Homilia - 07/02/2021 - V Domingo do Tempo Comum
A fragilidade da vida humana, os sofrimentos, as lutas contra doenças e o confronto com a morte são experiências das quais ninguém escapa. Neste período desafiador da pandemia, as palavras que mais ouvimos são sofrimento, medo, números estatísticos de mortos. O inimigo invisível nos ronda e sentimos suas vitórias maléficas.
Também os textos litúrgicos de hoje nos falam do sofrimento. O sofrimento causado pela pandemia não despertou apenas pesquisas científica dos laboratório do mundo inteiro, mas é um sofrimento bem concreto que causa dor e luto, distanciamento de pessoas e despedidas para sempre de entes queridos.
E onde está a nossa fé, já que somos, em grande maioria, cristãos? Onde está Deus? Onde está Deus que é chamado de bondoso e protetor da vida e nos deixa morrendo?
Aqui importa dizer de modo claro com as palavras da teóloga Romi Bencke: a fé não imuniza as pessoas. O que faz com que os muitos que pegam Coronavirus não é por falta de fé ou confiança em Deus, mas a transmissão e o contágio acontecem por infelicidade nos cuidados sanitários ou mesmo por imprudência e desobediência aos protocolos estabelecidos pelas autoridades responsáveis.
Enfim, o sofrimento faz parte da vulnerabilidade da vida humana. Não somos destinados a sofrer, mas o sofrimento é parte da nossa condição humana.
O episódio da cura da sogra de Pedro, narrado no Evangelho, aponta para a missão de Jesus. A cura não nos deve iludir: Jesus não veio para “quebrar galhos”. Ele não é um curandeiro, um milagreiro. As curas que Jesus realiza são sinais para além de si mesmas. Elas apontam para o Reino de Deus. Este é um Reinado de vida, de paz, de amor que está dentro de nós.
Jesus não se rende ao aparente “sucesso” das curas. “Todos estão procurando o senhor” (Mc 1,37). Ele sabe que sua missão não é simplesmente atender às necessidades imediatas das pessoas. Sua missão é pregar, anunciar que o Reino de Deus está irrompendo na história e espera nossa adesão. Por isso, Jesus chama seus discípulos e disse: “Vamos aos povoados que ficam perto daqui, para que eu possa anunciar o evangelho ali também, pois foi para isso que eu vim” (Mc 1,38).
Jesus disse “vamos”. Os discípulos são, portanto, associados à missão de Jesus. Ele nos chama, hoje, também: ”vamos” a todos os lugares, a todos os setores da sociedade. A todas as situações em que a vida espera, ansiosa, essa Palavra de salvação e libertação. Foi por isso que Jesus nos ensinou a rezar no Pai-Nosso: “livrai-nos do mal”. Seria incoerente que nós, como seguidores de Jesus hoje, não buscássemos ser agentes de cura num mundo, principalmente, neste período triste, tão cheio de variadas formas de sofrimento.
Como curar hoje o irmão que sofre? Às vezes parece prático devolver o problema para Deus. Dizemos ao sofredor: “Vou rezar por você” - e damos o caso por encerrado: daqui para frente é com Jesus! É claro que temos de rezar uns pelos outros. Mas soa estranho pedir a cura deste ou daquele e não se importar com o estado dos hospitais públicos, com a miséria que favorece tantas doenças, com o sistema injusto que trata luxuosamente a saúde de uns e deixa outros sem assistência.
Uma boa oração de cura seria também pedir a Deus, diariamente, que nos torne sensíveis ao sofrimento alheio e nos inspire o que podemos e devemos fazer para cuidar bem da saúde física, mental, emocional, afetiva e espiritual de quem está ao alcance dos nossos esforços.
Nesse episódio da cura da sogra de Pedro, importante é ver a relação entre a libertação do mal e a disposição ao serviço. Imediatamente após a cura, “ela pôs-se a servi-los”.
A sogra de Pedro poderia levantar um questionamento interessante sobre os benefícios que gostaríamos de receber de Deus. Queremos ser curados do Covid-19, queremos a libertação de nossas angústias, queremos resolver problemas familiares, emprego, e tantas coisas que queremos resolver. E depois de tudo isso, depois da pandemia, o que vamos fazer? Nossa paz, nossa saúde nos leva à disposição de servir? Ou será que apenas queremos que Deus nos atenda?
Na pós-pandemia, o que é preciso ter um mundo mais solidário, em que os laços familiares, de amizade e em todos os ambientes fossem feitos de formas mais sólidas e fortificadas. Penso que nossa capacidade de compaixão e de solidariedade possa levar a um revigoramento de uma ciência que se coloca a serviço da humanidade e não exclusivamente da atividade e interesses comerciais. É um desejo que isso venha a acontecer depois de ter passado essa tempestade.
Este é o nosso compromisso depois da pandemia: derrotar o mal através do serviço da evangelização. Os outros precisam ouvir a boa nova, precisamos comunicar a luz que recebemos. De outro modo seria egoísmo. Não se conhece Jesus para ficar com ele confortavelmente aninhados numa piedade comodista num grupo da Igreja. Jesus nos chama porque o mundo precisa. Também nós precisamos: a fé cresce quando é comunicada.
“Jesus andava por toda a Galileia, anunciando o evangelho” (Mc 1,39).
Frei Gunther Max Walzer