Homilia - 18/04/2021 - III Domingo da Páscoa
Em nosso país, atualmente, e no mundo inteiro só se fala em protocolos e decretos de restrições por causa da pandemia provocada pela pandemia. Nossas ruas, praças e praias estão desertas. Medidas extremas tem sido estabelecidas para evitar contágio. Por este motivo, diversas esferas são afetadas: fechamento de escolas, empresas e órgãos públicos, reorganização familiar, e mudanças na rotina de trabalho. Tudo isso potencializa a insegurança, o medo e a angustia quanto às repercussões econômicas e sociais. É a noite da pandemia, e ninguém sabe quando termina.
Recordo-me de um artigo escrito pelo teólogo Marcel Metzger que fez a seguinte pergunta: “A que horas os discípulos de Emaús foram deitar na noite da Páscoa?” É uma boa pergunta, se fizermos uma leitura literal do texto do evangelho... Ao mesmo tempo, encontramos várias incoerências: no tempo bíblico, à noite, não dá para circular, “lockdown“ total... Não há luz. Se todos esses movimentos na noite foram sem luz, como os apóstolos conseguiram ver Jesus subir ao céu em plena noite?
No fundo, o que o evangelista Lucas quer nos fazer compreender através dessa narrativa é que a missão de Jesus não terminou com a cruz. A Páscoa é um novo dia para a Igreja que é um sinal da presença do Ressuscitado através dos seus discípulos, os cristãos de todos os tempos. Esse novo dia, mesmo sendo hoje o terceiro Domingo de Páscoa, não termina; ele continua na Igreja de hoje. É um dia novo que ainda dura... Nós estamos sempre no Domingo de Páscoa!
Depois de Jesus ter aparecido a Maria Madalena e ter dado ordens para que os seus discípulos partissem para a Galileia e depois do incidente do encontro de Jesus Ressuscitado com os dois discípulo na estrada de Emaús, aparece, finalmente, ao grupo reunido para lhes afastar as dúvidas e fortalecer a fé.
Eles estavam meio no ar, ainda não tinham bem compreendido a Ressurreição do Senhor. As dúvidas, as incertezas tomaram conta deles, o medo de se enganar outra vez. Na saudação de paz, ao invés de se alegrarem, eles ficam tomados de “espanto e temor”, imaginando ver um fantasma. Jesus tenta explicar a eles que o que veem é a realidade, convidando-os a tocarem o seu corpo. Mas os discípulos, por causa da alegria, não podiam acreditar.
E agora ouviram aquela pergunta estranha: “Por que estais preocupados, e por que tendes dúvidas em vossos corações?”
“Então Jesus abriu a inteligência dos discípulos para entenderem as Escrituras e lhes disse: ‘Assim está escrito: O Cristo sofrerá e ressuscitará dos mortos ao terceiro dia’.”
Conforme o Evangelho de hoje, o próprio Jesus tinha explicado essas profecias aos discípulos, aparecendo-lhes nos dias depois da Páscoa.
Muitas vezes, na vida, a gente só descobre o sentido profundo das coisas depois que aconteceram. Assim também foi preciso primeiro o Cristo morrer e ressuscitar, antes que os discípulos descobrissem o sentido pleno dos textos do AT que falam do profeta rejeitado, do Servo Sofredor, etc.
Como os apóstolos estavam trancados na sala cheios de dúvida e com medo, assim nós, muitas vezes, nos encontramos na mesma situação.
De fato, também, hoje nossa fé e nossa esperança passam pelas mesmas torturas e pelas mesmas provações. Enquanto clamamos por justiça, a injustiça está celebrando maiores triunfos. Milhões de adultos, jovens e crianças são, diariamente, ceifados pela pandemia e pela fome em todos os continentes. E Deus não intervém, não faz nada?
Em todo mundo, pessoas inocentes são arrancadas de seus lares, presos, torturados e mortos, enquanto ditadores, assassinos, ladrões e policiais bandidos continuam desfilando impunes pelas ruas de nossas cidades. E Deus não intervém, não faz nada?
A esta altura, surgem dentro de nós dúvidas angustiantes: Como é que Deus não mostra o poder de seu braço, pondo as coisas no devido lugar, no lugar certo?
Apesar de ver os discípulos cheios de medo e de dúvidas, Jesus confia neles. Por isso pede que prolonguem a Sua presença no mundo: «Vós sois testemunhas destas coisas».
Cabe a nós continuar caminhando na fé apesar de tudo, e continuar esperando contra toda esperança. Mas que tal nós colaborarmos com Deus para apressar a derrota do pecado e para apressar a vitória do amor, da fraternidade e solidariedade?
Os discípulos não têm de ensinar doutrinas sublimes ou verdades teológicas, mas sim contagiar com a Sua experiência e vivência. Não têm de ensinar grandes teorias sobre Cristo, mas sim irradiar o Seu Espírito. Os discípulos têm de mostrar a sua fé e se tornar credíveis com a sua própria vida, não só com palavras.
“Vós sereis testemunhas de tudo isso”. Depois dessas palavras, os discípulos deixaram aquela sala e anunciaram por toda parte o Cristo Ressuscitado, Nova Vida e Novo Dia.
Saiamos, também, da sala do nosso individualismo e comodismo! Se o Cristo ressuscitou verdadeiramente, por que ter medo, por que se esconder, por que fugir?
Sejamos testemunhas da paz e da alegria do Cristo Ressuscitado. Unidos a Ele, não temos mais razão para nos desesperar e sim, devemos lutar para a construção de um mundo mais humano, mais justo e mais fraterno.
“Vós sereis testemunhas de tudo isso”.
Frei Gunther Max Walzer