Homilia - 21/01/2018 - Terceiro Domingo do Tempo Comum
Às vezes, um amigo a quem queremos bem começa a tomar um caminho que achamos arriscado; aí dizemos: “Cuidado! Você vai se dar mal!”. Se gostamos mesmo da pessoa, isso não é uma ameaça, não estamos “rogando praga”. Na verdade, estamos até torcendo para não termos razão.
A sabedoria popular afirma que “é melhor prevenir do que remediar”. Para prevenir é preciso tomar cuidado e, muitas vezes, ouvir os conselhos de gente experiente que gosta de nós.
Assim encontramos certos avisos de desgraça na Bíblia onde Deus, como fazem as pessoas que nos amam, não está querendo nos ameaçar. Na verdade, está nos dizendo: Cuidado com os perigos desta vida! É um recado para sermos prudentes, não é para nos assustar.
Na história de Jonas, na primeira leitura, encontramos um aviso que não se cumpre. Essa história fala de Jonas fazendo ameaças: Nínive será destruída em 40 dias. Acontece que o povo faz penitência, Deus perdoa e a destruição não acontece. Deus não quer a desgraça, quer a salvação.
Na segunda leitura, São Paulo escreve uma carta à comunidade que estava esperando o fim dos tempos, a segunda vinda de Jesus. Alguns na comunidade se assustavam, outros achavam que não valia a pena se esforçar para realizar mais nada porque o fim estava próximo. Como sabemos, o mundo não acabou naquele tempo. Por outro lado, o mundo está sempre acabando para muita gente todos os dias. Nunca sabemos quando será o nosso último dia. E aí? Vamos viver assustados e com medo? Ou vamos aprender a dar mais valor a cada dia que nos é concedido?
São Paulo está dizendo que o tempo é breve. E o que ele recomenda? Que cada um faça o que é preciso fazer. Ou seja: viva-se a vida normal sem dar às coisas um valor absoluto que elas de fato não têm. Não diz que parem de viver, diz que vivam com novo espirito, pensando no mais importante. E o que é esse “mais importante”? São Paulo diz que a figura deste mundo passa. Está pensando naquilo que não passa, naquilo que vai ser nosso para sempre. O que não passa é o bem que realizamos, é a caridade que vivemos, é o quanto nos doamos aos outros. E isso não se faz nas nuvens, no céu. Isso se constrói na vida diária, fazendo o que deve ser feito, com o coração cheio da graça de Deus e tendo os valores do Reino como critério para as nossas escolhas.
No evangelho Jesus diz: "Completou-se o tempo e o Reino de Deus está próximo”. Jesus anuncia que o tempo da salvação já chegou e ele mesmo é o Reino de Deus no meio de nós. De certa forma, com ele tudo está realizado.
Como cristãos, não temos que esperar outras revelações: qualquer reflexão, mensagem, ou qualquer outra coisa só vale como comentário, esclarecimento, aplicação daquilo que Jesus revelou.
Fazem parte do Reino de Deus o fim de todo tipo de mal, o fim da injustiça e do sofrimento. Tudo isso nos pode parecer estranho: o Reino de Deus já veio e ainda não veio. Dá para entender? É que, com Jesus, o Reino já veio, a salvação já aconteceu, a vitória sobre a morte já se tornou realidade pela ressurreição do Senhor. Mas o Reino ainda não veio, por completo, porque falta muito caminho que a humanidade ainda tem que percorrer na direção de tornar concreto, na vida de cada dia, o projeto de Jesus.
Logo depois de anunciar que o Reino está próximo, Jesus diz: “Convertei-vos e crede no evangelho”. Ele nos convida a uma parceria no projeto do Reino. Crer, nesse caso, não é proclamar as verdades de fé que aprendemos no Catecismo. É mostrar com a própria vida que levamos a sério a proposta de Jesus. Converter-se também não é só passar a frequentar determinada Igreja. É transformar dentro de nós tudo que precisa ficar mais de acordo com o evangelho.
Por isso, ser cristão não é brincadeira, exige tomar decisões adultas e responsáveis.
Como os primeiros apóstolos somos convidados a “pescar gente” dentro do projeto do Reino de Deus. Não se trata só de pescar gente para vir à igreja, embora se suponha que seja um benefício encaminhar alguém a uma boa caminhada cristã. Trata-se também de formar uma parceria com muita gente – tenha a religião que tiver – para construir um mundo melhor. O pescador de peixe não pesca para o seu próprio benefício. A Igreja não é uma organização voltada só para si mesma, preocupada apenas com seu próprio sucesso. A pesca da Igreja tem que ser diferente: não é estratégia para aumentar a clientela. O pescador de gente, de acordo com Jesus, pesca para dar às pessoas “pescadas” uma tarefa, uma oportunidade maior de fazer diferença neste mundo atribulado.
Nossa pesca não é feita para viver nas nuvens. Vivemos numa realidade concreta, com problemas, angústias, conquistas e alegrias próprias do nosso país e do nosso tempo. Aqui onde estamos, o projeto do Reino de Deus está também entre o já (as coisas boas, que são sinais da ação da graça e da cooperação humana) e o ainda não (o que falta fazer, o que precisa ser transformado e mudado). Temos já e ainda não no trabalho, na escola, nas famílias, na política, na Igreja, na ciência... O que já foi feito nos anima, nos dá esperança. O que ainda falta é um desafio, provocação para realizar algo que acrescente beleza, justiça, fraternidade à vida humana é a tarefa que Deus nos confiou.
Frei Gunther Max Walzer