Homilia - 28/07/2024 - XVII Domingo do Tempo Comum
O Santo Padre Francisco decidiu estabelecer em toda a Igreja a celebração do Dia Mundial dos Avós e dos Idosos, que se realizará no quarto domingo de julho, próximo à memória litúrgica dos Santos Joaquim e Ana, avós de Jesus.
O Cardeal Farrell, Prefeito do Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, salienta que: ”Este é o primeiro fruto do Ano da Família Amoris Laetitia, um dom a toda a Igreja que se vai manter ao longo dos anos. A pastoral dos idosos é uma prioridade inadiável para todas as comunidades cristãs. Na encíclica Fratelli tutti, o Santo Padre nos lembra que ninguém é salvo sozinho. Nesta perspectiva, é necessário valorizar a riqueza espiritual e humana que foi passada de geração em geração”.
Lendo o texto do Evangelho de hoje, podemos afirmar, que, sem dúvida, um dos maiores flagelos da humanidade é a fome. A televisão mostra, diariamente, imagens horripilantes de multidões famintas, dentro e fora do país; mas, mesmo assim, é muito vaga a ideia que fazemos do problema.
De tempos em tempos, os chamados G8 e os denominados países do BRICS, que congregam os principais países do mundo se reúnem. Nestes encontros são apresentadas muitas estatísticas. Mesmo que as estatísticas não ajudem muito, hoje, se diz que perto de 805 milhões de pessoas passam fome no mundo. Destes, dois milhões são crianças que sentem no crescimento e na estrutura mental os efeitos da fome. Número semelhante de crianças morre de fome a cada ano, de modo particular no terceiro mundo. Existem países, onde a fome mata mais que doenças, pestes ou alguma outra epidemia.
Nosso Brasil não foge à regra. Estatísticas falam de 7,5 milhões de brasileiros passando fome. Aqui nos deparamos com fatos que tem tudo para nos revoltar. Podemos tirar a fome deste povo com a ajuda direta, isto é, fazendo coletas e dando pão e comida para essa gente. Tem também uma ajuda indireta, aquela que deveria chegar graças à arrecadação dos impostos.
Todos pagamos impostos, mas no meio do caminho aparecem os corruptos e roubam aquilo que deveria ser dado aos pobres. Este é o grande pecado dos corruptos: roubam o alimentam dos pobres para ficarem mais ricos do que já são. Imagine, além disso, quantas pessoas passam fome, hoje, no Brasil por causa da irresponsabilidade administrativa de interesses políticos, de interesses eleitoreiros, de interesses empresariais. Muitos querem ganhar com a fome do pobre e, parece, que isso cada vez menos toca a consciência de quem poderia ajudar a saciar a fome de milhões de brasileiros.
O espanto dos apóstolos é o mesmo que sentimos ao nos deparar com o número de pessoas que deveriam ser alimentadas naquele dia da multiplicação dos pães. Com razão reclamaram com Jesus: “o que são cinco pães para tanta gente”.
Uma coisa me custa a entender: Olhando o alto progresso técnico-científico, que permite ao ser humano dominar, por exemplo, as técnicas de preparação do solo, seleção de sementes e mudas, previsão das condições climáticas etc., por quê com todo esse progresso não conseguimos conter o avanço da fome da humanidade? Será que os alimentos produzidos, juntando as toneladas de sobras de comida de restaurantes não são suficientes para suprir a alimentação da população do Planeta?
Falando em sobras: Quando todos ficaram satisfeitos,
Jesus disse aos discípulos: Recolhei os pedaços que sobraram,
para que nada se perca!’ Recolheram os pedaços e encheram doze cestos com as sobras dos cinco pães, deixadas pelos que haviam comido” (Jo 6,12-13).
O desperdício mais escandaloso acontece no setor da alimentação. Uma pesquisa do Ministério de Agricultura dos Estados Unidos revela que um quarto dos produtos alimentícios acaba cada dia no lixo, isso sem falar do que se destrói deliberadamente antes que chegue ao mercado.
