Homilia - 03/05/2020 - IV Domingo da Páscoa
“O Senhor é meu Pastor, nada me falta”. Quem não conhece, quem não reza, que comunidade não canta esse salmo (22)? Ele por inteiro ou alguns dos seus versículos são encontrados por toda parte, nas casas, nos lugares de comércio, em frases coladas em veículos. Como comentava o filósofo H. Bergon, poucos escritos nos dão tanta consolação e conforto como a leitura ou a escrita desse salmo. Ele contém as lutas, os sofrimentos e tristezas, mas também a serenidade e a confiança de todos aqueles e aquelas que colocam sua confiança em Deus e em Jesus Cristo.
Talvez nem sempre conseguimos calcular e interpretar o enorme peso, as grandes angústias e batalhas do nosso cotidiano e de nosso povo, mas este salmo, principalmente nessa época difícil da pandemia do coronavírus, nos proporciona uma força especial e faz de nossas preces e orações uma voz de acolhimento, apoio e esperança.
O Evangelho de hoje nos fala do “Bom Pastor”. As ovelhas conhecem a sua voz. A imagem de pastor e de rebanho de ovelhas, de fato, não faz parte da nossa cultura urbana; mas não é difícil para um cidadão urbano entender o sentido deste texto do Evangelho.
Jesus, o pastor, mantém com as ovelhas um relacionamento muito pessoal e íntimo, conhece uma por uma de todas as ovelhas, e elas conhecem a sua voz e, a seu chamado, elas se levantam e o seguem.
O Evangelho usa também a imagem da porta. Quando chegava a noite, para defender as ovelhas, com mais segurança, os pastores reuniram todas as ovelhas num único redil, um dos pastores ficava de guarda enquanto os demais iam dormir. Na manhã do dia seguinte cada pastor chegava até a porta onde ficava o vigia, chamava suas ovelhas e elas, que conheciam sua voz, e, saindo pela porta, seguiram seus pastores para as pastagens.
Jesus é o Pastor, mas também a Porta de acesso e entre os que chegam, as ovelhas sabem distinguir os que são pastores verdadeiros ou ladroes, assaltantes ou bandidos. As ovelhas não seguem os estranhos (o “ladrão”), porque não conhecem a sua voz. É só a voz do “pastor” que elas conhecem. A esse escutam. Ele chama cada uma pelo nome e as leva para fora. Isso quer dizer que elas têm intimidade com a palavra do seu pastor. Pois é, justamente, a voz que tem um certo timbre, um tom especial, a voz é que dá um calor específico de afeto às palavras. É a voz que cativa, que atrai porque revela a pessoa que fala.
Nesta parábola, o pastor de ovelhas que assume sua missão é caracterizado como aquele que cuida de cada uma como se fosse a única. Dá-lhe carinho e não deixa que ela se disperse do rebanho. Procura mantê-la unida às demais, porque sabe que aí ela está sempre bem protegida e segura.
Por que Jesus fala de pastores e ladrões? A parábola opõe o pastor responsável e cuidadoso àqueles que só querem dominar em proveito próprio, não são confiáveis.
Pastor era também um título dado aos chefes do povo. Ao contrapor a atitude de Jesus, o Bom Pastor, à maneira como os maus pastores agiam com o povo, a parábola faz uma crítica severa a todos os enganadores, corruptos, aproveitadores, identificados aqui com os ladroes e assaltantes; aos que não são do povo, os estranhos. Os maus pastores não cumprem sua missão.
Neste mundo onde vivemos ouvimos muitos apelos e vozes, e recebemos muitas mensagens enganadoras. São muitos que se apresentam como "pastores", que prometem vida, felicidade e prosperidade.
É certo que temos muitos "pretendentes" para serem nossos pastores. Somos pretendidos pelos políticos neste ano eleitoral. Às vezes nos fazem falsas promessas. Os jovens estão pretendidos pelos traficantes de droga, para lhes envenenarem o sangue e lhes encurtarem a vida; somos pretendidos pelos industriários da pornografia, para nos apagarem o sentido da moral e nos tirarem a dignidade de filhos e filhas de Deus.
É fácil cair no engodo dos charlatães. Como conseguir identificar, entre tantas vozes, aquela voz do "verdadeiro pastor"? É preciso apurar os ouvidos!
A figura do Bom Pastor aparece no simbolismo do caminho como um guia do seu rebanho, um condutor que conhece o caminho.
Todos nós, de certa forma, recebemos a missão de ser pastor. Cada um de nós exerce uma liderança na sociedade, como pai e mãe, professor ou professora, funcionário ou funcionária trabalhando no escritório ou comércio, como catequista ou no serviço pastoral... Seja qual for o serviço e a função que temos, é muito importante aprendermos as atitudes de Jesus. É fundamental a atitude carinhosa de conhecer, de chamar pelo nome, de ser capaz de baixar-se para ser porta de passagem e de proteção da vida e bem-estar das ovelhas.
O texto de Jesus Pastor e Porta nos pode servir de uma séria revisão da nossa missão de sermos pastores.
Vivemos, atualmente, numa situação difícil da caminhada de nossa vida. O sofrimento sempre se encontra num contexto de provação para o homem e mulher de fé. E isto pode levar a pessoa a vacilar na fé e, até mesmo, criar ressentimentos contra Deus ou assumir a condição de vítima. Diante do sofrimento que pode colocar em risco a nossa fé, tomemos Jesus como exemplo. Jesus não se resigna diante do sofrimento, mas o aceita na condição de fazer a vontade do Pai.
Nossa vida é uma caminhada, uma viagem, na qual o Pastor conduz o seu rebanho. Este Pastor é Jesus conduzindo seu rebanho, que somos nós. A viagem tem um ponto de chegada: a casa do Pai onde se habitará por toda a vida. Uma viagem que passa por momentos difíceis, por doenças e pandemias, por vales sombrios e ameaças de inimigos, mas que nada disso faz temer e levar ao desânimo, porque o Bom Pastor, que é Jesus, nos conduz por caminhos seguros e sempre está conosco.
Na conclusão do salmo que colocamos no início da nossa reflexão, o salmista descreve a alegria da “ovelha” diante de uma mesa preparada, um verdadeiro banquete, para saciar sua fome. Uma viagem que, como descreve o salmista, tem momentos de turbulência e de insegurança, mas que segue em frente, pois conta com a condução segura e firme do Bom Pastor.
Ele nos diz: “Eu sou a porta. Quem entrar por mim, será salvo; entrará e sairá e encontrará pastagem. Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância”.
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Frei Gunther Max Walzer