Homilia - 03/04/2022 - V Domingo da Quaresma
Mãos estendidas e gestos fraternos caracterizam pessoas com coração aberto para irmãos e irmãs que sofrem violência e ataques de injustiça e órdio.
Com passeatas à luz de tochas, ou simples caminhadas nas ruas, as manifestações de solidariedade com a Ucrânia e contra a invasão russa se multiplicam em todo o mundo, da Argentina à Geórgia, passando por Canadá e países da Europa.
Por outro lado, triste é ver como, às vezes, as pessoas tratam outras pessoas. Só enxergam defeitos, só criticam, fazem comentários maldosos dos outros. Falam do que não sabem nem viram: nem sabem do que estão falando. Mentem, caluniam, difamam. Todos nós temos a tentação de carregar pedras no bolso para atirar nos outros. Temos o mau costume de acusar os outros para dizer que somos melhores.
Jesus foi duro quando tocou nesse assunto. Já quase no fim da Quaresma continuamos com o tema da conversão. Os textos da liturgia deste domingo nos convidam mais uma vez a repensarmos as nossas ações e atitudes. No Evangelho de hoje, o episódio da adultera, nos faz repensar as nossas atitudes e julgamentos.
O Evangelho nos conta hoje, que uma mulher é pega em flagrante no adultério. Certamente, foram alguns membros da “Polícia dos Bons Costumes” que arrastaram essa mulher pecadora até Jesus e perguntaram: “Mestre, esta mulher foi apanhada no ato de adultério. De acordo com a Lei que Moisés nos deu, as mulheres adúlteras devem ser apedrejadas. Mas o senhor, o que é que diz sobre isso?”.
Jesus não respondeu. Começou a rabiscar no chão. O que escreveu ele? Nada! Fez como nós fazemos, quando alguém nos faz uma pergunta boba ou maliciosa: ficamos olhando de um lado para o outro, mexemos com a caneta nos dedos. Procuramos ganhar tempo para controlar os nervos.
E Jesus consegue sair-se bem, sem condenar nem desculpar a atitude da mulher, diz: “Quem de vocês estiver sem pecado, que seja o primeiro a atirar uma pedra nesta mulher!”.
E, de novo, continuou a escrever no chão. Não sabemos o que escreveu. Segundo uma tradição, Jesus escrevia os pecados de cada um deles. E então aqueles "cumpridores" da lei, envergonhados, abaixaram os olhos e foram saindo um a um, começando pelos mais velhos. Só ficaram no pátio do templo a mulher, os discípulos e ele, Jesus. Então Jesus perguntou: “Mulher, onde estão eles? Não ficou ninguém para condenar você?...
- Pois eu também não condeno você. Vá e não peque mais!”.
Agora o pessoal já não se sentia mais muito bem: tinham sido desmascarados, apareceu sua hipocrisia. Abaixaram os olhos e foram embora. E Jesus ficou sozinho com a mulher – diz o Evangelho.
Jesus reconhece que a mulher, de fato, havia cometido um pecado. E chama atenção dela: “Não peque mais!” Mas a maneira como ele trata a mulher era diferente: ele tinha misericórdia. Ele acredita na possibilidade de aquela mulher mudar de vida.
Ouvindo o Evangelho de hoje, todos nós devemos ter a coragem de reconhecer o nosso pecado e realizar nossa conversão de não pecar mais. Esse relato foi escrito para abrir-nos os olhos sobre a realidade da nossa fraqueza “cair na tentação”, para nos convidar a ter misericórdia e perdoar as quedas de nossos irmãos. O desafio do Evangelho de hoje é perdoar o irmão que teve a infelicidade de pecar e nãos jogar pedras nele. Jesus contesta a nossa convicção de sermos pessoas íntegras e nossas tentativas patéticas de encobrirmos os nossos pecados. E Jesus contesta, sobretudo, a nossa mania de pegar em pedras para atirá-las nos outros que cometeram erros e pecados talvez menos graves do que os nossos.
Inventamos o décimo primeiro mandamento de “não se deixar apanhar em flagrante” e continuamos impiedosamente apedrejando os irmãos que caíram. Somos cruéis executores dos infratores menos espertos do que nós. Mas uma coisa é certa: a nossa esperteza não nos salvará.
Por isso, quando vemos prostitutas ou travestis ou drogados, deixemos de bancar os moralistas hipócritas, e vamos devagar com as pedras!
Vamos devagar com as pedras, mesmo porque a sociedade inteira carrega sua parte de culpa pelas coisas erradas que acontecem em nossas cidades e nosso país.
O que Deus está querendo não é acabar com o pecador, mas acabar com o pecado e, por isso, temos que dar mais espaço ao perdão e ao amor; para que o pecado seja destruído, mas o pecador se converta e chegue a ter vida nova.
É um contrassenso querermos ser juízes uns dos outros.
Neste momento, sentimos Jesus falando baixinho e com muita ternura ao nosso coração: “Eu estou aqui, e dou a você o meu perdão. Pois eu vim salvar o que estava perdido. E você, vá e perdoe também a seus irmãos, não viva de pedra na mão como se tivesse o direito de julgar os outros”.
É, pois, com essa intenção que a Campanha da Fraternidade de 2022 nos convida a refletir sobre a indispensável relação entre fraternidade e educação.
Ao longo da caminhada quaresmal, em que a conversão se faz meta primeira, recebemos o convite para buscar o perdão em todas as ações. O mundo de nosso tempo precisa encontrar caminhos do perdão e do amor para se reconstruir. O “Julgar” voltará o olhar para o discernimento e o perdão. Recordemos o lema da CF 2022: “Fala com sabedoria, ensina com amor” (Cf Pr 31,26).
Caminhemos para a Páscoa com este propósito. À luz da Palavra Santa possamos crescer na misericórdia, na humildade e no acolhimento dos irmãos.
Frei Gunther Max Walzer