Homilia - 18/06/2023 - XI Domingo do Tempo Comum
Olhando a história da humanidade, sempre encontramos povos passando por dificuldades e manifestando sua impotência, sua vulnerabilidade diante os abusos da liberdade.
Lendo o texto do Evangelho deste domingo, percebemos que são sempre as situações concretas que motivam a ação e a pregação de Jesus. Ele nunca parte de meras abstrações, mas da realidade. O texto de hoje é uma boa demonstração disso.
Olhemos, então, para o início: “Vendo Jesus as multidões, sentiu compaixão, porque estavam cansadas e abatidas, como ovelhas que não têm pastor. Então disse a seus discípulos: (v. 36) ‘A messe é grande, mas os trabalhadores são poucos. (v. 37) Pedi, pois, ao dono da messe que que envie trabalhadores para a sua colheita!” (v. 38).
O texto do Evangelho nos apresenta a reação de Jesus face à situação do povo que o seguia: ”Sentiu pena, compaixão”. Sentir compaixão é desmanchar-se de ternura, é “sentir na pele” o sofrimento do outro. É ter a sensibilidade de perceber o problema do outro. Jesus vive tudo isso ao olhar a multidão. Ele percebe a causa do problema: o povo está sem lideranças que o ajudem, de fato, a reencontrar o caminho da vida, a chegar àquelas “verdes pastagens e águas repousantes” de que fala o salmo do Bom Pastor.
Jesus escolhe doze dentre dos seus seguidores e os envia como pastores. A missão deles era fazer a mesma coisa que Jesus estava fazendo: curar os enfermos, que aqui tem o mesmo significado de “expulsar demônios”, pois as doenças eram associadas à ação de demônios (espíritos maus) na vida humana. E mais à frente repete e acrescenta: “Vão e anunciem isto: O Reino do Céu está perto. Curem os leprosos e outros doentes, ressuscitem os mortos e expulsem os demônios. De graça vocês receberam; portanto, deem de graça” (Mt 10,7-8). Fica claro que a missão dos discípulos é a mesma do Mestre.
A narrativa da escolha dos Doze não é apenas uma notícia de um fato passado, para conhecimento nosso, muito menos é uma afirmação do poder dado a um grupo de pessoas, como se só esses fossem “autorizados” por Jesus, é muito mais do que uma simples “lista dos chefes”, dos “eleitos”, dos “chegados” ao Mestre. Essa narrativa nos diz que Jesus continua enviando, agora, novos discípulos para prosseguirem a sua missão. Jesus “chamou seus discípulos”, não só os Doze, mas os discípulos de todas as épocas para serem os “promotores da vida” como ele foi e é.
O texto deste Evangelho é, sobretudo, uma palavra de esperança e uma garantia do amor e da misericórdia de Deus para conosco.
Hoje, nossos olhos são os olhos de Jesus. Temos diante de nossos olhos a mesma cena de Jesus: um povo cansado, abatido, inseguro, desorientado. Vemos o povo numa situação crítica até caótica, predomina o medo e a angústia, a instabilidade e a insegurança. Notícias verdadeiras e falsas se cruzam e recruzam. Dúvidas e interrogações vêm à tona.
“Quando Jesus viu a multidão, ficou com muita pena daquela gente porque eles estavam aflitos e abandonados, como ovelhas sem pastor (Mt 9,36).
Vemos este povo rezando para que Deus tenha compaixão do seu povo, que acabe logo este sofrimento.
“Jesus chamou os seus doze discípulos” (Mt 10,1). O Evangelho não é uma leitura histórica, pela qual conhecemos fatos passados, é uma leitura que acaba de acontecer aqui e agora, provocando e desafiando nossas vidas.
Hoje, Jesus está diante de nós e nos chama para sermos seus discípulos e discípulas. Doze, naquele tempo, centenas e milhares nos nossos dias. Acabamos de ouvir o mesmo convite de Jesus. Quem se dispõe a acolher o chamado de Jesus? Jesus aponta o caminho da cruz, e esta torna-se o caminho de ressurreição. Somos enviados a curar corações adoecidos pela crise; enviados a ressuscitar deprimidos por terem perdido tudo, emprego e oportunidades, até entes queridos; enviados a purificar leprosos contaminados por ideologias e pelas reclamações da vida; enviados a expulsar os demônios da corrupção, da agressividade e violência. Somos enviados com o olhar compassivo de Jesus para testemunhar a misericórdia divina.
“De graça vocês receberam; portanto, deem de graça” (Mt 10,8). A crise nos oferece uma oportunidade sem igual para a acolhida, o encontro, o diálogo, a compaixão, a aproximação fraterna e a solidariedade, enfim, para fazermos uma revisão das relações pessoais e sociais. Assim, cada um de nós pode ser um “bom pastor” neste momento de grande dificuldade para todos nós.
Frei Gunther Max Walzer