Homilia - 09/10/2016 - 28º Domingo do Tempo Comum
Desde pequenos aprendemos a dizer “obrigado”, aprendemos a agradecer às pessoas que nos fazem o bem. É falta de educação ganhar um presente, receber um favor ou ser ajudado por alguém, e não dizer um “muito obrigado”.
"Obrigado" é uma palavra tão simples, mas tão esquecida por muitos. Vivemos num mundo em que a vida humana ficou transformada num grande comércio, onde tudo se compra e tudo se paga. Em nossa sociedade, dominada pelo egoísmo e pela ganância, parece que o sentimento da gratidão não encontra mais espaço no coração humano.
No relacionamento do dia-a-dia, muitas vezes telefonamos ou falamos com as pessoas para pedir um favor; poucas vezes para agradecer. Às vezes, o serviço que nos é prestado é profissional: a pessoa ganha para fazer o serviço. Dificilmente alguém presta um serviço para fazer um favor.
Isso vale também para o nosso relacionamento com Deus. Telefonamos mil vezes para Deus, pedindo ajuda. Em nossas orações, pedimos a Deus saúde, sucesso, segurança. Poucas vezes nos lembramos de rezar para agradecer. Quem sabe agradecer vê o mundo de outro jeito.
Ouvimos, hoje, duas histórias de cura de leprosos: o profeta Eliseu cura o sírio Naamã e Jesus cura dez leprosos de uma vez.
A narrativa da cura de Naamã por Eliseu, na primeira leitura, mostra que a bondade de Deus supera todo o tipo de barreira humana e não tem fronteiras geográficas nem de instituições religiosas. Ele é o Deus de todos e por todos quer ser reconhecido. Naamã é o retrato de tudo o que o povo israelita achava negativo: é chefe do exército sírio, que, várias vezes, massacrou o povo de Israel, e por isso é um inimigo. Adora um deus arameu e por isso é pagão e idólatra. E, para piorar tudo, é leproso, e por isso é considerado impuro. No entanto, Eliseu, profeta israelita, o acolhe e o cura, sem levar em conta nenhuma dessas características, que faziam dele um excluído, em termos de hoje. O gesto de acolhida de Eliseu, curando a lepra de Naamã provoca nele o reconhecimento de Deus de Israel como único Senhor. Naamã volta para casa comprometido com o projeto de Javé, vendo o mundo de outro jeito, sabendo que há um Deus para todos e que esse Deus tem compaixão dos doentes, em todos os povos.
Jesus cura dez leprosos e só um se lembra de voltar para agradecer. Jesus pergunta pelos outros nove. O que será que Jesus está querendo? Mais homenagens? Quer que seu poder sobrenatural seja reconhecido?
Jesus não esperava ser reconhecido e admirado por todos, e não ficou ressentido por não receber um “muito obrigado” depois de prestar um favor. Seria pura hipocrisia fazer um favor para depois ser reconhecido como “benfeitor”. Jesus se admira de que os outros nove agraciados com a cura não tenham percebido que Ele, Jesus, estava revelando uma nova relação entre Deus e o ser humano.
Ao voltar, louvando a Deus e agradecido a Jesus, o ex-leproso demonstra que algo mais do que a cura aconteceu com ele. Jesus diz a ele: “A tua fé te salvou”.
O samaritano retorna, não só para agradecer, mas para manifestar sua profissão de fé na pessoa de Jesus. Não era simplesmente a cura de uma doença, por mais terrível que fosse naquele tempo. Trata-se de uma mudança de rumo, admitiu seguir uma nova proposta de vida que tinha sua origem em Jesus. O ex-leproso sentiu-se novamente acolhido na sociedade. Isso foi possível porque houve, da parte de Jesus, respeito, acolhida e compaixão, e da parte do ex-leproso, busca, confiança, coragem e gratidão.
Naamã servirá somente ao Senhor e o samaritano se compromete a seguir Jesus, vendo nele o revelador da gratuidade do Pai.
O Evangelho nos mostra que nem todos agradecem pelo bem recebido. Mas como podemos louvar o Senhor e agradecer quando o sofrimento nos rodeia de todos os lados? É possível agradecer a Deus mesmo na provação? Faz sentido cantar e louvar a Deus se a cada dia vemos tanta miséria, sofrimento, injustiça, violência?
É fácil ser agradecido quando se recebe algo bom. Mas como podemos acreditar no Deus da vida e do amor, da paz e da justiça, como podemos agradecer a Deus, quando estamos sendo incompreendidos, perseguidos, maltratados e até mortos? Nós, aqui, talvez não sofremos nada disso, estamos até muito bem, graças a Deus. Mas quantos irmãos nossos, à nossa volta, não têm nenhum motivo para serem agradecidos. Quantos estão sofrendo terrivelmente, e não conseguem entender o porquê de tanto sofrimento? O que podemos dizer a esses irmãos?
A segunda leitura de hoje nos ajuda a encontrar uma resposta a estas questões. Quem está sofrendo provações, como poderá reconhecer a presença deste Deus que ama, que cura, que quer estar presente em nossa vida em todos os momentos? O sofrimento e a morte de gente inocente desafiam constantemente a nossa fé no Deus da vida. Quantos se consagraram à causa do Reino de Deus, enfrentando os maiores sacrifícios e renúncias, por amor a Deus, e acabam sendo vitimados por doenças incuráveis, aborrecimentos, dores, perseguições e martírios sem fim? O que pensar disso?
São Paulo escreve a seu amigo Timóteo: “Lembra-te de Jesus Cristo, pelo qual eu sofro... É por isso que tudo suporto...”. Paulo está preso, algemado por causa da propagação da Palavra de Cristo, como se fosse um malfeitor, mas se alegra porque vê nisso uma oportunidade para que outros consigam descobrir o grande amor de Deus por nós.
Sei que não é fácil fazer do sofrimento um ato de amor, um ato de entrega a Deus. É difícil aprender a lição do amor no sofrimento olhando para a cruz.
Quem “entende” a cruz descobre o sentido do sofrimento. A solidariedade de Jesus com todos os sofredores é a garantia de que não seremos decepcionados. Jamais agradeceremos ao Pai os sofrimentos pelos quais passamos, pois não é isso que Ele quer. Mas podemos agradecer-lhe pela força que nos dá e pela certeza de que “lutar não foi em vão”.tai, Senhor, a minha fé!”.
Frei Gunther Max Walzer