Homilia - 21/03/2021 - V Domingo da Quaresma
Estamos chegando ao final do tempo quaresmal; abre-se a porta para a intensa vivência Pascal. No Evangelho, Jesus nos fala da força poderosa de gente que é capaz de dar a própria vida por um projeto, um ideal. O povo costuma dizer: “As palavras comovem, os exemplos arrastam”. Quando o exemplo chega ao martírio ganha um poder ainda maior de arrastar outros. Povo que cultiva a memória de seus mártires mantém vivo o ideal que eles defenderam e se compromete com a continuidade da missão do companheiro de luta que morreu.
Todos nós conhecemos pessoas que morreram em consequência de sua ação heroica em prol do próximo. Lembremo-nos de Chico Mendes, Martin Luther King, de Dom Oscar Romero e de tantos outros. Importante é mencionar que mais que dois mil missionários cristãos foram assassinados nos últimos vinte anos.
Os heróis não vivem nem estão longe de nós, eles estão no meio de nós. A pandemia provocada pelo COVID-19 é uma batalha onde pessoas heroicas arriscam sua própria vida e dos seus familiares por causa do seu trabalho. Os médicos são fundamentais, mas na rotina de hospital há milhares de pessoas que cuidam dos pacientes, toda a equipe de enfermagem. São eles que junto com os fisioterapeutas e os profissionais da limpeza que garantem os cuidados das pessoas enfermas. Todos eles são os verdadeiros heróis dessa pandemia.
Há também outras maneiras de doar a vida, produzindo exemplos que arrastam: mães, pais e pessoas que cuidam de seus filhos, de idosos, de deficientes com problemas mentais e físicos,, gente que pratica com heroísmo a sua profissão a serviço da comunidade, pessoas que se gastam num trabalho voluntário para atender pessoas necessitadas. Famosos ou anônimos, aqueles que se entregam totalmente a um projeto generoso de solidariedade fazem pensar e incomodam os acomodados.
A cruz é sinal de uma doação total. Essa cruz mudou a história da humanidade, fez um número incontável de pessoas entender a lógica da solidariedade e do amor de Deus. Jesus diz que é chegada a hora em que vai ser glorificado. “Pai, revela a tua presença gloriosa!” (Jo 12,28). Jesus fala de glória de uma maneira bem esquisita: a hora de ser glorificado é o momento de perder tudo, de entregar a vida. Ele sabia que ia ser assassinado de uma forma bastante brutal na cruz. Ele diz: “Quando eu for levantado da terra, atrairei todas as pessoas para mim” (Jo 12.32).
No entanto, não ia ser “levantado da terra” subindo para o céu cercado de anjos, ia ser assassinado de uma forma bastante brutal na cruz.
O evangelho diz que a multidão não entendeu bem o que Jesus dizia. Hoje, também muita gente não vai entender quando um cristão assume dar a vida pelo bem de outros, ser grão caído na terra para frutificar.
“Quem se apega à sua vida, vai perdê-la” – diz Jesus (Jo 12,25). E quem aceita perder a sua vida, esse é o que vai ganhar a vida eterna, o que é mais importante. Dá para entender uma coisa dessas? Observando bem a vida, vemos que é assim mesmo: ninguém constrói uma obra importante se não estiver disposto a sacrificar alguma coisa no caminho. Imaginem pai e mãe querendo educar os filhos sem perder nada do seu conforto, do seu lazer, da sua energia!
Jesus nos conta uma experiência que qualquer um de nós pode fazer; na natureza nada é produzido se antes não existe a morte. O grão de trigo, quando é colocado debaixo da terra, parece perder-se e morrer, mas, em seguida, aquecido pelos raios do sol e regado com a água da chuva, reaparece multiplicado por 100 numa espiga que nos mostra a vitória da vida.
Concretamente, isto significa quem quer seguir Jesus tem que passar com Ele pela Cruz. Um dia ele falou: “Quem não tomar a sua Cruz, não é digno de mim”; quer dizer, quem não for capaz de ficar com ele na “sua hora”, na hora da Cruz, não é digno de ser discípulo de Jesus.
Jesus faz outra exigência: “Quem quiser me servir siga-me; e, onde eu estiver, ali também estará esse meu servo” (Jo 12,26). O discípulo de Jesus não é um expectador, um curioso. É alguém que está com Jesus em todos os momentos e, principalmente, no momento de sua Paixão e Cruz. Em poucas palavras, não existe nem Jesus e nem discípulo sem Cruz.
Jesus diz aos seus discípulos para não ter medo de perder a própria vida, nos diz para fazer pouca conta da vida, para gastar a vida.
O que significa gastar a vida?
Gastar a vida é sentir que aquilo que a gente está fazendo tem sentido, que está sendo útil aos outros, que está dando sua vida para que outros possam ter mais vida.
Não se viveu se não se gastou a vida por amor aos outros e por amor a Deus que gastou sua vida por nós.
Talvez, ao lermos esse Evangelho, diante dessa exigência, provavelmente, sejamos tentados a escolher uma religião muito mais simples ou a escolher um livro de autoajuda onde encontramos frases bonitas, uma canção, uma poesia sentimental. E tudo se reduz numa frase: eu amo Jesus.
Seguir Cristo não é fácil. Ele também, diante da morte “sentiu-se angustiado” (Jo 12,27), mas não fugiu, não se escondeu e quando chegou a sua hora, mostrou a todos como era grande o seu amor.
“Quem quiser me servir siga-me; e, onde eu estiver, ali também estará esse meu servo. E o meu Pai honrará todos os que me servem” (Jo 12,26).
Frei Gunther Max Walzer