Homilia - 04/11/2018 - Solenidade Todos os Santos
Todos os anos, a 1º de novembro, a Igreja Católica honra todos os santos, conhecidos e desconhecidos. Os Santos “canonizados” oficialmente pela Igreja Católica são vários milhares. Mas existe uma imensa quantidade de Santos não canonizados, que já estão na presença de Deus no céu. A eles está dedicada esta festa de hoje.
Segundo o Papa, “estamos unidos a todos os santos, não somente aos mais conhecidos, do calendário, mas também aos ‘da porta ao lado’, aos nossos familiares e conhecidos que agora fazem parte daquela grande multidão”.
“Hoje, então, é a festa da família”, sublinhou Francisco. “Os santos estão próximos a nós, aliás, são os nossos verdadeiros irmãos e irmãs. Eles nos entendem, nos amam, sabem qual é o nosso verdadeiro bem, nos ajudam e esperam por nós. São felizes e nos querem felizes com eles no paraíso.”
Qual é o conceito de santidade que nós temos?
Falar de santidade, em nossos dias, é tratar de uma espécie de heroicidade de pessoas excepcionais. Em nossas igrejas e em nossa vida particular, veneramos santos e santas e, quase sempre, os distanciamos de nossas vidas concretas. Isso nos faz pensar: a santidade não é para mim. Ser santo exige heroísmo, porque o santo e a santa pensam e vivem de modo diferente do mundo. Por isso, muita gente considera que a santidade não é para eles.
A ideia atual de ser santo mudou graças ao documento “Lumen Gentium” do Concílio Vaticano II (Lumen Gentium, 39-42) e devido ao empenho do Papa João Paulo II. Além de todos aqueles que acreditamos estar no Céu, a busca da santidade faz parte da vida de todos nós e é nossa vocação de batizados.
Agora nos perguntamos: em que consiste essa vocação universal a ser santos? E como podemos realizá-la?
No “Sermão da Montanha”, Jesus nos mostra o caminho que nos leva à santidade. O texto das “Bem-aventuranças” (Mt 5,1-12) é, sem dúvida, um dos mais conhecidos dos evangelhos. Jesus sobe numa colina, faz sentar a multidão e começa a falar, mostrando oito caminhos que levam à felicidade. Jesus vem nos ensinar, através das “bem-aventuranças”, quem são os participantes do Reino, ou seja, quem são os santos e santas, aqueles chamados a constituírem o novo povo de Deus.
Tudo isso nos faz compreender que, para ser santo, não é preciso, necessariamente, ser bispo, padre ou religioso: não, todos somos chamados a nos tornar santos! Jesus declara ainda que o Reino está aberto a todos que apresentam atitudes bem-aventuradas, por isso, para ser santo não é necessário possuir dons ou capacidades extraordinárias.
Jesus vem mudar o nosso pensamento a respeito da felicidade e santidade. Pois o que para os nossos olhos humanos pode ser motivo de vergonha, humilhação, pobreza, tristeza e lamentação, para Deus é motivo de verdadeira alegria e felicidade.
Nós humanos agimos sempre em busca de uma recompensa, um reconhecimento ou, simplesmente, buscamos alcançar uma meta, um prazer... E é por saber disso que Jesus nos fala sobre as bem-aventuranças, as recompensas que teremos, não simplesmente na terra, mas no Reino dos Céus, na eternidade.
Podemos perguntar: de que valem as coisas da terra, se não nos ajudam a chegar ao Reino dos Céus, nem nos acompanham até ele? Nem sempre quem consegue ter muitos bens, o conseguiu de maneira justa; e estes bens não lhes trarão felicidade verdadeira e duradoura. Pois são recompensas terrenas, prazeres momentâneos, dinheiro que a traça corrói, ouro que o ladrão rouba, bens que ficam na terra e não trazem amigos verdadeiros.
E quem é considerado por Jesus “bem-aventurado”, feliz? Quem é chamado "filho de Deus”? Quem é que “verá a Deus”? De quem é o “Reino dos Céus”?
As pessoas felizes, os bem-aventurados, os cidadãos do Reino dos Céus são os que têm um espírito humilde, são os “aflitos”, são os “mansos”, são os que têm “fome e sede de Justiça”, são os “puros de coração”, são os “misericordiosos”, são os “que promovem a paz”.
A “bem-aventurança” é uma promessa que já se inicia aqui na terra. A felicidade do Reino começa aqui e agora, entre nós.
Porém, no caminho da santidade não estamos isentos de adversidades, sofrimentos, renúncias, perseguições etc. É disso Jesus também fala: “Felizes os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino do Céu. Felizes vocês, se forem insultados e perseguidos, e se disserem todo tipo de calúnia contra vocês, por causa de mim. Fiquem alegres e contentes, porque será grande para vocês a recompensa no céu. Do mesmo modo perseguiram os profetas que vieram antes de vocês”.
O discípulo de Jesus deve ter consciência das consequências de seu modo de agir: será hostilizado por aqueles que se negam a reconhecer os direitos dos outros, mas se alegrará com a promessa da posse do Reino dos Céus.
O Livro do Apocalipse (1ª leitura) tem por objetivo animar as comunidades perseguidas até a morte pela opressão e repressão dos poderosos do Império Romano. O autor São João mostra que Deus protege do julgamento aqueles que lhe são fieis os salvos. Pelo simbolismo dos números, revela que os que lutam e resistem são muitos e formam uma grande multidão. Esta multidão dos fieis que ninguém pode contar, gente de todas as tribos e nações, povos e línguas, reconhece que a salvação é obra de Deus e do Cordeiro.
Todos estes, devem ficar alegres e contentes, porque a recompensa deles já está guardada para toda eternidade no Reino dos Céus. Eles serão consolados de toda angústia e aflição, possuirão a terra prometida, serão saciados, encontrarão misericórdia, verão a Deus, serão chamados filhos de Deus, e será deles o Reino do Céu.
Que diferença entre as Palavras de Deus e os critérios humanos! Quem é que o nosso mundo considera feliz? Basta a gente ligar a televisão, escutar o rádio, ler jornais e revistas para termos a resposta: felizes são os que possuem mansões requintadas, carrões importados da marca BMW ou Mercedes, roupas de grife e de butiques caras, muito dinheiro e uma gorda conta bancária, quem tem muito prestígio, influência e poder. Ser feliz é o mesmo que possuir muitos bens e comprar tudo do bom e do melhor.
As bem-aventuranças constituem, de fato, o programa de vida do discípulo de Jesus. Se quisermos uma cartilha do cristão, aí está. Se alguém preferir um manual para ser um verdadeiro cristão, é só aplicá-lo.
O Evangelho de hoje é um sério questionamento para todos nós. As bem-aventuranças de Jesus de Nazaré estão numa franca oposição aos critérios do nosso mundo. Será que eu e você seríamos aprovados no vestibular ou no exame das bem-aventuranças? Quem de nós vive a Sua verdade? Tentemos!
Frei Gunther Max Walzer