Homilia - 10/03/2024 - IV Domingo da Quaresma
Manifestações de protesto contra governos, ideologias guerras, corrupção e crimes ecológicos encontramos no mundo inteiro.
A leitura das Crônicas fala de delitos e “práticas abomináveis” das lideranças do povo judeu. Como é impressionante a franqueza desse texto, analisando o comportamento condenável dos dirigentes do povo judeu. Atualmente, temos o Ministério Público e CPIs instaladas para investigar os desvios do dinheiro público e a corrupção. O pessoal daquela época tinha passado dos limites: imitava o pior comportamento dos povos pagãos, profanava o templo, zombava dos profetas... Aí "não houve mais remédio" - diz a Bíblia - e lá se foi o povo para o exílio. Um castigo? Ou uma conseqüência? Ou, vendo por outro lado, uma oportunidade de aprender, de rever comportamentos?
Apesar de toda a orientação insistente de Deus, dos dez mandamentos, as pessoas sempre se desviam, e, como consequência, acabam ficando em situação difícil. Assim aconteceu com o povo da Bíblia quando foi para o exílio na Babilônia. Mas Deus não desiste; Ele quer salvar as pessoas.
Nós estamos acostumados a pensar diferente. Pensamos logo em condenação e castigo para quem comete um erro. Costumamos dizer: “Quem aqui faz, aqui paga!”. Achamos até um desaforo quando alguém erra e não acontece nada com ele. Com muita facilidade dizemos ou pensamos “Bem feito!” quando acontece algo de ruim com alguém que nos prejudicou.
Há também gente que acha que a desgraça de alguém é castigo de Deus.
Como lemos no segundo Livro das Crônicas (2 Crónicas 36,14-16.19-23), parece que é isso mesmo, analisando o comportamento condenável dos dirigentes do povo judeu: Eram infiéis e surdos aos apelos de Deus, profanaram o templo de Deus. Por isso, “o furor do Senhor se levantou contra o seu povo e não houve mais remédio” (Jo 3,18). Toda a desgraça do povo, morte, deportação, escravidão, tudo isso era consequência do afastamento de Deus.
Mas, Deus quer que seu povo fique feliz outra vez e seja salvo. Deus está tão ansioso para salvar, perdoar, recuperar o seu povo que nem espera algum líder ou profeta do próprio povo. Ele usa como instrumento Ciro, um rei pagão.
Deus quer salvar. Ele faz isso de graça. O evangelho nos diz: “Deus amou tanto o mundo, que deu seu próprio Filho”. E para que Deus fez isso? “Para que ninguém morra, mas que todos tenham a vida eterna”. Ou seja, para salvar o que foi criado por amor. Para isso Jesus veio: para salvar, não para condenar. Mesmo quando Jesus adverte, quando aponta erros, sua intenção é salvar. Deus não fica feliz em deixar o pecador se perder, para depois dizer “Bem feito!”. Para conseguir essa salvação Jesus vai ao extremo de oferecer a sua própria vida, sinal de quanto somos, todos, preciosos para Deus.
São Paulo diz na Carta aos Efésios (Efésios 2, 4-10) que Deus é rico em misericórdia. Quando estávamos mortos por causa das nossas faltas, Deus nos deu a vida e nos salvou.
Está muito claro, Deus é misericordioso. No entanto, o mundo continua submerso no mal. Os homens estragaram o Projeto de Deus e, até hoje, estão criando o caos, a desordem, os muitos males que nos atingem diariamente.
Apesar de todos os pecados que podemos ver e constatar todos os dias em casa, na rua, lendo jornal, assistindo televisão, Deus não desistiu da humanidade.
Jesus veio como luz para afastar as trevas, para reconciliar as pessoas com Deus, para mostrar um novo caminho de amor e de misericórdia.
O evangelho define claramente o caminho que a pessoa deve seguir para ser salvo: trata-se de “acreditar” em Jesus. “Quem crê não é condenado, mas, quem não crê, já está condenado”.
O que significa “acreditar”?
“Acreditar” em Jesus não é uma mera adesão intelectual ou teórica a certas verdades da fé; mas é escutar Jesus, acolher a sua mensagem e os seus valores, segui-lo nesse caminho do amor e da entrega ao Pai e aos irmãos. Acreditar no Filho de Deus significa superar a indiferença, o comodismo, os projetos pessoais. Significa deixar para trás o egoísmo, o orgulho, a auto-suficiência, os preconceitos. Significa realizar gestos concretos de doção pessoal, de entrega, de serviço que tragam alegria, vida e esperança aos irmãos que caminham lado a lado conosco.
Neste tempo de caminhada para a Páscoa, somos convidados a converter-nos a Jesus e a percorrer o mesmo caminho de amor total que Ele percorreu.
Há pessoas que vivem obcecados e assustados com esse momento final em que Deus vai julgar as pessoas, depois de pesar na balança as suas ações boas e as suas ações más… O evangelista João garante-nos que Deus não é um contabilista, que vai somar os débitos e os créditos da pessoa… O cristão não vive no medo, pois ele sabe que Deus é esse Pai cheio de amor que oferece a todos os seus filhos a vida eterna. Não é Deus que nos condena; somos nós que escolhemos entre a vida eterna que Deus nos oferece ou a eterna infelicidade.
O evangelho diz que Jesus veio para ser luz e foi rejeitado por gente que preferia as trevas. Nosso mundo anda cheio de trevas: a injustiça, a violência, a vingança, a mentira, a corrupção...
Como seguidores de Jesus, somos convidados a levar a luz da fraternidade, da justiça e da paz, lá onde estão as trevas. Ao fazer isso, não podemos perder de vista que o nosso objetivo é construir o Reino, é salvar. Não combateremos a violência com mais violência, mas ofereceremos a força poderosa da solidariedade, da misericórdia e da fraternidade. Olhando a vida coerente de Jesus, pediremos ao Pai que Ele nos ajude a sair de toda acomodação, para que não se apague a luz que nos foi confiada no nosso Batismo.
Frei Gunther Max Walzer