Homilia - 10/04/2022 - Domingo de Ramos
Acabamos de ouvir o relato da Paixão de Nosso Senhor. Hoje é o Domingo de Ramos. Em si o Evangelho do Domingo de Ramos é outro. Conta-se a entrada festiva de Jesus na capital do país, a cidade de Jerusalém.
Hoje, entramos com Jesus na grande semana, a Semana Santa. Acompanhamos a entrada festiva de Jesus na capital que vai terminar e se transformar em traição na Sexta-Feira e terminar com o assassinato de um homem inocente que se chamava Jesus.
O povo todo de Jerusalém estava vibrando. Foi uma festa bem alegre. Uma multidão de gente, gente de todos os cantos da cidade veio bater palmas e veio para receber Jesus que entrava na cidade.
E o relato da Paixão de Jesus que acabamos de ouvir nos conta o final triste na cruz, poucos dias depois. O mesmo povo que aplaudiu foi manipulado pelos inimigos de Jesus. E, alguns dias depois, as mesmas pessoas pedem a cabeça de Jesus: gritam e exigem sua crucificação.
O relato da Paixão não é passado, mas é o espelho do nosso tempo. O que nos é narrado do sofrimento de Jesus acontece muitas vezes no meio de nós. Tortura, violência de todo tipo e assassinatos de pessoas inocentes. Não é isso que acontece nesse exato momento na Ucrânia? Mesmo o comportamento com o qual nós reagimos hoje não é muito diferente das reações de então.
Temos aí, por exemplo, os discípulos que estão dormindo. Eles podem ser vistos no espelho como os cristãos de hoje, que estão dormindo, que deixam passar muita injustiça sem protestar.
Temos aí Pedro e os outros discípulos que abandonam Jesus na hora mais crucial. Quantas pessoas são abandonadas nestas horas quando mais precisassem da solidariedade de seus amigos?
Temos aí Simão de Cirene. Aquele que ajuda Jesus a carregar a cruz. Mesmo forçado, mas também existem muitas pessoas hoje assim. Pessoas que praticam a solidariedade, ajudam outros a carregar a sua cruz seja qual for.
E nós? Qual seria nosso comportamento vendo Jesus sendo torturado e carregando a cruz até o calvário? Não estávamos em Jerusalém naqueles dias; não podemos saber o que faríamos diante do que acontecia com Jesus. Estamos hoje, porém, diante de muitas situações que exigem decisão a favor dos valores pelos quais Jesus viveu, morreu e ressuscitou. Qual é a nossa postura?
Acabamos de ouvir a narrativa da Paixão de Jesus, nela o evangelista Lucas não chama tanto atenção para o sofrimento doloroso de Jesus, mas para o modo como Jesus passa pelo sofrimento: em completa obediência e submissão à vontade do Pai. Não poderia ser um chamado de atenção para nós, discípulos de Jesus, para aprender com Jesus a passar pelos sofrimentos de nossas vidas em total obediência ao projeto divino?
Podemos perceber e sentir a debilidade de uma pessoa que sofre. Aquilo que aconteceu com Jesus foi um sofrimento tão intenso a ponto de suar sangue. Tamanha foi a sua ansiedade diante do suplício que deveria passar até o momento da morte. Quando o sofrimento visitar nossas vidas, aprendemos de Jesus a não maldizer e nem pedir explicações para Deus. Acolhamos, de modo sereno, naquilo que nos é possível, o sofrimento como parte da vida humana.
Jesus era justo e não tinha nenhum motivo para ser condenado a este tipo radical de sofrimento pelo qual passou. Pilatos e o próprio ladrão que estava sendo crucificado com Jesus reconhecem que ele era inocente. Mesmo assim, Jesus assume o sofrimento de modo sereno e se confiando inteiramente ao Pai.
Quantas pessoas que conhecemos, pessoas justas e honestas, pessoas bondosas que sofrem e nos fazem perguntar: por quê ele? É a mesma pergunta que Lucas faz diante da Paixão de Jesus: por que ele, sendo justo e santo, deveria sofrer? Por que Deus permitiu tanto sofrimento na pessoa humana de Jesus?
Deus não escolhe quem vai sofrer e que tipo de sofrimento em algum momento da vida. Pode ser um sofrimento físico, um sofrimento espiritual ou psicológico, um sofrimento moral... O sofrimento faz parte da fraqueza humana. Quando sofremos, Deus não está se vingando de nada que fizemos, mas pede que o nosso sofrimento seja transformado em oferta da vida, a exemplo de Jesus, para que o mundo seja melhor.
É um pedido difícil, mas foi esse mesmo pedido que Deus Pai fez a seu Filho Jesus, quando sofria em sua Paixão e na sua Morte. Pelo sofrimento de Jesus, e também de tantos nossos irmãos e irmãs, compreendemos que Deus não se manifesta pela onipotência, mas pela impotência; pela impotência do sofrimento. Quando sofremos, nada podemos, mas Deus pode se servir deste sofrimento para regar a terra com mais vida, como fez através do lado aberto do Coração de Jesus.
É difícil, sim, refletir deste modo, mas esta é a mensagem que a Paixão segundo Lucas nos faz no dia de hoje. No momento do sofrimento, não assumir uma atitude de revolta, mas atitude de perdão, como foi a última palavra de Jesus: “Pai, perdoa-lhes”.
Frei Gunther Max Walzer