Homilia - 17/03/2024 - V Domingo da Quaresma
Estamos chegando ao final do tempo quaresmal; abre-se a porta para a intensa vivência Pascal. No Evangelho, Jesus nos fala da força poderosa de gente que é capaz de dar a própria vida por um projeto, um ideal. O povo costuma dizer: “As palavras comovem, os exemplos arrastam”. Quando o exemplo chega ao martírio ganha um poder ainda maior de arrastar outros. Povo que cultiva a memória de seus mártires mantém vivo o ideal que eles defenderam e se compromete com a continuidade da missão do companheiro de luta que morreu.
Todos nós conhecemos pessoas que morreram em consequência de sua ação heroica em prol do próximo. Lembremo-nos de Martin Luther King e de tantos outros. Importante é mencionar que mais que dois mil missionários cristãos foram assassinados nos últimos vinte anos.
Os heróis não vivem nem estão longe de nós, eles estão no meio de nós. Certas doenças exigem alto grau de heroicidade sendo uma batalha onde pessoas heroicas arriscam sua própria vida e dos seus familiares. Os médicos e enfermeiros são fundamentais na rotina do hospital. São eles que junto com os fisioterapeutas e os profissionais da limpeza que garantem os cuidados das pessoas enfermas. Todos eles são os verdadeiros heróis.
Há também outras maneiras de doar a vida, produzindo exemplos que arrastam: mães, pais e pessoas que cuidam de seus filhos, de idosos, de deficientes com problemas mentais e físicos,, gente que pratica com heroísmo a sua profissão a serviço da comunidade, pessoas que se gastam num trabalho
voluntário para atender pessoas necessitadas. Famosos ou anônimos, aqueles que se entregam totalmente a um projeto generoso de solidariedade fazem pensar e incomodam os acomodados.
A cruz é sinal de uma doação total. Essa cruz mudou a história da humanidade, fez um número incontável de pessoas entender a lógica da solidariedade e do amor de Deus. Jesus diz que é chegada a hora em que vai ser glorificado. “Pai, revela a tua presença gloriosa!” (Jo 12,28). Jesus fala de glória de uma maneira bem esquisita: a hora de ser glorificado é o momento de perder tudo, de entregar a vida. Ele sabia que ia ser assassinado de uma forma bastante brutal na cruz. Ele diz: “Quando eu for levantado da terra, atrairei todas as pessoas para mim” (Jo 12.32).
No entanto, não ia ser “levantado da terra” subindo para o céu cercado de anjos, ia ser assassinado de uma forma bastante brutal na cruz.
O evangelho diz que a multidão não entendeu bem o que Jesus dizia. Hoje, também muita gente não vai entender quando um cristão assume dar a vida pelo bem de outros, ser grão caído na terra para frutificar.
“Quem se apega à sua vida, vai perdê-la” – diz Jesus (Jo 12,25). E quem aceita perder a sua vida, esse é o que vai ganhar a vida eterna, o que é mais importante. Dá para entender uma coisa dessas? Observando bem a vida, vemos que é assim mesmo: ninguém constrói uma obra importante se não estiver disposto a sacrificar alguma coisa no caminho. Imaginem pai e mãe querendo educar os filhos sem perder nada do seu conforto, do seu lazer, da sua energia!
Jesus nos conta uma experiência que qualquer um de nós pode fazer; na natureza nada é produzido se antes não existe a morte. O grão de trigo, quando é colocado debaixo da terra, parece perder-se e morrer, mas, em seguida, aquecido pelos raios do sol e regado com a água da chuva, reaparece multiplicado por 100 numa espiga que nos mostra a vitória da vida.
Concretamente, isto significa quem quer seguir Jesus tem que passar com Ele pela Cruz. Um dia ele falou: “Quem não tomar a sua Cruz, não é digno de mim”; quer dizer, quem não for capaz de ficar com ele na “sua hora”, na hora da Cruz, não é digno de ser discípulo de Jesus.
Jesus faz outra exigência: “Quem quiser me servir siga-me; e, onde eu estiver, ali também estará esse meu servo” (Jo 12,26). O discípulo de Jesus não é um expectador, um curioso. É alguém que está com Jesus em todos os momentos e, principalmente, no momento de sua Paixão e Cruz. Em poucas palavras, não existe nem Jesus e nem discípulo sem Cruz.
Jesus diz aos seus discípulos para não ter medo de perder a própria vida, nos diz para fazer pouca conta da vida, para gastar a vida.
O que significa gastar a vida?
Gastar a vida é sentir que aquilo que a gente está fazendo tem sentido, que está sendo útil aos outros, que está dando sua vida para que outros possam ter mais vida.
Não se viveu se não se gastou a vida por amor aos outros e por amor a Deus que gastou sua vida por nós.
Talvez, ao lermos esse Evangelho, diante dessa exigência, provavelmente, sejamos tentados a escolher uma religião muito mais simples ou a escolher um livro de autoajuda onde encontramos frases bonitas, uma canção, uma poesia sentimental. E tudo se reduz numa frase: eu amo Jesus.
Seguir Cristo não é fácil. Ele também, diante da morte “sentiu-se angustiado” (Jo 12,27), mas não fugiu, não se escondeu e quando chegou a sua hora, mostrou a todos como era grande o seu amor.
“Quem quiser me servir siga-me; e, onde eu estiver, ali também estará esse meu servo. E o meu Pai honrará todos os que me servem" (Jo 12,26).
Frei Gunther Max Walzer