesus assustaram, profundamente, os discípulos, que começaram a comentar: "Então quem se poderá salvar?" (v. 26). Mas Jesus, olhando bem para eles, disse: "Aos homens é impossível, mas a Deus não; pois a Deus tudo é possível" (v. 27).
É isso mesmo que temos que aprender: só a força da graça de Deus - em certos casos, um verdadeiro milagre - é que consegue mudar a posição das pessoas fixadas e presas às coisas materiais. A riqueza pode fazer endurecer o coração das pessoas, pode matar a fé, o amor fraterno, a dedicação aos valores do espírito. O dinheiro torna árido o coração, fecha as pessoas no egoísmo, impede que elas se abram na direção de Deus e dos irmãos. Todo o mal-estar que reina no mundo pela má distribuição das riquezas vem daí. Os donos de riquezas querem ficar cada vez mais ricos. E acabam oprimindo os pobres, fazendo-os ficar cada vez mais pobres. Mas não faltam milagres da graça de Deus, abrindo o coração de detentores de grandes fortunas, transformando-os em benfeitores da humanidade, sobretudo pelo exemplo de sua pobreza abraçada pelo Reino dos Céus. Bastaria entre todos o exemplo luminoso do jovem Francisco de Assis.
O que fazer, então? A proposta de caminhar na vida está no Evangelho, o livro da sabedoria. Jesus, na Liturgia, é chamado de “sabedoria de Deus”, aquele que ilumina o caminho, aquele que é o caminho da vida. Se você ler e meditar o Evangelho, principalmente os ensinamentos de Jesus, perceberá que Jesus ensina a viver desapegado dos bens; não recrimina quem tem dinheiro, mas insiste em ter um coração de pobre, que significa ter um coração livre, desapegado, capaz de viver sem esquecer quem precisa de ajuda, capaz de vender aquilo que se tornou peso e causa de tristeza.
Deixo uma pergunta para você: Que tipo de riqueza você busca; que tipo de riqueza você cultiva em seu coração? Medite a Palavra de Deus, principalmente o Evangelho, porque esta penetrará no teu coração e revelará se lá existem correntes ou ídolos que te impedem de ser livre. Amém!
Frei Gunther Max Walzer