Homilia - 25/11/2018 - Solenidade Cristo Rei do Universo
Hoje é o último dia do ano litúrgico, o que não coincide com o ano civil, que termina no dia 31 de dezembro. Estamos concluindo este Ano Litúrgico em meio a muitos e tantos tumultos sociais. No entanto, é preciso lembrar que as celebrações do Ano Litúrgico carecem de sentido se as mesmas forem celebradas de modo alienado, longe da vida social. O Ano Litúrgico só tem sentido se for celebrado, ora iluminando a vida e as crises sociais, que escurecem a vida, ora alegrando o mesmo povo com suas festas.
Sempre, neste último domingo do Ano Litúrgico, a Igreja celebra a solenidade de Jesus Cristo, Rei do Universo.
O evangelho nos recorda a pergunta de Pilatos a Jesus: “Tu és rei?”.
A confirmação de sua realeza diante de Pilatos se dá em um momento dramático quando Jesus está totalmente só e indefeso, pois os amigos mais chegados o abandonaram, o povo a quem ele saciou a fome, instigado pelas lideranças, havia pedido a sua condenação, preferindo libertar Barrabás. É, portanto, um momento de fracasso total e vergonhosa humilhação sendo assim, nessas condições totalmente desfavoráveis, que Jesus confirma que é rei. Quando Pilatos faz a pergunta, Jesus diz que sim: ele é rei.
Neste dia, celebrando a Festa de Cristo Rei, para nós Jesus talvez diga: “Se sou eu que reina em sua vida, você defenderá o meu projeto, os valores pelos quais eu entreguei a minha vida?”.
Vivemos num país que se diz cristão, embora muitos defendam sua laicidade. O reinado de Jesus é uma questão de estatística, que revele que as igrejas cristãs estão cheias? E se as igrejas estivessem cheias e o país vazio de justiça, de caridade, de fraternidade, de solidariedade, de honestidade na administração do bem comum?
Pilatos perguntou a Jesus se ele era rei. Ao dizer: “Meu Reino não é daqui”, Jesus deixa claro que ele é um Rei diferente. E por quê? Porque é um Rei que defende outros valores e outras verdades. É um Rei que não usa de força nem de violência para conseguir seus objetivos. Não é um Rei que mostra seu poder desfilando diante de nós (como nos desfiles militares) para exibir a força bélica, armas e munições que ameaçam a vida com a morte a quem não se submeter ao seu poder. Esse não é o Reino de Jesus; não é desse mundo e, por isso, não age com as forças do mundo. Às vezes até gostaríamos que agisse desse modo, manifestando-se pela força ou pelo espetáculo. Mas, não; ele é diferente. Jesus é um Rei que não oprime, que não explora, que não engana seus súditos.
Em que consiste o poder do Reino de Deus?
“Eu nasci e vim ao mundo para isto: para dar testemunho da verdade e quem está do lado da verdade ouve a minha voz” (Jo 18,37).
O Reino de Jesus é um Reino de amor, de justiça, de paz e de fraternidade. Um Reino onde os direitos são iguais e respeitados. Um Reino onde as pessoas não são valorizadas pela cor, posição social ou conta bancária.
Esse Reino existe, não é uma utopia?
Acontece que é fácil distorcer a afirmação de Jesus e considerá-la um incentivo para não se comprometer com a transformação deste mundo. Aí aparece gente que diz: o Reino de Jesus é no céu, o que se passa na terra não conta. Jesus nunca foi desinteressado do que se passa na terra. Ensinou a rezar que peçamos ao Pai o pão de cada dia e que seja feita a vontade de Deus no céu e na terra. Justiça, caridade e fraternidade foram sempre prioridades na construção do Reino. Jesus sempre considerou que o culto sem a prática da justiça e da caridade é falso, não agrada a Deus. É aqui na terra, nos problemas concretos do dia-a-dia, que se vivem (ou não) esses valores do Reino que Jesus anunciou.
“Venha a nós o vosso Reino!” Essa é a súplica que fazemos na oração que o Senhor nos ensinou.
Com podemos fazer acontecer o Reino entre nós?
Deve começar aqui na terra, na nossa família, na comunidade e estender-se por toda a parte. Nesse Reino, autoridade é serviço. Quem é o maior e primeiro, se faz o menor e o último.
Na segunda leitura, tirada dos Apocalipse, se diz, que Jesus fez de nós um reino de sacerdotes (Ap 1,6). Este texto não se limita aos que receberam o sacramento da Ordem. Um reino de sacerdotes é o povo todo de Deus, tendo uma missão sacerdotal recebida por todos no batismo.
O que significa ser sacerdote?
Ser sacerdote é oferecer a Deus os dons desta vida, para que ela seja melhor e mais santa. O seu altar pode ser a mesa de trabalho, a casa, a arte, a escola, o hospital ou, simplesmente, o fogão... O altar, portanto, é qualquer lugar onde algo muito bom é oferecido a Deus.
Hoje, a Igreja celebra o Dia do Leigo. Isso lembra algo importante: os leigos estão mais envolvidos nas atividades comuns do que os sacerdotes ordenados. Sua presença é muito necessária no mundo do trabalho, ensino, na vida conjugal, criação dos filhos, politica, ciência, saúde, arte, comunicação, lazer, ecologia, economia...
Todas essas áreas podem ser ou não espaço onde se vivem os valores do Reino de Deus. Cada cristão que “reina” em sua atividade própria é chamado a ser representante do Rei Jesus na sua área de atuação. Para isso não é preciso fazer cursos de especialização de catequese, mas é indispensável estar a serviço de Deus nas ações, atitudes e decisões.
A segunda leitura do Apocalipse termina com as palavras: “Eu sou o Alfa e o Ômega”, diz o Senhor Deus, “aquele que é, que era e que vem, o todo-poderoso” (Ap 1,8). Em português seria: Cristo é o A e o Z.
O que significa isso?
Cristo é o princípio porque como diz o evangelho de João no capítulo primeiro, ele estava desde o começo junto de Deus; tudo foi feito por meio dele e para ele (Jo 1,1-3.14).
Ele é também o começo porque é o fundamento de nossa fé. Ele vem antes de qualquer reflexão teológica ou regulamento do direito canônico. Ele é o critério básico de decisão de nosso agir: cristão é quem coloca Jesus na base de suas decisões, antes de toda e qualquer outra consideração.
Cristo é igualmente o ômega, o fim, o horizonte, o ideal que nos orienta. Para ele caminhamos, a ele queremos chegar, levando tudo de bom que realizamos nesta vida.
Por isso façamos tudo:
Por Cristo, com Cristo, em Cristo, a vós, Deus Pai todo poderoso, na unidade do Espírito Santo, toda a honra e toda a glória, agora e para sempre. Amém.
Frei Gunther Max Walzer