Homilia - 20/02/2022 - VII Domingo do Tempo Comum
“Eu não levo desaforo para casa”. De vez em quando a gente ouve esta reação dita com raiva. Nós mesmos, em determinados momentos, sentimos o ímpeto e dizemos palavras ásperas, mesmo que seja apenas “da boca para fora”.
O desejo de vingança pode, porém, criar raízes dentro de nós. Pode nos levar a atitudes de “respostas à altura” da ofensa recebida ou do mal sofrido, das perseguições e ódios. Parece que se criou, em nosso país, uma cultura da justificação da violência e do “acerto de contas” no melhor estilo de “fazer justiça com as próprias mãos”. Vemos isso acontecer numa briga de motoristas por causa de um pequeno acidente de trânsito, entre irmãos que disputam a herança, no mundo do tráfico de drogas, onde quem não paga morre.
Por isso a palavra de Jesus hoje pode soar aos nossos ouvidos como utopia, fora da realidade: “Amai os vossos inimigos e fazei o bem aos que vos odeiam” (Lc 6,27-30).
Jesus quer implantar uma “cultura da paz, da não violência”; será que ele é um visionário alienado? Ou quer acreditar que pode construir uma cultura de paz, da não-violência?
No Evangelho, Jesus nos dá os regulamentos para a vida de uma “humanidade celeste”, bloqueando a fonte da violência. Um princípio fica bem claro: não se vence o mal com as armas do próprio mal.
“Amai os vossos inimigos e fazei o bem aos que vos odeiam, bendizei os que vos amaldiçoam, e rezai por aqueles que vos caluniam. Se alguém te der uma bofetada numa face, oferece também a outra” (Lc 6,27-30).
Para o mundo de hoje parece que Jesus está nos pedindo uma coisa impossível. Vivemos num mundo violento. Tantas diversões das crianças, adolescentes e jovens são violentas nos videogames. Toda hora que ligo a televisão eu vejo sempre alguém matando alguém. De facada, de paulada, de socos ou de balas, será que dá para acatar a ordem do Filho de Deus?
“Amai os vossos inimigos!”
Cristão tem inimigo? Como posso ter inimigos se sou seguidor de Jesus? Sou apenas um cristão de conveniência? Pergunta difícil de responder quando Jesus não nos pede suportar ou conviver com as pessoas, ele nos pede AMAR.
Quantas vezes fomos feridos na face e oferecemos a outra? Que situação difícil de enfrentar! Nossa primeira reação não é oferecer a outra face, mas bater na face do outro, não é verdade?
O que Jesus pede aos seus seguidores é que o amor seja como o amor do Pai: “Sede misericordiosos como o Pai!”. Portanto, deve ser um amor infinito, ilimitado, sem nenhuma reserva, sem restrição. Um amor que vai além dos limites estreitos de uma amizade, de um companheirismo, de um sorriso comercial; um amor que se doe, que se sacrifique e que chegue a amar os próprios adversários, os antipáticos, os que nos prejudicam...
O evangelho não diz que um cristão deve ser passivo, um cristão que não reage a insultos, a difamações e até a maus tratos. Não é isso que o evangelho nos ensina. Devemos viver o amor que nos faz perfeitos como nosso Pai celeste é perfeito. “Tenham misericórdia dos outros, assim como o Pai de vocês tem misericórdia de vocês” (Lc 6,36).
“A mesma medida que vocês usarem para medir os outros Deus usará para medir vocês” (Lc 6,38).
Qual é a nossa medida de amar? Nosso amor pára nos limites sociais? Ou não passa das gentilezas de um comerciante? Estamos construindo uma sociedade de amor? Não limitamos nosso amor às pessoas que nos são simpáticas e aos que combinam com as nossas ideias? “Se vocês amam somente aqueles que os amam, o que é que estão fazendo de mais? Até as pessoas de má fama amam as pessoas que as amam. E, se vocês fazem o bem somente para aqueles que lhes fazem o bem, o que é que estão fazendo de mais?” (Lc 6,32-34).
Não se pode, também, "espiritualizar" o que ouvimos no Evangelho; entendido numa dimensão espiritual apenas. Trata-se de algo muito concreto que nos desafia constantemente e em todos os momentos de nossa existência. Nós vemos, tocamos e sentimos o medo da violência em nossos dias. Hoje, existe muita agressividade e pouco amor. A educação nas famílias, nas escolas precisa deixar de ser competitiva para ser mais fraterna e mais solidária. Nós mesmos precisamos considerar nosso modo de viver para perceber se existem violências que cultivamos dentro de nós, fruto de inveja, competição, raiva... Sejamos misericordiosos como Deus, para que a paz e a serenidade habitem nossas vidas.
Somente amando e perdoando seguimos as pegadas de Jesus!
“Vejam como eles se amam!”
Frei Gunther Max Walzer