Homilia - 15/10/2023 - XXVIII Domingo do Tempo Comum
A Bíblia fala diversas vezes em refeição, banquete e festa, como acabamos de ouvir nos textos litúrgicos de hoje. No tempo atual, em especial nas cidades, a refeição perdeu seu sentido de comunhão e de partilha. Muitas vezes, a refeição é feita às pressas e a mesa do alimento passa a ser a extensão da mesa do trabalho ou acontece na frente da TV, cada um com seu prato servido, com o garfo na mão direita e o celular na esquerda, sem perceber o outro ao lado, sem um gesto de partilha, todos enfeitiçados pela “telinha”.
Os alimentos, em sua maioria, industrializados ou preparados de um modo impessoal, não contêm mais o sabor dado pelo carinho e dedicação de quem faz a refeição para pessoas que conhece. Raras vezes a família se encontra em redor da mesa do lar. Hoje, vai-se a restaurantes e a uma pizzaria, tudo afetivamente insípido.
Para entendermos a profundidade trazida, hoje, é preciso resgatar a dimensão simbólica da refeição e do banquete como oferta e acolhimento, seguida da gratidão de quem convidou e de quem é convidado.
O profeta Isaías fala de um banquete que Deus prepara na montanha sagrada (Is 25,6-10). É para todos os povos, porque Deus é Pai de todos. A história humana não se resolve com uns sendo felizes e outros não. Vivemos num mudo global, onde qualquer coisa que vai mal afeta o conjunto do mundo. Podemos não querer ser solidários e tentar esquecer os outros. Mas não adianta. Vamos sofrer, de um jeito ou de outros, as consequências de não saber organizar um mundo com cara de festa, com lugar para todos.
Jesus, no texto do Evangelho, retoma a imagem da festa. O Reino de Deus é semelhante a uma festa, até porque é a vivência dos valores desse Reino.
Se a festa é tão boa porque alguns recusam? A parábola de Jesus fala de dois tipos de recusa. Um é a dos indiferentes, que preferem cuidar de seus negócios particulares e não estão motivados para a busca da alegria coletiva. É a turma do “primeiro eu”, o pessoal que não é sensível ao chamado para tomar parte na transformação, que defende os próprios interesses e deixa o mundo pegar fogo. A outra recusa é mais direta e violenta: são os que matam os mensageiros do dono da festa, os que não querem mesmo que a festa aconteça. A história das Igrejas cristãs está cheia de emissários sacrificados, martirizados, porque queriam fazer a festa de Deus acontecer.
Festa difícil essa! Deus oferece o melhor caminho e tanta gente não enxerga.
O mês de outubro é o mês missionário. Uma grande função da Igreja é chamar para esta festa. Muitas vezes não chamamos, ficamos encastelados na paróquia ou “sentados no sofá em casa”, como diz o Papa Francisco, esperando que as pessoas batam à porta, quase tendo que adivinhar que temos uma festa a oferecer. Outras vezes não queremos convidar Fulano ou Beltrano porque achamos que não vai aceitar ou que não tem nada a contribuir.
Nossa dimensão missionária não consiste apenas em enviar gente para terras distantes. Precisamos ser missionários também aqui por perto indo ao encontro das pessoas.
Quem são os convidados do banquete?
Os primeiros convidados não entram na festa. Recusam o convite porque não querem largar os próprios interesses: a lavoura, os negócios. Não precisam que ninguém lhes ofereça um banquete: eles têm tudo o que lhes pode garantir uma vida sem problemas.
Assim, os convidados são recolhidos ao longo dos caminhos e pelas praças: são bons e maus, limpos ou sujos, sem distinção, são as pessoas do mundo inteiro.
Para nós esta parábola é um convite para abrir o coração e as portas de nossas comunidades a qualquer tipo de pessoa, aos pobres, aos marginalizados, a quem é rejeitado por todos.
Olhando a segunda parte da parábola, ficamos um tanto perplexos. Como combinar a generosidade do dono da festa e sua bondade com os pobres, com aquilo que está fazendo agora? Por muito pouco não estão estourando seus nervos e está se tornando até cruel!
“Então o rei disse aos empregados: ‘Amarrem os pés e as mãos deste homem e o joguem fora, na escuridão. Ali ele vai chorar e ranger os dentes de desespero’.”
Qual é a mensagem que Jesus nos quer transmitir com esta linguagem dura?
Deus não está, evidentemente, preocupado com as exigências da moda. A veste representa a disposição correta para participar da festa.
É que para podermos participar do banquete do Reino, devemos estar preparados com condições interiores, revestidos de atitudes e sentimentos necessários para não atrapalhar a festa. É o que fica simbolizado na veste nupcial.
Todos nós sabemos o que acontece quando certas pessoas se apresentam para um trabalho e acabam sendo um peso para o grupo: desunem o grupo, não cumprem compromissos, dão mau exemplo e comprometem o grupo... Chega uma hora em que alguém diz: Assim não dá fulano! O trabalho do Reino não é um piquenique irresponsável.
A frase “muitos são chamados, e poucos são escolhidos”. Aqui se faz a pergunta: ”Então quem não pode ficar no recinto da festa?”. Não cabe na festa quem vem pelos motivos errados: quem não quer crescer. Pecar é humano, e a compaixão de Deus não se nega a quem falhou; mas é preciso sinceridade de intenção, querer melhorar, ter o coração aberto também aos irmãos, não ser um “estrago da festa”.
O traje mais bonito que temos é a caridade. Será que todos estamos usando este traje para participar do “banquete eucarístico”?
Saibamos que nós também fomos chamados, mas Deus não pensou numa seleção arbitrária. Deus não quis formar um grupinho dos seus “favoritos”. Deus nos escolheu, respeitando as opções que nós mesmos fazemos.
Frei Gunther Max Walzer