Homilia - 26/06/2022 - XIII Domingo do Tempo Comum
Acompanhando o noticiário desta semana, fala-se das festas juninas e, ao mesmo tempo, encontramos informações sobre as consequências desoladoras das chuvas que assolam diversas cidades do nosso país e regiões do mundo. A guerra na Ucrânia parece não ter fim e a destruição das cidades causa impacto como se as festas e os fatos que causam dor e sofrimento fossem a mesma coisa.
Diante destas realidades, vale a pena nos perguntar onde está o sentido escondido da vida? O que significa amar, ser solidário? Qual é mesmo o sentido do seguimento de Jesus Cristo?
No Evangelho, vemos Jesus tomando a firme decisão de partir para Jerusalém (Lc 9,51), mesmo sabendo do conflito que o espera em Jerusalém. Ele sabia que lá está o centro do poder político e da religião constituída de seu tempo... não se intimidava: decidiu e partiu.
Nesta viagem para Jerusalém acontecem alguns episódios importantes. Os mensageiros que vão à sua frente encontram portas fechadas no povoado de samaritanos. Eles se revoltam e Jesus os repreende porque revolta e ira não combinam com a liberdade e a decisão de quem ama sua missão.
A reação precipitada de Tiago e João mostra o que não se deve fazer. O discípulo de Jesus não é chamado para lutar contra ninguém, portanto, não queremos desencadear guerras santas, cruzadas contra os infiéis, acender fogueiras, mas fomos convidados a seguir o Mestre. O tempo da agressividade e do fanatismo já era.
Penso que haja ainda muitas pessoas em nossas comunidades convencidas de que com a mansidão não se consegue nada e então agridem os malvados. Não é assim que se devem comportar os cristãos.
Os cristãos não podem reagir com vinganças, com palavras duras, mas unicamente com amor. Se alguém nos agride usando a mentira, a trapaça, a calúnia, a violência, procuremos responder invocando sobre ele as bênçãos de Deus.
Por causa dessa atitude fogosa os irmãos Tiago e João receberam de Jesus o apelido pouco simpático de “filhos do trovão” (Mc 3,17).
Em nossas comunidades, talvez, haja ainda muitos “filhos do trovão”. Devemos ser modelos de respeito e de tolerância em relação aos que têm ideias diferentes. Não devemos obrigar ninguém a aceitar o Evangelho. Apenas devemos anunciar a mensagem de Cristo, mas depois deixemos livres as pessoas para aceitar ou recusar esta mensagem. Respeitemos as escolhas diferentes que tiverem feitas.
Depois deste primeiro incidente, a viagem para Jerusalém continua e enquanto caminha é abordado por três pessoas. Quando a primeira se apresenta para seguir Jesus, Ele responde: “O Filho do homem não tem onde repousar a cabeça”(9,58).
A resposta de Jesus é para desanimar o aspirante a discípulo. Quem quer segui-lo – afirma Jesus – não deve sonhar com uma vida folgada: será como um viajante que não tem morada fixa. Deverá estar disposto a passar a noite na rua ou então se contentar com acomodações pobres e improvisadas.
Não ter onde morar é uma realidade trágica para muitas pessoas da nossa sociedade, que considera vagabundos os que não têm moradia. São crianças de rua, mendigos, despejados ou desempregados.
Não consigo nem imaginar uma situação dessas, já que eu nunca tive essa experiência e, acredito, ninguém de vocês também não. Penso que ninguém escolhe essa vida por querer, a não ser uma pessoa que tenha problemas de ordem mental.
Jesus, porém, escolheu. E não era um louco, nem um homem qualquer. Ao dizer que “o Filho do Homem não tem onde repousar a cabeça”, Jesus queria ressaltar o fato da sua pobreza material. Quem, pois, quisesse ir com ele por todos os lugares, deve também estar disposto a enfrentar desconforto. Seguir Jesus não se pode confundir com um piquenique alegre de fim de semana. Seguir Jesus é correr riscos!
Nesta viagem para Jerusalém, Jesus encontra mais um desconhecido e convida a segui-lo. Ele está até disposto, mas quer primeiro enterrar seus pais.
Ao encontrar nesta segunda pessoa o apego à sua família, ele coloca a urgência do anúncio do Reino de Deus como centro da vida. Nada pode justificar a mediocridade de quem se apega aos próprios mortos, pois a urgência do anúncio do Reino de Deus é a vida acontecendo e se irradiando. Seguir Jesus é anunciar o Reino!
Finalmente, uma terceira pessoa se aproxima e se candidata, mas não quer partir logo... pede tempo. Jesus diante desta terceira pessoa responde com a liberdade e a firme decisão que o motiva: “Quem põe a mão no arado e olha para trás não está apto para o Reino de Deus”. Uma palavra forte que convida acomodados a se desinstalarem e desafia inseguros a tomar uma decisão. Seguir Jesus é decidir-se pelo Reino e não voltar atrás!
Estes encontros de Jesus ao longo do caminho são exemplos de nossos encontros hoje. Ser discípulos de um mestre assim, implica a coragem de assumir de forma madura a liberdade para a qual Cristo nos libertou e não nos deixar amarrar de novo pelo jugo da escravidão.
O Reino apresenta-se, na vida das pessoas, como uma proposta a ser livremente acolhida ou rejeitada. Jamais poderá haver coerção, sob pena de invalidar a opção que ele fez.
É tentador querer levar as pessoas a acolherem o Reino, independentemente de sua liberdade. Ou seja, impô-lo à força! Sem liberdade plena, o Reino não chegará a fincar raízes consistentes no coração humano, a ponto de transformá-lo em coração de discípulo.
A tentação de forçar as pessoas a abraçar o Reino pode levar o discípulo a recorrer à violência, caso elas o rejeitem. Foi o que aconteceu com os discípulos de Jesus em relação aos samaritanos. Porque se recusaram a acolher Jesus, de passagem para Jerusalém, Tiago e João sugeriram ao Mestre que mandasse fogo do céu para consumi-los, a exemplo do que aconteceu, no passado, com as cidades impenitentes.
Jesus censurou os dois discípulos, pois tinham uma mentalidade contrária à sua. Eles pensavam que, com a destruição dos samaritanos, pudessem dar uma lição a todos os demais impenitentes. Enganavam-se! Esse castigo mortal daria a entender que o Deus anunciado por Jesus era impaciente e incapaz de respeitar o ritmo das pessoas. Na verdade, ele é um Deus paciente e misericordioso, pronto a esperar o momento de ser livremente acolhido.
Que esta Eucaristia seja lugar de encontro, chamado e resposta a Jesus. Uma resposta livre, radical e libertadora que reacenda em nossas comunidades de fé o impulso profético que nos revela como filhos e filhas da luz em meio às trevas que nos rodeiam. Jesus Cristo, pela força de sua Palavra e do Pão Eucarístico, nos ajude e nos ensine a nos levantar e caminhar... a segui-lo, anunciar o Reino de Deus e olhar sempre para frente onde a terra precisa ser arada e cultivada para que a vida floresça.
O “segue-me” de Jesus é dirigido hoje a cada um de nós.
Frei Gunther Max Walzer