Homilia - 27/12/2020 - Sagrada Família
Na festa de Natal, ouvimos a narrativa do nascimento de Jesus em Belém. Os pastores no campo ouviram a mensagem do Anjo e foram visitar o Menino recém-nascido. Eles o encontraram junto com José e Maria.
Assim como a família é nossa porta para entrar no mundo e para entrar na vida, assim a família foi a porta que Deus abriu para entrar no mundo e na vida humana. Para que o mundo fosse salvo, Deus precisou da família. Aliás, sem família o Natal talvez nem mesmo existisse.
Hoje, a Igreja coloca para nós a festa da Sagrada Família e nos convida a meditar sobre a família. O modelo apresentado é o casal de Nazaré, que vem até o templo para apresentar o filho.
Olhando para a família no mundo de hoje podemos constatar que sua situação é muito complexa, principalmente nessa crise da pandemia do COVID-19. Muitos são os problemas que afetam a família. Além dos problemas de ordem material, há ainda as transformações sociais que formam uma nova cultura e que influenciam os hábitos, valores éticos e morais, costumes e comportamentos. Assim muitos, de fato, se perguntam: o que a festa da Sagrada Família pode dizer às famílias do século XXI? Vamos nos deixar questionar pela Palavra que acabamos de ouvir.
O Evangelho leva-nos a compreender que a encarnação de Jesus dá-se na realidade do seu povo. Maria e José, ao levarem Jesus para ser apresentado no Templo, obedeceram ao que previam as Escrituras, isto é, submeteram-se à Palavra de Deus por estarem comprometidos com ela, porque a sua observância era significativa e importante em suas vidas.
Notamos que não fizeram nada de extraordinário, já que estavam seguindo a Lei. Então, o que justificaria chamar essa família de “sagrada”? Não são atos extraordinários que realizam, muito menos manifestam obediência aos decretos governamentais da época. Também não é por uma palavra dita por um deles, já que o relato bíblico não nos reporta nenhuma palavra de José e Maria.
Para nos darmos conta de que essa família é sagrada, precisamos olhar para Simeão e Ana. A sabedoria, cultivada nos longos anos de vida, permitiu a ambos reconhecer a revelação de Deus na simplicidade e no cotidiano da vida.
Para Simeão estava ali o menino, que traz a salvação, a luz para todas as nações e a glória para Israel: “Agora Senhor conforme a tua promessa, podes deixar teu servo partir em paz; porque meus olhos viram a tua salvação, que preparaste diante de todos os povos: luz para iluminar as nações e glória do teu povo Israel.”
Ana é a mulher do anúncio, pois contempla, louva e anuncia que, naquele menino, estava a Libertação de Jerusalém.
Quando falamos em crise da família perguntamos qual seja a causa. Vemos muitas famílias que perderam a direção, casais que enfrentam dificuldades no relacionamento a dois, filhos que não encontram um sentido de vida. No entanto, temos uma luz que é a própria Palavra de Deus. Simeão declara: “Meus olhos viram a tua salvação, que preparaste diante de todos os povos: luz para iluminar as nações”.
Na “Palavra que se fez carne”, encontramos a luz no caminho que precisamos percorrer, e assim somos iluminados para que consigamos enxergar esse caminho. “A Palavra de Deus é não só uma boa nova para a vida privada das pessoas, mas também um critério de juízo e uma luz para o discernimento dos vários desafios que têm de enfrentar os cônjuges e as famílias” (Amoris Laetitia, 227).
Iluminados pelos ensinamentos da Escritura Sagrada, saibamos olhar a realidade concreta de nossas famílias e resgatar a importância de abri-las a Deus e colocá-las na dinâmica do amor, que vincula e fortalece para enfrentar os desafios. Que não percamos de vista que Cristo continua sendo nossa luz, nossa glória, nossa libertação!
A pergunta, espontaneamente, surge: é possível ainda constituir uma família sagrada? Esta pergunta surge porque a cultura atual manifesta grande desapreço pela instituição da família, cujos reflexos são evidentes na realidade dos lares. O amor fragmentado e interesseiro se reflete no descompromisso em relação à paternidade e à maternidade. Apesar de tudo isso, acredito que constituir uma família sagrada não está fora de nosso alcance.
Deus, através da encarnação de seu Filho nos trouxe o projeto de nossa salvação. No final deste ano tão atribulado para a maior parte das famílias, a Igreja apresenta a Sagrada Família como modelo e convite para que nossas famílias acolham o projeto divino no nosso hoje. Acolham o Evangelho e testemunhem com alegria e serenidade a graça de ser uma família cristã.
Frei Gunther Max Walzer