Homilia - 29/07/2018 - XVII Domingo do Tempo Comum
Sem dúvida, um dos maiores flagelos da humanidade é a fome. A televisão mostra, diariamente, imagens horripilantes de multidões famintas, mesmo assim, é muito vaga a ideia que fazemos do problema.
As estatísticas falam que perto de 805 milhões de pessoas passam fome no mundo. Destes, 2 milhões são crianças que morre de fome a cada ano. Existem países, onde a fome mata mais que doenças, pestes ou alguma outra epidemia.
Nosso Brasil não foge à regra. Estatísticas falam de 7,5 milhões de brasileiros passam fome. Quantas pessoas passam fome, hoje, no Brasil por causa da irresponsabilidade administrativa de interesses políticos, de interesses eleitoreiros, de interesses empresariais. Muitos querem ganhar com a fome do pobre e parece, que isso cada vez menos toca a consciência de quem poderia ajudar a saciar a fome de milhões de brasileiros. Todos nós pagamos impostos, mas no meio do caminho aparecem os corruptos e roubam aquilo que deveria ser dado aos pobres. Este é o grande pecado dos corruptos: roubam o alimentam dos pobres para ficarem mais ricos do que já são.
Há uma perfeita sintonia entre a primeira leitura e o Evangelho lidos hoje. Tanto o profeta Eliseu quanto Jesus foram sensíveis à fome do povo e, do que era pouco a garantir o alimento para todos. Mas o que está em jogo não é o “poder” de fazer milagres, seja de Eliseu ou de Jesus. Temos de entender bem o sinal que ele nos estava dando. Não vamos nos iludir pensando que Jesus vai fazer tudo sozinho e resolver os problemas da fome, num passe mágica. Jesus rejeita o triunfalismo e as soluções imediatistas. A fome, no nosso país é um problema sério e todos temos responsabilidade nele. Não podemos simplesmente apelar para o milagre.
Quando viu que uma grande multidão chegando perto dele Jesus disse a Filipe: — Onde vamos comprar comida para toda esta gente?
A pergunta de Jesus parece uma “pegadinha”. Filipe faz um rápido cálculo: organizando uma coleta, se poderá obter no máximo duzentos denários para comprar pão, que, todavia, não seriam suficientes para dar de comer a cinco mil pessoas e retruca: — Para cada pessoa poder receber um pouco de pão, nós precisaríamos gastar mais de duzentas moedas de prata. Um outro discípulo entra na conversa, André que apresenta um menino que coloca à disposição tudo o que tem: cinco pães e dois peixes. Jesus esperava justamente isso: ordena aos discípulos que acomodem as pessoas, depois tomou aqueles pães e aqueles peixes, deu graças ao Pai e os distribuiu.
Jesus multiplicou os pães. Será que ele deu uma esmola ao povo que estava com fome? Não! Jesus fez o rapaz repartir o que ele tinha. O que Jesus nos ensina no Evangelho de hoje não é como dar esmola, mas como repartir o que temos. No fundo, o dinheiro e as coisas materiais devem servir para criar mais fraternidade.
Naquela ocasião, Jesus realizou o milagre da multiplicação dos pães. Mostrou que multiplicando os pães todos teriam pão suficiente e até mesmo sobraria. Hoje, quem deve fazer o milagre somos nós. Certa vez, Jesus disse: “Vocês devem dar de comer para essa gente”. Se não temos os poderes divinos para realizar o milagre, temos ao menos, “pão e peixe”. Eram apenas cinco pães naquele tempo.
Diante do sofrimento, da solidão, da pobreza e das dificuldades de tantas pessoas, lamentar-se não resolve nada, mas podemos oferecer aquele pouco que temos. “Certamente temos algumas horas de tempo, algum talento, alguma competência... Quem de nós não tem os seus “cinco pães e dois peixes” (Papa Francisco)? “Se estamos dispostos a colocá-los nas mãos do Senhor, serão suficientes para que no mundo haja um pouco mais de amor, de paz, de justiça e, sobretudo, de alegria. Deus é capaz de multiplicar os nossos pequenos gestos de solidariedade e tornar-nos partícipes do seu dom.”
Jesus sacia não somente a fome material, mas aquela mais profunda, a fome de sentido da vida, a fome de Deus.
A multiplicação sempre se liga à Eucaristia. Mas Jesus, antes de explicar o mistério da Eucaristia, preocupou-se com o pão do corpo dos seus ouvintes. Depois que todos ficaram saciados, Jesus pôde dizer: “Não procurem apenas o pão material; busquem, também, o pão da vida eterna, que é o meu corpo”.
Este vínculo entre o pão material e o espiritual era visível na forma em que se celebrava a Eucaristia nos primeiros tempos da Igreja. A Ceia do Senhor, chamada então de “ágape”, acontecia dentro de uma refeição fraterna, na qual se compartilhava tanto o pão comum como o pão eucarístico.
Por isso, a multiplicação dos pães sempre está ligada ao pão da Eucaristia. É como se Jesus estivesse, nesse milagre, fazendo uma espécie de chamada, para o outro pão, o grande sinal da sua presença no pão que os cristãos haveriam de partilhar para celebrar a sua memória. Receber a Comunhão significa “fazer a Comunhão”.
Quem se reúne aqui para celebrar Eucaristia é a “turma do pão partilhado”. Sim, nós somos a “turma do pão partilhado”. Nosso Deus quer ser celebrado num encontro onde partilhamos, com igualdade e fraternidade, o pão. O pão eucarístico é o pão de igualdade, ninguém recebe mais, ninguém recebe menos. É o pão que é o próprio Jesus que se torna UM conosco.
Irmãos, aprendamos a lição do Evangelho de hoje, a de partilhar o pão. Aliás, não há segredo nenhum. Basta ter muito amor dentro do peito. Sim, Jesus entra no mundo pela porta da cozinha, através de um pedaço de pão dado com amor. O cristianismo não é apenas revelação de mistérios da fé, não é uma doutrina, não é uma corrente filosófica. Cristianismo é amor e vida. Não há amor e vida onde estiver faltando pão.
Por isso, quando partilhamos com os pobres o nosso pão e quando repartirmos com eles o pão do amor – então a nossa Igreja será uma Igreja acreditada. Enquanto a Igreja não passar pelo teste do pão, muitos não acreditam nela.
Mas, lembre-se: IGREJA SOMOS NÓS, IGREJA SOU EU, IGREJA É VOCÊ!
Frei Gunther Max Walzer