Homilia - 31/07/2016 - XVIII Domingo do Tempo Comum
Vivemos preocupados com a segurança. E é para se preocupar mesmo com tantos atentados terroristas no mundo inteiro, tantos assaltos e tanta violência nas cidades do nosso país. O esquema de segurança para os Jogos Olímpicos de 2016 será o maior da história do país, com 85 mil profissionais.
Até em nossa cidade, vivemos preocupados com a nossa segurança. Mas esta preocupação, facilmente, pode se tornar uma obsessão. Quem ganha muito com isso é a indústria de trancas, cercas elétricas, alarmes e cadeados. E todos nós sabemos que não existe segurança perfeita e total. Nem é preciso aparecer um ladrão para roubar o que é nosso: um fracasso nos negócios, desemprego, doença... e lá se vai toda a nossa economia.
Até nas relações afetivas, as pessoas procuram segurança: são os amigos sempre desconfiados, os namorados, as noivas, as esposas que ficam fiscalizando o parceiro ou a parceira, querendo saber aonde foram, com quem estavam... Penso, no entanto, o afeto e o amor verdadeiro não precisam ser vigiados. . E, se não é de confiança e se precisa ser vigiado, provavelmente nem vale a pena continuar com esse relacionamento.
Aí surge a pergunta: que tipo de conquistas na vida serão mesmo seguras e valerão a pena?
Muitas pessoas colocam sua preocupação principal nas riquezas. As leituras de hoje alertam que a importância da vida humana está em outros valores. De que adianta ser uma das pessoas mais ricas do mundo, se ninguém leva nada para o túmulo? Qual é o lucro de um político que acumula bens a custa de roubo e corrupção? Que vantagem tem um banqueiro que lucra com a exploração de semelhantes?
As leituras de hoje começam com o Eclesiastes, da literatura chamada “sapiencial” da Bíblia. A literatura sapiencial trata de que? Ela observa a vida e faz deduções sobre o melhor jeito de viver, até nos assuntos corriqueiros do dia a dia.
A primeira frase do texto de hoje costuma ser traduzida como vaidade das vaidades, tudo é vaidade. Vaidade aí talvez não seja a melhor palavra; o autor quer falar de “coisas vazias, que não levam a nada, que parecem valer alguma coisa, mas são decepcionantes”. Começa falando no tanto que as pessoas gastam suas forças trabalhando para depois nem aproveitarem todos os frutos. Ele quer dizer que certa ânsia de acumular bens, mesmo honestamente, pode não dar uma satisfação correspondente ao esforço despendido.
Vemos gente que dorme mal porque se preocupa com a proteção dos bens que tem em excesso. Vale a pena viver assim? Ou será, como diz o Eclesiastes, “vaidade das vaidades”?
“Buscai as coisas do alto” diz a carta aos Colossenses, nossa segunda leitura. Paulo está recomendando outro tipo de riqueza: aquela que os ladrões não podem roubar, que não ocupa espaço na mala, que vai sempre conosco porque faz parte de nós. O valor dessa riqueza está no fato de que ela nos constrói como pessoas.
Muitas vezes, na Bíblia, vemos os termos “terrestre” ou “as coisas do mundo” em oposição aos valores do Reino de Deus. Será que tudo que é da terra é ruim? Aqui mesmo na segunda leitura, Paulo usa assim a palavra “terrestre”. Logo a seguir, porém, ele explica o que entende por coisas terrenas: devassidão, impureza, maus desejos, cobiça... Ele está se referindo àquilo que justamente estraga a vida que Deus quer que a gente viva neste mundo. No sentido empregado por Paulo, deixar as coisas terrenas não é fugir do mundo e ficar rezando na igreja: é abandonar o que nos puxa para o mal.
O Evangelho tem um recado claro. É inútil ajuntar tesouros para si mesmo e não ser rico para Deus. Começa por uma briga de irmãos, sobre a partilha da herança. Brigas de herança são, por sinal, muito comuns em todos os lugares. Jesus se nega a resolver o problema da herança dos dois irmãos. Mas aproveita para dizer que a vida não é assegurada pelos bens. Quantos conflitos seriam evitados se, em casos semelhantes, as pessoas tomassem consciência que o valor da vida humana é outro. O que faz a diferença, para a pessoa, não é a casa, nem o terreno, nem o carro, nem a conta bancária. Nada disso.
