Homilia - 21/01/2024 - III Domingo do Tempo Comum
A vacina chegou! Parece que a vacina contra a dengue chegou! Durante muitos anos falamos de mortes causadas pela COVID e pela dengue. Muitos testes foram realizados, comportamento prescritos como lockdown, distanciamento social, imunização de rebanho, respiradores fabricados e distribuídos, hospitais de campanha construídos, álcool gel e máscaras... Mas falamos muito, muito sobre vacina, a vacina que nos libertaria das pandemias e epidemias. As previsões se acumulavam, mas a vacina não vinha. Viramos especialistas contra a COVID e dengue. Muitos descobriram como se fabrica uma vacina. Enfim, as vacinas chegaram! Esta é a grande notícia! É como a chegada da vacina fosse a nossa redenção, a nossa libertação.
Vejamos o texto do Evangelho: “O tempo já se cumpriu e o Reino de Deus está perto. Convertam-se e creiam no Evangelho” (Mc 1,15). É impressionante que essas sejam as primeira palavras que Jesus diz no Evangelho de Marcos. O tempo da preparação, para Israel o tempo da espera dos profetas, o tempo da paciência de Deus alcançou o seu cumprimento.
“O Reino de Deus está perto”. Este reino é a presença de Deus em tudo e em todos através do seu amor.
O novo tempo não é mera continuidade. Ele é radicalmente novo. Ele nos faz radicalmente novos. Esta é a síntese da pregação de Jesus: um tempo novo começou em que é possível fazer Deus reinar na própria vida.
Para que aconteça esse tempo novo, é preciso converter-se. “Convertam-se e creiam no Evangelho” (Mc 1,15).
Infelizmente, o tema da conversão foi esvaziado, ao longo da nossa tradição cristã, acabou por significar a entrada em um grupo religioso ou o abandono deste ou daquele vício.
O que é conversão? Deus reine sobre mim, sobre você, sobre nós, e é assim que o Reino de Deus acontece.
Agora, graças à presença de Jesus, à sua vida e à sua palavra, é possível que cada pessoa deixe que só Deus reine sobre si, e não os ídolos ou outros senhores. Mas, para que isso ocorra, é preciso ter fé: “Creiam, tenham fé, confiança!”. Essa palavra de Jesus nos deve sacudir, ela é dirigida a nós que sempre somos tentados a confiar nas nossas obras, acabando assim por esvaziar a fé.
Depois deste anúncio da Boa Nova, a primeira atuação de Jesus é procurar colaboradores para levar adiante o seu projeto. “Jesus estava andando pela beira do lago da Galileia” (Mc1,16). Jesus começou o seu caminho. É um profeta itinerante que procura seguidores para fazer com eles um percurso: viver abrindo caminhos ao Reino de Deus. Não é um rabi (mestre) sentado na sua cátedra, que procura alunos para formar uma escola religiosa.
Pedro, André, Tiago e João, pescadores de Cafarnaum, perceberam que Jesus os estava observando no seu trabalho e disse: “Venham comigo, que eu ensinarei vocês a pescar pessoas” (Mc 1,17).
Eles ouviram o seu chamado certamente surpresos. Não procuraram pedindo explicações, não esperaram, simplesmente deixaram redes, barcos, praia, companheiros e o pai e seguiram Jesus.
Quem eram esses homens? O horizonte da vida deles era o mar, o barco, peixes e rede. Será que eles conseguiram avaliar o que os estava esperando: insegurança, dureza, um caminho de incompreensão e perseguição?
“Venham comigo, que eu ensinarei vocês a pescar pessoas”, foi o convite dirigido a Pedro, André, Tiago e João, pescadores de Cafarnaum.
A primeira impressão que a gente tem é que Jesus estava escolhendo pessoas erradas para uma missão tão grande de anunciar a chegada do Reino de Deus. A um primeiro momento, até parece que Jesus convocou os primeiros que lhe cruzaram o caminho. Como ele pôde dirigir este convite a pescadores analfabetos, pessoas provincianas? Este é o nosso raciocínio humano, no entanto, os caminhos de Deus são outros.
E nossa surpresa aumenta quando entendemos que o convite de Jesus é dirigido a cada um de nós. Jesus chama cada um de nós para a mesma tarefa. E nós nos perguntamos: “Eu? Poderei eu ser um bom apóstolo de seu Reino?”. Se nos examinarmos, teremos de reconhecer que somos muito limitados, provincianos ou, como aqui dizem “Manézinhos da Ilha”, indignos e incapazes de anunciar as verdades eternas para a salvação dos outros. Como Moisés começamos a gaguejar, como Davi, sentimo-nos pecadores e somos tentados a não aceitar o convite. Mas a voz de Deus continua nos chamando e seu convite não nos abandona.
O que fazer então?
Jesus nos convida a uma parceria para construirmos com ele o Reino de Deus e diz: “Convertam-se e creiam no Evangelho”. Crer, nesse caso, não é só repetir fórmulas decoradas do catecismo, frequentar uma igreja ou acender velas para um santo. É mostrar com a própria vida, que levamos a sério a proposta de Jesus. Crer é transformar, dentro de nós, tudo o que precisa ficar de acordo com o Evangelho. Como os primeiros apóstolos, somos convidados a “pescar gente” dentro do projeto do Reino de Deus. Não se trata só de pescar gente para vir à Igreja, trata-se, também, de formar parceria com muita gente – tenha a religião que tiver – para construir um mundo melhor, construir o Reino de Deus.
Nossa pesca não é feita nas nuvens, vivemos numa realidade concreta, com muitas angústias, conquistas e alegrias, mas também de guerras e muita violência.
O que significa ser “pescador de pessoas”?
Nossa rede é uma rede que aproxima pessoas. Rede de amor, rede de solidariedade, rede de comunidade, rede de fraternidade. Uma rede que torna presente o Reino de Deus entre nós!
Frei Gunther Max Walzer