Homilia - 15/07/2012 - 15º Domingo Tempo Comum
Pouco depois da meia-noite de uma sexta-feira, os jovens de uma das mais badaladas boates de Milão (norte da Itália) tiveram uma surpresa. As luzes foram acesas, a música parou e no palco apareceu um frade capuchinho, sorridente, vestido com seu hábito marrom.
A primeira impressão dos jovens foi de espanto e, ao mesmo tempo, de expectativa. O religioso estava pregando um retiro na cidade e aceitara o desafio de falar aos jovens, por alguns minutos. Frei Rainério disse aos jovens que Deus não é contra a alegria, ao contrário, porque Deus é um pai e ele quer que os filhos e filhas sejam felizes. O frade esclareceu que a alegria plena, completa, só pode vir de Deus e que a religião não prega uma vida sem graça, pelo contrário, a religião é um convite à alegria e à realização pessoal.
Podemos pensar que uma boate, em princípio, não seja um bom lugar para a pregação do Evangelho. É um lugar muito alienado e permissivo, onde “rola de tudo”. Por que uma boate não pode ser também uma terra fértil para colocar a semente da Palavra de Deus? O semeador do Evangelho lançou a semente em toda parte. Na vida, nunca sabemos onde existe terra fértil; por vezes ela está onde menos esperamos.
A missão de anunciar a Boa Nova de Jesus Cristo é o tema central desse domingo. As leituras nos ajudam a repensar o anúncio da Boa Nova nos dias de hoje. Este anúncio, sem dúvida, não deve ser determinado segundo as conveniências pessoas de um missionário, muito menos seguir interesses de poderes políticos deste mundo. Será que a missão deve seguir os modismos tecnológicos de nossa sociedade ou o projeto da realização do Reino proclamado por Jesus de Nazaré?
Na primeira leitura encontramos dois personagens: Amasias, o sacerdote de Betel, bem remunerado, cheio de favores e de privilégios, e Amós, o pastor rude e pobre, que não era profeta profissional, não estava ganhando seu pão com a missão profética.
Amós vivia numa sociedade que mantinha uma religião que não interferia na vida, que não dizia nada para a vida... realizavam celebrações, faziam festas, tinham seus sacerdotes e ritos... mas nada que alterasse a vida pessoal e social. Era uma religião folclórica. O profeta é enviado por Deus a essa comunidade para apresentar novamente o projeto divino, para chamar o povo à conversão, a uma mudança de vida pessoal e social.
Amós, com sua pregação, criou grande conflito especialmente com os sacerdotes, que tinham seus privilégios, ganhavam bem e não queriam ser incomodados. Eram líderes religiosos que defendiam seus interesses pessoais e não lhes interessava o projeto divino.
Olhando a sociedade de hoje e a situação da sociedade do tempo de Amós, encontramos elementos parecidos.
Vivemos num tempo onde a religião não é vista com bons olhos pela sociedade. Sabemos que muitas pessoas usam a religião apenas por interesse social. Não é assim quando, por exemplo, realizamos batizados e casamentos? Na vida de muitas pessoas, a religião é deixada de lado, e, por vezes, até ridicularizada. É justamente nesse contexto, parecido com o de Amós, na 1ª leitura, que somos chamados e enviados a propor e testemunhar o projeto divino.
O Evangelho nos conta o envio dos doze apóstolos. Como Amós, os Doze também não eram profissionais da religião. Mas, convocados por Jesus, eles aceitam o desafio e vão.
No entanto, no Evangelho de hoje, Jesus coloca algumas condições para os discípulos. As mesmas condições valem para os que anunciam o Evangelhos nos dias de hoje. Que condição nos coloca Jesus? Ele nos indica várias, por exemplo: “Ir dois a dois”. O que quer dizer com isto?
Ninguém pode anunciar o Evangelho por conta própria. Os evangelizadores devem sempre trabalhar em equipe. Não podemos ser individualistas. Jesus pede a mútua colaboração. O trabalho em equipe favorece o discernimento, quando surge alguma dificuldade. Quem anuncia o Evangelho deve estar em sintonia com os irmãos na comunidade. Isto significa que deve haver harmonia entre os evangelizadores, que eles devem estar sempre reconciliados entre si. Reconciliados de verdade, não apenas de palavra. Este é o sentido do abraço da paz em cada Celebração Eucarística.
Jesus confere uma autoridade aos apóstolos. Pode causar surpresa o fato de que Jesus não dá aos apóstolos o poder de comandar, de dar ordens. O único poder que recebem é o de ter o domínio sobre os “espíritos imundos”.
O quê são “espíritos imundos”? “Espíritos imundos” são todas as forças do mal, as forças que provocam doenças, que suscitam maus sentimentos, que originam opressões, violências, injustiças. Por exemplo: Espíritos imundos são os que matam pessoas inocentes. São os que se envolvem com o narcotráfico. São líderes políticos que provocam guerras (Síria).
Depois Jesus dá algumas instruções sobre o “equipamento” dos mensageiros do Evangelho: uma só túnica para vestir, um só par de sandálias, um cajado e nada mais.
A narrativa das leituras chama atenção para o perfil e a intenção dos evangelizadores. Jesus é muito radical para aqueles que fazem do Evangelho um meio de ganhar dinheiro, como fazia Amasias, a começar pelo vestuário: vestir-se com uma túnica, sandálias e bastão! Não significa deixar de comer ou não ter cheque ou dinheiro, ou não se agasalhar no frio. Mas o que dizer da roupa de grife, do sapato brilhante, do terno bem cortado do pregador? Jesus envia seus evangelizadores sem dinheiro; o que fazer com a insistência permanente de entregar grandes valores de dinheiro para manter tantas “obras de Deus”? Alguma coisa não está combinando: ou o Evangelho está errado, ou Jesus deixou de considerar o desenvolvimento e o sucesso econômico. Será que, se Jesus vivesse entre nós, usaria roupa de grife, estaria nos grandes meios de comunicação e ganharia muito dinheiro com sua incrível capacidade comunicativa. Será? Cada um tire as suas conclusões.
Penso nos nossos missionários: O que Nóbrega e Anchieta trouxeram quando vieram ao Brasil. O que levam nossos missionários que trabalham nas terras da Amazônia, no Mato Grosso ou nas missões franciscanas de Angola na África?
Vão lá para explorar o solo? Ou para abrir um negócio de madeira? Ou, talvez, para descobrir um filãozinho de ouro?
E quando voltam de lá, o que trazem? Regressam ricos? Sim! Ricos de graças e de doenças!
Qual é o investimento da Igreja naquelas regiões? É para render, para dar lucro? “De graça recebestes, de graça dai também!”
De fato, nosso mundo comercial não entende nada disso. Trabalho missionário, em primeiro lugar, não é questão de dar, mas de se dar. O discípulo missionário deve estar sintonizado com a doação de um Cristo que deu sua vida. A mensagem de Cristo não se propaga como se faz propaganda da Coca-Cola.
Sejamos discípulos missionários conforme o perfil traçado por Jesus Cristo. Não levemos nada! A não ser um coração para ser doado.
Frei Gunther Max Walzer