Homilia - 23/12/2018 - Quarto Domingo do Advento
Já acendemos a quarta vela da nossa coroa de advento. Estamos na antevéspera da grande Festa de Natal. As compras já deverão estar feitas. A correria e agitação já acabaram. Muitas pessoas encontram-se num certo clima de esgotamento, afinal, queremos fazer de tudo para que o Natal fique bonito e amanhã tudo esteja pronto. Tudo ao nosso redor fala de Natal e, no meio de tanto barulho, corremos o risco de perder o sentido profundo do próprio Natal.
Qual é o sentido verdadeiro de Natal?
Parece que, de um momento para o outro, o secularismo veio como um tsunami e varreu todos os valores cristãos cultivados durante séculos no Ocidente. Parece que foram varridos os valores da família, do matrimônio, do relacionamento fraterno, os valores da própria vida... Não é isso o que está acontecendo com o Natal? O secularismo destruiu em muita gente a fé no Natal e esvaziou o sentido cristão do Natal. De modo bem visível, aconteceu isso substituindo o Menino Jesus por Papai Noel.
Um sociólogo disse numa palestra: “O Natal é uma festa comercial e capitalista que dura, mais ou menos, 45 dias, onde se permitem as gastanças e as comilanças para celebrar o 13º e a amizade.”
Festejar Natal neste contexto social e atual, para nós cristãos, é um grande desafio.
O Natal é uma celebração da fé, um momento para crescermos na fé, um tempo para testemunharmos a fé e para participar da fé de um povo que esperou séculos e séculos até a realização da promessa divina.
Qual era essa promessa?
O povo esperava o Messias e com ele teria início o reino de paz como foi anunciado pelos profetas. Um deles era o profeta Miquéias mencionado na primeira leitura. Ele viveu numa época muito complicada. Por toda parte só se via violência e corrupção: nos tribunais os juízes se deixavam corromper com favores, uma minoria de poderosos, dominada pela ganância, se apoderou de todas as terras e explorava os pobres. A corrupção era generalizada em todas as esferas da sociedade.
Nessa situação difícil, Deus anuncia pelo profeta Miquéias o nascimento de alguém “que dominará no país”. Este alguém não virá da corrupção dos palácios, mas seu nascimento irá acontecer na periferia, na pequena vila de Belém: ele nascerá pobre no meio dos pobres. E o profeta faz um anúncio de esperança: “As pessoas vão viver em paz, pois ele estenderá o poder até os confins da terra, e ele mesmo será a Paz” (Miqueias 5,4).
Neste quarto Domingo do Advento somos lembrados na liturgia da grandiosa obra que Deus realizou por meio de uma jovem que se chamava Maria. Maria, uma criatura simples, do povo, torna-se a mãe do Salvador, Jesus Cristo. É nela e por meio dela que acontece o primeiro Natal.
Maria dá o verdadeiro exemplo de como esperar o Cristo, ela acreditou nas palavras do Anjo e na promessa divina. E porque acreditou, foi escolhida como mãe do Salvador.
O texto do Evangelho de hoje, nos conta o encontro de duas mães, Maria e sua prima. Cada detalhe deste encontro tem sua importância. Comecemos pela observação simples, aparentemente corriqueira, com a qual começa o relato: “Maria entrou na casa de Zacarias e cumprimentou Isabel”. Se o cumprimento fosse apenas um simples “Bom dia!”, porque o evangelista Lucas dá tanta importância a esta saudação?
Os judeus daquele tempo, como também em nossos dias, ao se encontrarem, eles se cumprimentam com a palavra “SHALOM”, a palavra “PAZ”. Nos lábios de Maria a palavra “paz” é uma solene proclamação de que chegou ao mundo o esperado Messias e com ele teve início o reino de paz anunciado pelos profetas. “Ele mesmo será a Paz” (Mq 5,4).
“Reino de paz”, será que existe ou ainda há possibilidade de, um dia, acontecer?
Olhando para o nosso mundo e mesmo olhando para as nossas cidades, vemos uma situação calamitosa. Esta nossa situação é bem parecida com a situação do tempo do profeta Miquéias.
Como Maria nas montanhas da Judéia, como os anjos que em Belém cantaram “Paz na terra aos homens que Deus ama” (Lc 2,14), também nós, os discípulos de Jesus, o que mais desejamos para nós e o que a todos desejamos é PAZ.
Perguntemo-nos: você e eu, somos mensageiros da paz? As nossas comunidades e famílias são mensageiras da paz? O encontro entre nós cristãos é sempre um encontro que transmite serenidade, alegria, felicidade, paz? Falamos tanto em paz, será que ajudamos a construir a paz com a nossa vida?
Mas a paz jamais acontece se faltar o essencial. Pergunto o que é o essencial? O essencial é a fé. O Evangelho de hoje fala de Maria: “Você é abençoada e feliz, pois acredita que vai acontecer o que o Senhor lhe disse” (Lc 1,45).
A felicidade de Maria é consequência da fé. Feliz é aquela que acreditou no cumprimento das palavras do Senhor.
Maria é uma pessoa feliz porque depositou sua confiança em Deus, tinha a certeza de que a palavra de Deus ia se cumprir. Assim é na nossa vida. Tudo, mas tudo mesmo depende da força da nossa fé.
Maria é feliz, não porque viu acontecer, mas porque confiou na palavra de Deus.
Assim felizes são aqueles que acreditam numa civilização do amor e cooperam para que o amor acabe com a corrente do ódio.
Felizes são aqueles que creem na Palavra de Deus e dão a vida para que a paz aconteça.
Sem dúvida, não é fácil acreditar, especialmente, quando as coisas fogem do nosso “bom senso”. É preciso ter muita coragem para acreditar que vão se realizar as promessas feitas por Deus aos construtores da paz, aos que não praticam a violência, aos que não se vingam, aos que sabem perdoar, aos que doam a própria vida por amor.
Feliz foi Maria por ter sido uma pessoa de fé. Acreditou em tudo aquilo que estava acontecendo e que era obra de Deus. Felizes seremos todos, se tivermos fé a exemplo de Maria. A proximidade do Natal nos faz pensar em nossas atitudes e nossos gestos. Há tantos irmãos que acreditam em nós e esperam algo de nós. Lembrem-se que o melhor presente não é um cartão, mas pode ser uma palavra, um gesto amigo, um ato de caridade.
O presente mais bonito somos nós mesmos, cada um de nós é um presente divino, quando somos “instrumentos de paz”.
Frei Gunther Max Walzer