Homilia - 13/03/2022 - II Domingo da Quaresma
O evangelista Lucas nos faz caminhar, hoje, com Jesus em direção a Jerusalém, à cidade onde Jesus vai sofrer muito, onde ele vai morrer. Lendo esse trecho do evangelho, lembrei-me das notícias tristes da aproximação das tropas russas da Kiev, capital da Ucrânia, onde vidas humanas são sacrificadas por causa de uma guerra injusta, cruel e e desumana .
Jesus levou com ele Pedro, Tiago e João. Na viagem, Jesus faz uma parada para orar. Foi rezar lá no alto de uma montanha. Os três companheiros, no entanto, vencidos pelo cansaço, logo pegaram no sono.
Em toda a sua vida Jesus dedica muito tempo à oração. E, neste contexto de oração, o rosto de Jesus muda de aspecto. Moisés e Elias apareceram e conversam com ele. Por que esses dois? É que Moisés faz lembrar a saída do povo hebreu da escravidão do Egito e a aliança do povo com Deus no monte Senai. E Elias representa os profetas. O Evangelho os apresenta conversando com Jesus sobre a morte de Jesus, como que para dizer: Por ocasião da morte de Jesus, vai se dar o pleno cumprimento do êxodo, da Lei e do sonho dos profetas.
Para entender bem o que Deus quer nos dizer com este relato da transfiguração de Jesus, temos que ter em mente o seguinte: Jesus indo à Jerusalém, sente que lá ele deverá enfrentar uma briga feia contra ele. Ele mesmo já havia advertido: “O Filho do Homem vai ter que sofrer muito, vai ser rejeitado pelos anciãos e sumos sacerdotes e pelos escribas, vai ser morto e ressuscitará ao terceiro dia” (Lc 9,23). Para os discípulos, que viam em Jesus o Messias, isso era difícil de entender. O Mestre ter que passar pelo sofrimento e a morte? Mas a dura realidade será essa. Pois bem, dentro desse contexto podemos entender o Evangelho de hoje.
E a transfiguração significa o quê?
A transfiguração está querendo dizer o seguinte para Pedro, Tiago e João, e para nós também: Olhem bem! Esse Jesus, que vai ser morto pela maldade humana reserva uma grande surpresa para vocês. Aguardem! Não se escandalizem com o que vai acontecer e o que vão fazer com ele! Aguardem o que vai acontecer com ele depois! Ele é o Filho de Deus, o Escolhido para uma grande tarefa, a tarefa de vencer o pecado e a morte pela morte e ressurreição. Só prestem atenção no que ele diz! Mesmo quando parece estar propondo um caminho difícil, escolhas paradoxais e humanamente absurdas. “Escutai o que Ele diz!”
O que Jesus nos diz hoje?
Jesus nos diz hoje, na Campanha da Fraternidade, que aprendamos a observar três passos na caminhada da vida: “Escutar, discernir e agir!”.
Se em Jesus, a Transfiguração preparava os discípulos para a sua desfiguração na Cruz, hoje, nós temos um movimento inverso: a desfiguração humana, marcada pelo pecado, pela indignidade humana, pela exploração e, pela imoralidade da corrupção.
São Paulo, na Carta aos Filipenses, lamenta esse comportamento (Fl 3,17-4,1): “Já vos disse muitas vezes, e agora o repito, chorando: há muitos por aí que se comportam como inimigos da cruz de Cristo. O fim deles é a perdição, o deus deles é o estômago, a glória deles está no que é vergonhoso e só pensam nas coisas terrenas”.
Nós, não poucas vezes, fechamos os olhos ou desviamos o olhar diante da humanidade desfigurada.
Alguns dados nos devem sensibilizar para apelar para nossa responsabilidade:
Você sabia que o maior problema do saneamento básico, hoje, é a fome?
Você sabia que uma criança morre a cada 2,5 minutos por não ter acesso à água potável, por falta de redes de esgotos e por falta de higiene?
Você sabia que 18% da população brasileira ainda não têm acesso à água tratada. Mais de 100 milhões de brasileiros não possuem coleta de esgotos?
Você sabia que na América Latina, as pessoas têm mais acesso aos celulares do que aos banheiros.
O saneamento básico não é um detalhe na vida. É necessidade imperativa para que nós, filhos de Deus, possamos ter a vida saudável que Deus quer para todos.
Existe outro aspecto que precisa se considerado: aquele dos discípulos que subiram com Jesus no Tabor e contemplaram a sua glória. Eles aceitaram subir o monte. Queriam ficar lá. Pedro disse a Jesus: “Mestre, é bom estarmos aqui. Vamos fazer três tendas: uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias”. Pedro não sabia o que estava dizendo.
Os apóstolos queriam ficar lá em cima, no monte Tabor; mas Jesus mandou descer para a planície, para ver e sentir a realidade da vida. Nós, também, não podemos ficar na piedade de contemplar a glória do Senhor, porque ele está desfigurado em tantos rostos que sofrem ao nosso redor e perto de nós.
A transfiguração foi uma visão, manifestação de Deus ao mundo. Daquela nuvem saiu uma voz que disse: "Este é o meu Filho Amado! Escutai-o!"
Será que temos escutado a voz de Deus? Será que temos escutado Deus que nos fala pelas leituras da missa, pelos acontecimentos do nosso dia a dia? Ah! estamos escutando Deus! Pelo menos temos tentado escutá-lo?
Mas não basta somente escutar, ouvir a voz de Deus que nos chama, nos repreende, nos conforta, nos alegra, nos faz companhia... temos de pôr em prática. É preciso viver a voz de Deus que nos chega de diversos modos, é necessário e indispensável não só escutar como praticar com fé, esperança, muita caridade e misericórdia.
A Campanha da Fraternidade 2022 propõe um olhar mais amoroso para a educação. É um chamado a todos os católicos e às pessoas de boa vontade a colocarem no centro de suas reflexões e ações a questão educacional brasileira.
O tema é “Fraternidade e Educação” e o lema “Fala com sabedoria, ensina com amor” (Pr 31,26). Tanto o tema como o lema da CF-2022 são muito significativos para as famílias e todos os educadores que se dedicam à missão de educar e evangelizar a juventude.
É assim que a CF-2022 convida a refletir sobre a relação entre fraternidade e educação. “Ao longo da caminhada quaresmal, em que a conversão se faz meta primeira, recebemos o convite para buscar os motivos de nossas escolhas em todas as ações e, por certo, naquelas que dizem respeito mais diretamente ao mundo da educação”.
Da nuvem saiu uma voz que dizia: “Este é o meu Filho, o Escolhido. Escutai o que ele diz!”
Frei Gunther Max Walzer