Homilia - 24/03/2024 - Domingo de Ramos
Hoje é o Domingo de Ramos e com Jesus entramos na grande semana, a Semana Santa. Começa com a entrada de Jesus em Jerusalém! Tudo foi muito triunfal. Um jumentinho levando Jesus com características de rei a Jerusalém. O povo gritava: “Hosana ao Filho de Davi!” e jogava ramos de palmeiras onde ele passava. Era a trajetória de glória para Jesus. E tudo vai terminar e se transformar em traição na sexta-feira e terminar com o assassinato de um homem inocente que se chamava Jesus.
A Semana Santa nos convida a “celebrar” a Dor, a Cruz. Evitamos, instintivamente, a dor, o sofrimento, a morte. Fomos feitos para a vida, para a felicidade, para amar e ser amados... E é esse nosso lado “vital” que se rebela contra a morte e tudo o que nos faz lembrar dela.
Entretanto, o sofrimento e a morte fazem parte da nossa vida!
E, tanto quanto a vida, é justo celebrar também a morte, pois ela é parte da vida, da nossa vida.
Celebrar a dor, o sofrimento, a morte é sinal de que assumimos o absurdo, o escândalo que essa realidade de não-vida apresenta para nós. Assim o absurdo, o escândalo é o melhor modo de se passar da morte para a vida, de “matar a morte”!
O Domingo de Ramos nos traz um paradoxo: a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém e a sua paixão e morte. Triunfo e aniquilação. Acolhida festiva e desprezo total.
Se estivéssemos lá, como iriamos nos comportar? Cada um de nós tem suas ideias a respeito de como deve se apresentar em certas ocasiões.
O povo de Israel estava esperando um Messias, mas cada um o imaginava de um jeito: poderia ser um rei, um guerreiro forte que expulsasse os romanos, um “ungido de Deus” capaz de resolver tudo com grandes milagres... É verdade que havia também textos nas Escrituras Sagradas que falavam no Messias sofredor, que iria carregar os pecados do povo. Mas essa ideia tão estranha não tinha importância nesse momento. Talvez o povo pensasse como muita gente de hoje: “de sofredor já basta eu, quero alguém que saiba vencer”...
Deus, como de costume, pensa diferente de nós. O Messias, além de não vir mostrando poder, entra na fila dos condenados. Para quem não olhasse a história com os olhos de hoje, não haveria muita diferença entre as três cruzes no alto do monte Calvário.
Considerando o processo, a condenação e a execução, foi um grande desrespeito dos “direitos humanos”. O julgamento foi rápido, sem provas suficientes, sem direito de defesa. A tortura antes da morte e a humilhação fazem parte da pena.
Como logo depois vem a ressurreição, a ascensão, a glória, esquecemos depressa a imagem de Jesus como pessoa indefesa, como alguém sem grande importância que as autoridades mandaram para a morte como as pessoas que quando são pobres são acusadas de algum delito, falso ou verdadeiro.
“Este homem era realmente o Filho de Deus”!
Esta é a conclusão do centurião que comandou a crucificação. Isso sabemos nós hoje, à distância de quase dois mil anos.
Que estranho rei e Filho de Deus que se submete à tortura, que se deixa confundir com os dois ladroes que morrem ao seu lado?
Percebemos que Deus está assumindo todas as nossas tragédias? Que está participando do destino de todos os que sofrem, inocentes ou culpados? Saberíamos identificar o Senhor nessa situação da dor?
Semana Santa! As dificuldades, o distanciamento social dos doentes, a ausência de pessoas queridas nos transportam à Jerusalém e todos nós deixamos de ser expectadores dos acontecimentos para nos tornar protagonistas de um grande acontecimento público.
Ainda encontramos pessoas, infelizmente, que são apenas expectadores como a turba dos judeus, só querem assistir sem se comprometer, não assumem a gravidade da situação em que todos nós nos encontramos.
O corpo de Cristo, hoje, somos nós, todas as pessoas, toda a humanidade; e enquanto houver uma pessoa sofrendo, será Cristo que sofrerá no seu corpo.
Por isto, esta Semana Santa é a semana de todos nós, quer que estejamos sofrendo no próprio corpo, quer que estejamos sofrendo na alma. Cristo sendo pessoa humana, sofreu tudo o que você pode sofrer. Ele conhece nosso sofrimento porque experimentou na sua carne, na sua alma.
A cruz de Cristo mudou o sentido da dor e de todo sofrimento humano, físico e moral. Ela não é mais um castigo, uma maldição. De fato, como escreve Santo Agostinho, Deus, que só é Bondade, nunca deixaria qualquer mal existir em suas obras se não fosse bastante poderoso e bom para fazer resultar do mal o bem.
E as tristes manchetes e estatísticas de conflitos e guerras nos falam disso: muitos refugiados e mortos, e ainda tantos desempregados, inúmeras incertezas sobre o nosso futuro. Mas será que Deus não extrai alguns bens destes males? Sim!
“Depois de três dias eu ressuscitarei”, Jesus predisse (Mc 9,31). Nós também, depois dos dias de dor e sofrimento que esperamos sejam curtos, ressuscitaremos e sairemos dos túmulos, não para voltar à vida anterior, mas para uma nova vida, como Jesus: uma vida mais fraterna, mais humana, mais cristã!
Desejo-lhe uma abençoadíssima Semana Santa! Que Deus cubra você de suas melhores graças para viver santamente este tempo privilegiado.
Frei Gunther Max Walzer