Homilia - 17/02/2013 - 1º Domingo da Quaresma
Já estamos na Quaresma, que começou na quarta-feira passada, na Quarta-feira de Cinzas. A Quaresma é o tempo de preparação para a maior de todas as festas, a festa da Páscoa.
Hoje, nossa comunidade se reúne mais uma vez para celebrar a presença do Deus vivo que nos fala. Ele acabou de nos falar nas leituras e, sobretudo, na proclamação do Evangelho.
O tema central do evangelho é a tentação. Tentações não faltam em nossa vida, e são bem sedutoras. Caímos em tentações porque elas aparecem como algo bom, atraente. É assim, por exemplo, com a droga. Se ela não provocasse, pelo menos, no início, uma sensação de prazer, ou talvez de alívio, ninguém se tornaria dependente.
O episódio das tentações de Jesus narrado no evangelho abre muito bem a nossa reflexão da Quaresma. Jesus vai ter que vencer as tentações, para que não se desvie da tarefa que o Pai lhe deu.
Jesus conheceu a tentação da fome, mas recordou o ensinamento da Torá: “Não se vive só de pão” (Dt,8,3). Ninguém negará que dar pão aos famintos faz parte do projeto do Reino. No entanto, é bom lembrar que Jesus se queixou do “sucesso” obtido com a multiplicação dos pães, quando viu que, em vez de entender o significado do milagre como apelo à partilha, a multidão queria continuar recebendo comida de graça, sem esforço próprio.
Jesus conheceu a tentação de adorar um falso deus, que promete riqueza e prosperidade; mas respondeu com o mandamento de Deus: “Só a Deus adorarás” (Dt 6,13). O apóstolo Paulo, que entendeu bem como era o poder de Jesus, soube dizer: “quando sou fraco, aí é que sou forte”. Trata-se de outro jeito de poder, um poder que se mostra pela fidelidade total ao projeto de Deus. O maior exemplo disso estamos vendo na pessoa de nosso Papa Bento XVI que entendeu que o papado é um serviço prestado ao Reino de Deus e não pode ser confundido com o poder deste mundo.
Jesus conheceu a tentação mais refinada que se pode imaginar, a de manipular o poder de Deus fazendo milagres sensacionais. Jesus fez milagres, muitos até! Mas o milagre não era o mais importante; o fundamental era o significado desses atos dentro do projeto de Deus. O maior milagre de todos foi a própria vida entregue por amor.
Terminado o confronto, feitas as devidas opções, o diabo afastou-se de Jesus. Um inimigo é derrotado.
O que diz a Palavra para nós?
Temos que admitir que vivemos num mundo de muitos e grandes conflitos. Lutamos constantemente contra forças “diabólicas” que desejam nos impedir de dar testemunho do Evangelho de Jesus Cristo, na construção de uma sociedade mais justa e fraterna.
Nesta ano, a Campanha da Fraternidade, como diz o Texto Base, nos faz olhar a realidade dos nossos jovens,“acolhendo-os com a riqueza de suas diversidades, propostas e potencialidades; entendê-los e auxiliá-los neste contexto de profundo impacto cultural e de relações midiáticas”.
“Olhar a realidade de nossa juventude”. Onde estão os jovens? Como podemos constatar em nossas missas, o jovem está fora da Igreja, a maioria está ausente. Por quê? Será por causa das estruturas pastorais obsoletas, ultrapassadas, que não têm nada a ver com as mudanças rápidas dos tempos atuais, e com o modo de ser da juventude?
Parece que muitas de nossas estruturas eclesiais, associações e comunidades não abrem suas portas para acolher a juventude. Os jovens não entendem a nossa linguagem, e nós desconhecemos suas aspirações, seus problemas, etc.
De todos os grupos etários, os jovens são os que mais sofrem os impactos das inúmeras mudanças que estão acontecendo nas últimas décadas.
As mais radicais mudanças que mexem com a cabeça dos jovens se deram na área da comunicação em rede, a internet. Estar conectado com os amigos via internet ou telefone celular se tornou mais importante do que os encontros pessoais. E mesmo quando amigos se encontram, eles não param de teclar mensagens para outros que estão distantes.
Assim, os jovens encontram dificuldade em manter relações permanentes e compromissadas e preferem relacionamentos restritos ao encontro casual. Com isso a vida comunitária está desaparecendo.
Os jovens se deparam com a grande fragilidade das instituições da sociedade: a família, em muitos casos, está fragmentada; as instituições de ensino apenas transmitem informações, não oferecem formação; o Estado oferece estruturas deficitárias e não desenvolve o potencial juvenil; a Igreja não oferece uma comunidade que acolhe os jovens.
Quando se fala em abrir as portas para os jovens, não se trata de ser coniventes com os absurdos que vemos no comportamento dessa faixa etária. Abrir as portas para acolher o jovem não significa que estamos de acordo com o sexo livre, com a aplicação do aborto para a gravidez indesejável, e muito menos queremos com isso dizer que aprovamos casamentos de pessoas do mesmo sexo.
No início desta Campanha da Fraternidade queremos abrir nossa reflexão e questionamento sobre a realidade dos jovens. Por isso, aproveitemos a Quaresma e a Campanha da Fraternidade para nos converter e nos tornar missionários a serviço da juventude.
Todos nós, ainda, vivemos sob o impacto da renúncia do Papa Bento XVI. Assim fazem os santos, não mandam recados, nos surpreendem como Deus com sua visita, assim o Papa Bento XVI com sua humildade, o seu silencio, surpreendeu o mundo com um gesto que não se via na Igreja há mais de séculos, desde que o Papa Celestino V renunciou ao papado. Motivos diferentes de renuncia, mas ambos com gestos de humildade e de amor à Igreja.
O papa Bento XVI disse que depois de ter rezado viu que era necessário ter mais força, mais saúde, mais atenção ao momento da Igreja. Era necessário, com a mesma humildade com que aceitou ser Papa, renunciar a este oficio ministerial.
Aproveitemos o tempo da Quaresma para rezar pela Igreja que vive este momento especial de eleição do novo papa, sucedendo a Bento XVI. Que o Espírito Santo esteja presente em nossa caminhada quaresmal para que, quando chegar a Páscoa, possamos celebrar dignamente a vitória de Cristo e a nossa.
Frei Gunther Max Walzer, Ofm