Afinal, qual é a raiz do problema da fome? Os textos das leituras de hoje nos podem dar uma resposta.
A primeira leitura situa-se num período prolongado de seca e fome. Nessas circunstâncias, o profeta Eliseu recebeu um presente providencial: Um homem, vindo de longe, trouxe “vinte pães de cevada e trigo novo”. O “homem de Deus”, como chamavam o profeta Eliseu, poderia ter pensado apenas em si mesmo. Levado pelo egoísmo, podia ter simplesmente devorado os pães, pois ele mesmo estava, também, com bastante fome. Mas o profeta não agiu assim. Mandou distribuir o pão para todo o pessoal. E o resultado, qual foi? “Todos comeram e ainda sobrou pão”. Este foi o milagre da partilha.
O Evangelho repete a cena da primeira leitura. No meio da multidão está um rapaz que tem cinco pães de cevada e dois peixes. Se o rapaz fosse egoísta, podia ter pensado assim: “Bem, vou comer o que tenho. Assim, pelo menos, eu não vou passar fome”. Mas ao contrário, o rapaz colocou seu pouco à disposição de todos. E o milagre aconteceu. Todos comeram “quanto queriam” e ainda sobraram doze cestos dos cinco pães. Milagre da partilha!
Embora nós sempre nos refiramos neste texto do Evangelho ao milagre da “multiplicação dos pães”, em nenhum dos quatro relatos usa-se o verbo “multiplicar”! Usam-se outras palavras nos quatro evangelhos: “pegar”, “distribuir”, “partilhar”!
O milagre, pois, não acontece através da multiplicação dos pães, mas acontece pela partilha.
Ao multiplicar os pães, Jesus não dá uma esmola: Jesus ajuda o rapaz a repartir o que ele tem. O que Jesus nos ensina no Evangelho de hoje não é como dar esmola, mas como repartir o que temos. No fundo, o dinheiro e as coisas materiais devem servir para criar mais fraternidade. As coisas, no entanto, podem nos distanciar um do outro, criando inveja, desentendimento. Não é de estranhar que a inveja da classe miserável provoque revolta e violência contra a classe dos que tem e não querem repartir.
Jesus, antes de explicar o mistério da Eucaristia, preocupou-se com o pão do corpo dos seus ouvintes. Por isso, não se pode separar, no homem, a dimensão religiosa da material; não é possível prover suas necessidades espirituais e eternas, sem preocupar-se, ao mesmo tempo, por suas necessidades terrenas e materiais. Depois que todos ficaram saciados, Jesus pôde dizer: “Não procurem apenas o pão material; busquem, também, o pão da vida eterna, que é o meu corpo”.
Este vínculo entre o pão material e o espiritual era visível na forma em que se celebrava a Eucaristia nos primeiros tempos da Igreja. A Ceia do Senhor, chamada então de ágape, acontecia dentro de uma refeição fraterna, na qual se compartilhava tanto o pão comum como o eucarístico.
Irmãos, aprendamos a lição do Evangelho de hoje, a de partilhar o pão. Aliás, não há segredo nenhum. Basta ter muito amor dentro do peito. Sim, Jesus entra no mundo pela porta da cozinha, através de um pedaço de pão dado com amor. O cristianismo não é apenas revelação de mistérios da fé, não é uma doutrina, não é uma corrente filosófica. Cristianismo é amor e vida. Não há amor e vida onde estiver faltando pão.
Se a Igreja for capaz de fazer com que os pobres se sentem ao redor de nossa mesa e quando repartirmos com eles o pão do amor – então a nossa Igreja será uma Igreja acreditada. Enquanto a Igreja não passar pelo teste do pão, muitos não acreditam nela.
Mas, lembre-se: IGREJA SOMOS NÓS, IGREJA SOU EU, IGREJA É VOCÊ!