Homilia - 27/10/2019 - XXX Domingo do Tempo Comum
Todos nós temos um pouco de mania de grandeza, com essa afirmação, muitos não vão concordar. Mas não foi esta a nossa educação, desde pequenos, nos transmitiram a ideia de que o grande, o maior, o mais é o melhor? “Que vença o melhor”! Esta é a lei básica em todas as competições, nos jogos infantis e no esporte. A mesma lei vale no comércio e na economia. O pior é que, facilmente, pensamos, Deus esteja seguindo esse mesmo critério. Penso, no entanto, que os julgamentos de Deus são diferentes, são imparciais.
Na primeira leitura, o Eclesiástico nos diz: “O Senhor é um juiz que não faz discriminação de pessoas. Ele não é parcial em prejuízo do pobre, mas escuta, sim, as súplicas dos oprimidos; jamais despreza a súplica do órfão, nem da viúva, quando desabafa suas mágoas” (Eclo 35,15-19).
Pais e mães que amam entendem a imparcialidade de Deus: todos os filhos são muito queridos, mas se há um filho em perigo, doente, injustiçado, perdido – esse será o centro das atenções. Mais ainda: um pai ou uma mãe espera que os outros filhos se comovam e façam algo pelo irmão. Se não for assim, serão dois os desgostos: um pelo filho que sofre, outro pelo irmão que não se importa.
Muitos justificam sua indiferença diante do sofrimento e de desigualdades fabricando sentimentos de superioridade. Sentem-se o máximo! Só eles são os esforçados, os corretos, os capazes. Os outros, se estão mal, estão como deveriam estar: não merecem nada melhor. Com isso, se acham dispensados de compaixão e solidariedade.
Jesus era muito paciente e acolhedor com os pecadores. Havia, porém, uma espécie de gente que deixava o Mestre muito zangado: era o pessoal que se considerava incluído nos “99 justos que não precisavam de arrependimento”. Era gente que cumpria seus deveres rituais religiosos. Jesus não tinha nada contra isso, ele mesmo era fiel cumpridor das leis religiosa de seu povo. O que Jesus não admitia era que essa gente olhasse o outro de cima, como se fossem juízes de todo mundo, sem um pingo de humildade.
O Evangelho de hoje nos revela algo importante das atitudes de Deus em relação a nós.
No Templo estão dois homens rezando: o fariseu e o publicano. Observem a oração do fariseu: "Ó Deus, eu te agradeço porque não sou como os outros homens, ladrões, desonestos e adúlteros, nem como este cobrador de impostos. Eu jejuo duas vezes por semana e dou o dízimo de tudo o que ganho." E a oração do publicano que, batendo no peito, dizia: "Meu Deus, tem misericórdia de mim, que sou pecador".
Sem dúvida, o fariseu era gente boa, pagava o dízimo, cumpria a Lei, sabia tudo sobre a Lei. Mas, era orgulhoso, arrogante, pretensioso, julgava-se melhor que os outros homens. Este era o único pecado que Jesus abominava tanto que não lhe faltavam chingamentos e repreensões: “fariseus hipócritas... sepulcros caiados, limpos por fora e podres por dentro” (Mt 23,27).
Este outro, o publicano, era pecador mesmo. Cobrador de impostos e mal visto pelas pessoas que ele extorquia. Ele pede perdão pelo seu comportamento que ele reconhecia incorreto.
O fariseu, cheio de si, não saiu justificado do Templo. Quer dizer que sua oração não foi atendida. Apesar de pretender agradecer a Deus, ele já começou mal a sua oração, discriminando e julgando as pessoas. Ele estava convencido de “ser justo”, isto é, de não ter nada que reprovasse seu comportamento.
O que Deus poderia fazer pelo fariseu? Nada!
Este fariseu saiu da igreja do mesmo jeito que entrou. Do mesmo jeito que nós, quando vamos a uma missa, participamos de um retiro, uma adoração, um encontro, uma reunião, um momento de oração em grupo sem termos aberto uma porta (ou pelo menos uma janela) para Deus poder entrar.
O publicano, no entanto, saiu justificado porque reconhecia a sua necessidade de perdão. Manifestava sua confiança no Deus que ouve a súplica do humilde. Jesus afirma que Deus o justificou, dizendo com isso que Deus perdoou o seu pecado.
Infelizmente, atitudes semelhantes às do fariseu ainda encontramos em nosso meio, e, quem sabe, até em nós próprios. Encontramos aquela atitude de uns se acharem melhores que os outros; quando procuramos apresentar uma imagem boa e denegrimos a imagem dos outros; quando achamos estar de bem com Deus enquanto desprezamos os demais; quando oramos pensando só em nós mesmos e nossas necessidades, sem ver as necessidades dos outros também; quando agradecemos pelos dons, mas sem reparti-los e até mesmo quando pedimos perdão a Deus, mas sem nos comprometer a perdoar os outros quando desvinculamos nossa relação com Deus da relação com os irmãos e irmãs. Tudo isso revela nossa grande miopia, que pode chegar a ser uma cegueira. Aí tudo fica distorcido na vida da gente: a imagem de nós mesmos, porque nos vemos perfeitos, enquanto não o somos. Distorcida vemos a imagem dos outros, porque os vemos piores que nós, enquanto somos iguais a eles; e a imagem de Deus, porque o reduzimos a um servo particular para atender só os nossos pedidos.
Na 2ª Carta a Timóteo encontramos também alguém se dando uma nota dez na condução da própria vida. São Paulo diz: “Combati o bom combate, completei a corrida, guardei a fé”. Vejamos a situação em que Paulo se encontrava quando escreve esta carta a Timóteo. Ele está aprisionado, injustiçado, condenado à morte, mas não perde a esperança de que Deus virá salvá-lo. Ele estava certo de que sua vida foi uma luta, um sacrifício constante em favor de Cristo, do Evangelho, do Reino de Deus.
Neste último domingo do Mês das Missões, como nos domingos passados estamos elevando nossas preces a Deus pelos que estão fora de seus países, estados, dioceses e paróquias, anunciando e testemunhando o Evangelho em meio a outros povos e também pelos que são missionários sem saírem do seu lugar, missionários em seu próprio ambiente. Com certeza, Deus reserva a todos nós uma “coroa”, um prêmio pelos nossos esforços na construção de seu Reino.
Frei Gunther Max Walzer