Homilia - 30/09/2013 - 26º Domingo do Tempo Comum
Comemoramos, no dia de hoje, o “Dia da Bíblia”. O salmista diz: "Lâmpada para os meus pés é a tua Palavra, e luz para o meu caminho" (Sl 119. 105). Por quê deve ser essa a atitude de todos os cristãos diante da Bíblia? Porque, através da Bíblia, Deus se revela á humanidade e continua se revelando aos homens do século XXI.
Ouvindo as leituras da liturgia de hoje, temos um dado importante para entender o valor da Bíblia para nossa vida.
O rico está no inferno e pede a Abraão para enviar Lázaro à casa de sua família para preveni-los do inferno, o local do sofrimento. A resposta de Abraão foi que eles têm os profetas e os mandamentos. Isto significa: eles têm a Palavra de Deus e é esta que devem ouvir. Deus não nos fala através de aparições de mortos, espetáculos religiosos que impressionam ou assustam, Deus não faz promessas de milagres ou usa outros artifícios extraordinários.
A história do rico e de Lázaro deve ser lida com atenção, para não deformarmos sua mensagem. É uma velha história, nascida talvez no Egito, e que circulava na Palestina antes de Jesus. É um grito de protesto dos pobres, contra os que nada fazem por eles, e é uma ameaça: na outra vida, vocês irão sofrer o que nós passamos aqui.
Muito semelhante é a mensagem do profeta Amós na primeira leitura. Amós chama os corruptos de “bando de gozadores”. Uma palavra forte, porque, em português, usamos o termo “bando” como sinônimo de quadrilha de ladrões ou de bandidos. Este é o tratamento que a Bíblia dá aos corruptos: são um “bando”, uma quadrilha que assalta o povo e mata os mais pobres e necessitados. Além de formarem um “bando” são gozadores. Gozam a vida às custas do trabalho do povo. Têm todas as mordomias, privilégios, regalias... E o profeta Amós profetiza: os que agora fazem festa e humilham o povo, amanhã serão os primeiros a serem deportados para o exílio.
Paulo, na 2ª leitura, pede a Timóteo para fugir das coisas perversas. Em outras palavras, para não se filiar ao “bando de gozadores”, mas ser honesto em tudo e em todos os momentos de sua vida.
Jesus usou a parábola para frisar que é agora, aqui na terra, que se decide o nosso destino eterno. Não adianta esperar depois. Depois da morte, a situação é irreversível, não vão mais mudar.
O que nos quer mostrar o Evangelho? De que o rico é acusado nesta parábola? De ser cego ou insensível, ao ponto de deixar morrer de fome na porta da sua casa o pobre Lázaro, que nem consegue receber as migalhas ou sobras de comida. O rico cria um abismo entre si mesmo e o irmão. Está vendo a miséria dele, mas seu coração – como diríamos hoje – “não está nem aí”. Não tem um pingo de solidariedade, não enxerga a miséria e o sofrimento alheio.
Pergunto: não podemos ver mansões luxuosas e, ao lado delas, favelas onde o povo passa fome?
Como, então, o rico pode esperar que, na outra vida, não lhe seja cobrada essa falta de sensibilidade e solidariedade?
No entanto, tomemos cuidado, para não tomar a descrição do abismo como um ensinamento de Jesus sobre um castigo eterno. Jesus não ensina isso. Jesus quer lembrar que é nesta vida que as coisas se decidem. Não quer, também, descrever o mundo dos mortos no além. Não afirma, tampouco, que o Deus Pai misericordioso tortura nas chamas o rico pecador.
Por outro lado, o evangelista Lucas quer assustar o rico, apontando sua perdição ou uma sorte muito dura, se nada fizer, nesta vida terrena, para ajudar os irmãos.
No Dia da Bíblia, vale a pena ressaltar outra lição da parábola de Jesus. No final da parábola, o rico pede a Abraão que envie Lázaro para avisar seus irmãos. A resposta de Abraão é curta e direta: “Eles têm Moisés e os Profetas! Que os escutem!”. Mas se os irmãos do rico forem surdos à Palavra, e viverem no egoísmo, não adiantará alguém (nem mesmo o Senhor Ressuscitado!) ir até eles. Surdos à Palavra, desconhecem o mandamento a ser guardado o mandamento do amor.
Esta é uma advertência para todos nós. A Palavra da Sagrada Escritura é a luz que deve iluminar o nosso caminho. O recado para nós pode ser este: Ser solidário, socorrer os necessitados, não com mero assistencialismo, mas promovendo sua dignidade e direitos.
O Papa Francisco, em sua visita na favela de Virginha, durante a Jornada Mundial da Juventude, no Rio de Janeiro, fez uma referência sobre a importância da solidariedade.
Segundo ele, solidariedade é uma palavra incômoda e, por isso, uma palavra que muitas vezes não é ouvida na classe social política ou econômica ou, nem mesmo é ouvida por nós, a exemplo do rico, que deixava Lázaro morrendo de fome à sua porta. Para explicar o que é solidariedade, o Papa Francisco se serviu de um ditado popular, muito conhecido entre nós: quando chega alguém de improviso em nossa casa, na hora do almoço ou da janta, a gente diz que vai dar um jeito “colocando mais água no feijão”. Este é um modo simples de entender a solidariedade. No entender de Francisco, eu sou solidário quando não deixo o outro com fome, mas encontro um jeito de resolver esse problema. Papa Francisco concluía dizendo que, pela promoção da solidariedade, “vocês mostram que a verdadeira riqueza não está nas coisas, mas no coração.”
A verdadeira riqueza está no coração!
Frei Gunther Max Walzer, Ofm