Homilia - 17/07/2022 - XVI Domingo do Tempo Comum
Sempre mais encontramos em nossa sociedade pessoas angustiadas e “estressadas”. Muitas pessoas, há meses, estão em busca de um emprego e não encontram nada. Outras pessoas, ao contrario, porque nunca estão satisfeitas com o que têm e se deixam levar por uma preocupação doentia de consumismo e de acúmulo de bens materiais.
Há, também, pessoas que se dedicam, de tal forma, ao trabalho, com um espírito exagerado de competitividade e de perfeccionismo, que não encontram mais tempo para a esposa, os filhos, os amigos, nem mesmo para si mesmas, até que um dia “estouram” e caem no esgotamento ou na depressão. Em muitas pessoas, falta tempo também para Deus ou a Ele recorrem só em algum momento de aflição ou de emoção intensa, mas muito raramente prestam atenção à sua presença e à sua voz.
Assim, observamos pessoas que se deixam absorver de tal forma por suas tarefas profissionais que nem enxergam mais o que se passa ao lado. É claro que todos nós temos deveres a cumprir, e devemos cumpri-los bem. Mas nem sempre temos que ser apenas eficientes; “há um tempo para tudo debaixo do céu” – diz a Bíblia. Há tempo de trabalhar, há tempo de conversar, há tempo de ouvir, de fantasiar, tempo de só contemplar e deixar o coração passear pelas coisas, paisagens, pessoas.
Não somos máquinas produtivas, somos seres animados pelos afetos, pelo gosto gratuito de brincar, de receber amigos, de cantar, ouvir música... tudo aparentemente inútil, mas humanamente indispensável.
O evangelho de hoje, se mal interpretado, como já foi, pode até escandalizar. Será que Jesus elogia a preguiça e desvaloriza o trabalho?
O Evangelho de hoje nos leva a fazer uma reflexão sobre o uso do nosso tempo e algumas coisas me chamaram atenção.
Em meio à rejeição dos religiosos judeus, Jesus encontra um lugar de descanso na casa de Lázaro, Marta e Maria. Os três irmãos moram no povoado de Betânia, a poucos quilômetros de Jerusalém, e é ali que Jesus costuma repousar em suas viagens.
As duas irmãs acolhem Jesus. Maria não se preocupa com o serviço da casa. Senta-se aos pés de Jesus e Marta repreende Maria. Jesus a defende. Para ele basta pouca coisa. Marta passa a imagem daquela mulher trabalhadora, dona de casa, que tem prazer em receber as visitas e acolhê-las, desmanchando-se em cortesias. Ela é a típica mãezona, aquelas donas de casa das nossas cidades do interior. As casas dessas senhoras são impecáveis em matéria de limpeza e organização. A comida deliciosa, feita na hora e servida até a visita dizer que não aguenta mais comer. Só quem visita uma casa que tem uma “Marta” sabe o que é ser bem acolhido.
A alegria de mulheres assim é ver que a sua ilustre visita se sente bem em sua casa. Esse é o maior prazer que ela pode sentir.
Mas esta atitude não basta para Jesus. Acabamos de ouvir como no Evangelho, quando Marta pede que Jesus mande sua irmã Maria ajudá-la. É bem provável que Jesus tenha dado aquele sorriso acolhedor para Marta, e as suas palavras devem ter sido bem mais amenas do que as escritas por Lucas. Jesus deve ter dito, com um sorriso: “Ô Marta, por que te preocupas tanto? Isso que você está fazendo é importante, mas vocês podem deixar para fazer noutra hora. Maria escolheu a melhor parte! Não a recrimine. Mais tarde ela vai lhe ajudar. Por enquanto, sente-se aqui conosco”. E Marta deve ter percebido que, de fato, estava deixando passar uma oportunidade rara de
receber os ensinamentos do mestre Jesus, e deve ter se sentado para ouvi-lo.
Marta se deixou levar pelo trabalho sem perceber que perdeu o foco em Jesus e na sua Palavra. O Senhor a repreende: “Marta! Marta! Você está preocupada e inquieta com muitas coisas; todavia apenas uma é necessária. Maria escolheu a boa parte, e esta não lhe será tirada” (Lc 10:41-42). O trabalho de Marta faz com que ela deixe de se ocupar com Cristo e sua Palavra. Reparemos que Jesus não está fazendo comparações e dizendo a Marta que seu serviço não é importante, mas apenas está dizendo que ela perdeu o foco. Quando estamos muito ocupados com o trabalho acabamos perdendo de vista o cultivo da vida espiritual.
Tenho aprendido com a vida que muita gente boa se perdeu no processo de crescimento espiritual, emocional e profissional simplesmente porque não estabeleceu prioridades.
Prioridades são importantes porque sempre vai aparecer algo para fazer. Nessa sociedade extremamente ocupada na qual vivemos, é praticamente uma “gafe” dizer que você possui um tempo livre. Nós somos instados a preencher até os horários do descanso! Por isso, não nos iludamos: sempre vai ter algo para você fazer. A era da informação, esse momento tecnológico que vivemos faz com que sejamos achados até quando “nos escondemos”. Estamos tão ocupados e com coisas que não trazem sentido, realização.
Não nos deixemos absorver por preocupações que, por vezes, não merecem nossa atenção, nem tampouco boa parte do nosso tempo. Nem se deixe levar “pela toada” social que apregoa a frenetização da vida.
Estabeleça prioridades, antes que apareça algo para fazer e roube o que há de melhor (v.40,42).
Se é verdade que precisamos de prioridades, mais ainda é a necessidade de termos o nosso tempo com Jesus como a prioridade maior. Estar com Jesus é a melhor parte. Ouvir as Palavras de Jesus é o que interessa, pois elas permanecerão (Is.55). A boa parte, a melhor parte não será tirada. Por isso, um espaço de tempos no Dia do Senhor (domingo) deveria ser inegociável.
Existe uma ordem na vida do cristão. Primeiro ele deve sentar-se aos pés de Jesus para aprender dele, lendo e meditando em sua Palavra. É assim também que você aprende qual é a vontade de Deus para a sua vida. Então as tarefas que Deus colocar em suas mãos para cumprir virão naturalmente. Quando aprendemos dele ficamos prontos “para fazermos boas obras, as quais Deus preparou de antemão para que nós as praticássemos” (Ef 2:10).
Frei Gunther Max Walzer