Então Jesus conta uma parábola. E poderia concluir que qualquer semelhança não é mera coincidência. Um homem já muito rico, ao fazer uma grande colheita, preocupa-se com a grande sobra, e planeja lucrar ainda mais, para poder descansar, comer, beber e regalar-se. Ora, quantas outras possibilidades ele teria para aplicar os seus ganhos. A época de Jesus, por certo, não era diferente da nossa, e os próprios operários daquele ricaço continuavam na carência. Famintos e miseráveis multiplicavam-se à volta de Jesus. Em quem o rico pensa? Só em si mesmo, infelizmente.
Então vem a surpresa. Na verdade, é a única certeza que o ser humano carrega consigo. Nessa mesma noite, que pode ser uma noite qualquer, Deus chama você de volta. E os bens que você acumulou, para quem ficarão?
O povo diz: “Da vida não se leva nada”. Não se leva nada mesmo que se possa guardar no cofre do banco, mas se leva exatamente a vida que foi vivida e o que nela foi construído. Também é isso que fica de lembrança naqueles que amamos e naqueles que admiram qualquer coisa que tenhamos realizado, qualquer qualidade que tenhamos desenvolvido.
O Evangelho de hoje é um convite a buscar nesta vida as coisas que verdadeiramente contam e podem ser um tesouro que conta para Deus. Sua lista é muito grande, e cada um de nós pode escolher segundo a sua vocação. São valores verdadeiros e duradouros: a prática da justiça e da caridade, o amor ao próximo e até ao inimigo ou ao estranho, a prática da solidariedade e da paz, a promoção humana e a educação, o atendimento dos doentes e idosos... São valores passageiros e enganosos o acúmulo de bens materiais, o consumismo, o hedonismo, o egoísmo, o exibicionismo, o lucro desonesto e a corrupção...
Desde terça-feira, milhares de jovens encontram-se em Cracóvia participando da Jornada Mundial da Juventude. “Bem-aventurados os misericordiosos pois alcançarão misericórdia” é o tema desta Jornada Mundial da Juventude neste ano de 2016. O Papa Francisco está
na Jornada Mundial da Juventude desde quarta feira, partilhando com os jovens a vida e a fé do Jubileu da Misericórdia.
Em sua primeira mensagem dirigida aos jovens, o Papa Francisco deixou um apelo:
É duro, e ao mesmo tempo interpela-nos, ver jovens que deixam a vida à procura da «vertigem», ou daquela sensação de se sentir vivos por vias obscuras que depois acabam por «pagar»… e pagar caro. Dá o que pensar quando vemos jovens que perdem os anos belos da sua vida e as suas energias correndo atrás de vendedores de falsas ilusões (na minha terra natal, diríamos «vendedores de fumaça») que vos roubam o melhor de vós mesmos.
Por isso, queridos amigos, estamos aqui reunidos para nos ajudarmos uns aos outros, porque não queremos deixar que nos roubem o melhor de nós mesmos, não queremos permitir que nos roubem as energias, a alegria, os sonhos com falsas ilusões.
Queridos amigos, pergunto-vos: Para a vossa vida quereis aquela «vertigem» alienante, ou quereis sentir a força que vos faça sentir vivos, plenificados? Vertigem alienante ou força da graça? Para ser plenificados, para ter uma força renovada, há uma resposta: não é uma coisa, não é um objeto; é uma pessoa e está viva, chama-se Jesus Cristo.
Jesus Cristo é aquele que sabe dar verdadeira paixão à vida, Jesus Cristo é aquele que nos leva a não nos contentarmos com pouco e a dar o melhor de nós mesmos; é Jesus Cristo que nos interpela, convida e ajuda a erguer-nos sempre que nos damos por vencidos. É Jesus Cristo que nos impele a levantar o olhar e sonhar com as coisas do alto.
Frei Gunther Max Walzer